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"Fortaleza" quilombola recebe registro em cartório do Estado
Após feito inédito em São Paulo, grupo do Vale do Ribeira perderá isolamento no fim do mês
Ponte, que vai ligar os quilombos a estradas, pode também ajudar na perda de identidade, afirmam moradores
EDUARDO GERAQUE
ENVIADO ESPECIAL A ELDORADO (SP)
A vida no Quilombo de
Ivaporunduva, no Vale do Ribeira, em São Paulo, era muito mais difícil em outros tempos avisa Benedito Alves da
Silva, 55, o Ditão.
A luta que acabou encorpada nos anos 80 começa cada vez mais a dar frutos. O registro do quilombo no cartório de imóveis de Eldorado,
cidade mais próxima, saiu.
Luta que durava 14 anos.
O fim do isolamento geográfico está muito perto de
ocorrer. No fim do mês, a tão
sonhada ponte que liga o
quilombo ao outro lado do
rio Ribeira de Iguape, a estradas e cidades, será oficialmente inaugurada.
De um lado, será mais fácil
escoar a produção de banana, principal fonte de renda
das cem famílias que vivem
no quilombo. Mas, de outro,
pessoas estranhas à comunidade, formada por 400
"compadres", podem aparecer com mais frequência.
"Não somos contra a tecnologia, o desenvolvimento.
Mas um dos nossos desafios
é manter a comunidade assim. Todos se conhecem. As
decisões são coletivas", diz
José Rodrigues da Silva, um
dos líderes do quilombo.
Liderança que o levou a
ocupar uma vaga na Câmara
Municipal de Eldorado.
Ditão, que acaba de voltar
da lida no bananal, também
é um líder nato. Articulado,
costuma representar a comunidade em reuniões em Brasília. Fala fácil de política e
das necessidades do povo.
"Nós precisamos de uma
política para os quilombos.
De técnicos, por exemplo,
que ajudem a aumentar a
produção", diz Ditão.
Nascido e criado nas terras
ocupadas por seus antepassados, que chegaram lá no
século 17 fugidos do garimpo
de ouro, o quilombola tem
ainda forte na memória os
tempos mais difíceis.
"Nos anos 1970, época do
regime militar, para cortar
qualquer coisa, era um problema. Você poderia ir preso,
apanhar", diz Ditão.
Ele decidiu deixar o quilombo. Trabalhou na construção de estradas, como a
rodovia dos Bandeirantes.
"Voltava para dar um dinheiro ao meu pai. Produzir era
complicado por causa das
restrições", afirma.
SEM RISCOS
Tanto a vida melhorou, seja com o registro das terras
que praticamente zera o risco
de invasão, seja com as leis
que garantem espaço suficiente para a produção, que
os jovens de Ivaporunduva
saem para estudar. Mas sempre acabam voltando.
"A vida aqui é tranquila.
Todos se conhecem. É muito
bom", diz Laudessandro Marinho da Silva, 26 anos, administrador de empresas formado em Itatiba (SP).
Ele é um dos diretores da
associação. Outros jovens,
também educados formalmente, seguiram o mesmo
caminho. E voltaram.
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