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AMBIENTE
Para a ANP, agência federal responsável pela fiscalização do setor petrolífero, empresa não é próxima a casas e tem licenças
Irregularidades da Shell "somem" em vistoria
MARIANA VIVEIROS
DA REPORTAGEM LOCAL
Afastada de área residencial,
com alvará de funcionamento expedido pela prefeitura e licença de
operação emitida pelo órgão ambiental responsável. É esse o retrato que a ANP (Agência Nacional
do Petróleo) tem da base de estocagem de combustíveis da Shell
na Vila Carioca (zona sul de SP).
A realidade, entretanto, é outra.
O local, um terreno de cerca de
180 mil m2 onde estão 36 tanques
de combustível, opera de forma
irregular -sem licença municipal para funcionar- desde 1985,
é vizinho muro-a-muro com pelo
menos uma dezena de casas e tem
uma licença ambiental que diz
respeito apenas a uma área administrativa, já desativada, que incluía restaurante, quadras e um
pátio de carros.
A diferença entre a Shell real e a
que consta dos registros da ANP
-agência federal responsável pela regulação e pela fiscalização das
atividades da indústria petrolífera- se torna ainda mais grave
quando é levado em conta que a
área em questão é o cenário da
maior contaminação ambiental
registrada até o momento no município de São Paulo.
O subsolo e as águas subterrâneas da base de combustíveis e
das ruas residenciais a ela adjacentes estão contaminados por
pesticidas (drins) e hidrocarbonetos tóxicos, conforme indicaram
relatório da CSD-Geoclock (empresa contratada pela própria
Shell para avaliar o local) e testes
feitos pela Vigilância Sanitária do
Estado em poços profundos.
Ação civil
O caso é alvo de uma ação civil
pública, e 2.500 moradores estão
sendo cadastrados pelos órgãos
de saúde, a fim de determinar a
que tipo de tratamento e acompanhamento médico eles devem ser
submetidos.
Em relatório enviado, a pedidos, para a CPI dos Postos de
Combustíveis da Câmara Municipal, no dia 7 deste mês, o diretor
técnico da ANP, Luiz Augusto
Horta Nogueira, informa, porém,
que está tudo bem.
"Salientamos que, após as referidas inspeções, não foram reportadas, até a presente data, anormalidades no que se refere à operação de tais instalações", afirma
o documento.
Na avaliação do presidente da
CPI, vereador Jooji Hato (PMDB),
e do advogado que representa a
Associação dos Amigos Reviva
Vila Carioca (formada depois que
a contaminação veio à tona), Paulo Brasil, as incorreções colocam
em xeque a eficiência do controle
que a agência deveria exercer.
"Agora temos de descobrir o
porquê desses erros, se foram intencionais ou não. Por isso vamos
convocar a Shell, a ANP e a empresa que fez a vistoria para dar
explicações", afirmou Hato.
Das três incorreções verificadas,
pelo menos duas advêm de informações prestadas pela Shell: as
duas licenças foram apresentadas
pela empresa. O alvará municipal
seria de 91, segundo o laudo; e a licença ambiental, de 2000.
Prazo vencido
A Administração Regional do
Ipiranga, em documento também
entregue à CPI dos Postos de
Combustíveis, reitera, entretanto,
uma informação que a própria
Shell já confirmou: a empresa teve
uma licença que expirou em 85 e
nunca mais foi renovada.
A prefeitura chegou a multar a
Shell por isso e conseguiu interditar a base por cerca de dez horas
-a empresa conseguiu uma liminar na Justiça e reabriu o local.
Já a licença ambiental que consta do relatório de vistoria é de
uma área administrativa, segundo João Antonio Romano, gerente da Cetesb (agência ambiental
estadual) para a bacia do Alto Tietê (que engloba a Vila Carioca).
A proximidade com residências, por outro lado, é uma questão de mera observação. Há décadas, todas as casas de um dos lados da rua Colorado são coladas à
Shell: o muro é o mesmo.
Segundo a Shell, os erros devem
ter sido da inspeção, a BBL - Bureau de Serviços S/C. Procurados
durante três dias pela Folha na última semana, nem ANP nem BBL
quiseram se manifestar.
Inspeção
A inspeção da ANP foi realizada
em outubro de 2000, em todo o
país, com o objetivo de traçar um
panorama da legalidade e da qualidade de operação das bases de
estocagem de combustíveis ou
"fazer um diagnóstico de conformidade das instalações quanto à
proteção ambiental, à segurança
industrial e das populações", segundo a portaria nš 104 de 2000,
que regulamentou a atividade.
São avaliadas a documentação
das bases, suas instalações, os manuais, os procedimentos, os registros e o pessoal. Para cada item é
atribuída uma pontuação, somada quando ele é desrespeitado.
Caso a soma dos pontos seja
igual ou superior a 350, a empresa
é caracterizada como de risco iminente, passa por uma nova vistoria e recebe um prazo para se adequar, sob pena de multas que podem variar de R$ 20 mil a R$ 1 milhão e até mesmo cassação do registro na ANP e interdição da instalação, dependendo do tipo de
problema e da sua gravidade.
Na inspeção de 2000, a Shell obteve "nota" 68. Se as incorreções
que constam do relatório não
existissem, a soma iria para 108.
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