São Paulo, Domingo, 15 de Agosto de 1999
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SAÚDE
Cientista desvenda lado doentio da paixão

ALESSANDRA BLANCO
da Reportagem Local

Pela primeira vez a ciência pode estar prestes a comprovar o que sempre se desconfiou: paixão pode ser uma doença. E sua gravidade pode chegar ao ponto de atrapalhar a vida de quem dela está sofrendo.
A comprovação agora é neuroquímica. Segundo pesquisa da psiquiatra italiana Donatella Marazziti, da Universidade de Pisa, pessoas apaixonadas, assim como aquelas que sofrem de transtorno obsessivo compulsivo, apresentam, em média, 40% a menos de serotonina no cérebro.
Serotonina é um neurotransmissor (substância que propicia a conexão entre as células nervosas) que regula, entre outras coisas, o humor, a ansiedade, a agressividade, o apetite e o sono.
Já era conhecido da ciência que pessoas com transtorno obsessivo compulsivo -doença que ficou mais conhecida como a daqueles que lavam as mãos insistentemente para eliminar germes ou checam constantemente se trancaram a porta- tinham baixo nível de serotonina no cérebro.
Também já era conhecido que os sintomas da paixão, tais como pensar no outro horas por dia, perder o interesse pelo trabalho ou por qualquer atividade que não envolva o pretendente, checar e rechecar a secretária eletrônica na expectativa de um recado, são muito semelhantes aos apresentados pelos obsessivos compulsivos.
A novidade agora é essa constatação de que apaixonados também apresentam baixo nível de serotonina, resultado de pesquisa que Donatella fez comparando exames biológicos de apaixonados, obsessivos compulsivos e pessoas "normais".
Para selecionar os apaixonados, foram levados em conta os seguintes critérios: não estar apaixonado há mais de seis meses, pensar no outro mais de quatro horas por dia, não ter mantido ainda relações sexuais com o pretendente e não apresentar transtornos psiquiátricos (leia texto sobre a metodologia da pesquisa).
Um ano depois dos primeiros resultados, os testes foram refeitos em alguns dos apaixonados. Em todos eles os níveis de serotonina haviam voltado ao normal e eles informaram que uma afeição mais sutil havia substituído a "tontura" do início. O que comprova outra tese: paixão tem sintomas obsessivos compulsivos, mas dura pouco.
Para Donatella, essa é apenas uma primeira fase de um trabalho. Sua pesquisa mediu a quantidade de serotonina nas plaquetas do sangue dos apaixonados. Isso porque, apesar de a serotonina ter funções diferentes no sangue e no cérebro, ela atua em cada um deles da mesma maneira.
Assim, os resultados mostram uma estimativa da quantidade de serotonina no cérebro dessas pessoas, mas não detecta mudanças específicas no cérebro.
"Esse é um primeiro passo para entender os processos químicos que a paixão provoca no cérebro. A pesquisa mostra que a quantidade de serotonina na primeira fase da paixão é anormal. Mas acho que o amor é um sentimento muito complexo e não apenas químico", disse Donatella.


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