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Sopa é forma de atrair pais à escola, diz secretário
Segundo Januário Montone, da Saúde, intenção do programa não é nutricional
Prefeitura não se importou em reduzir quantidade de carne e verdura também para aumentar os concorrentes na licitação
ALENCAR IZIDORO
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DA REPORTAGEM LOCAL
A Prefeitura de São Paulo diz
que não se importou em reduzir de forma drástica a quantidade de carne e verdura na sopa
que será distribuída nas unidades de educação aos sábados
porque a intenção de seu "programa de alimentação" "não é
nutricional", mas atrair alunos
e pais ao ambiente escolar.
Outro motivo, segundo Januário Montone, ex-secretário
de Gestão e hoje da Saúde, era
aumentar os concorrentes numa licitação de R$ 40 milhões.
Conforme publicou a Folha
nesta semana, a prefeitura rebaixou a qualidade da sopa
após uma solicitação feita pela
Nestlé em consulta pública.
A previsão era que 100 kg de
uma das sopas tivessem, por
exemplo, 7 kg de carne -com a
mudança, serão só 0,5 kg.
O TCM (Tribunal de Contas
do Município) viu brechas para
direcionamento e suspendeu
na última quarta um pregão
que faria a compra do produto
-para que fosse entregue hoje.
Cada família vai receber 2 kg
com porções de sopa, suficientes para 60 pratos, às vésperas
da temporada de calor. Montone afirma que ela pode ter outras finalidades. "Eu uso a de
cebola para fazer patê", diz.
O secretário insiste que a
premissa do programa é atrair
famílias com um produto encontrado nos supermercados.
Mas, se era essa a intenção,
não deveria constar já da proposta original do edital, sem
depender de pedido da Nestlé?
"Deveria, mas edital foi feito
para ser aperfeiçoado", diz
Montone. Leia a entrevista:
FOLHA - Por que distribuir sopa se
ela, segundo nutricionistas, não faz
parte do cardápio do brasileiro, além
de ser um período de calor?
JANUÁRIO MONTONE - O programa foi criado para atrair as famílias ao ambiente escolar.
Houve um compromisso de
que o valor que não foi gasto pela prefeitura na crise da entrega
do leite -ficamos dois meses
sem fornecer- seria aproveitado em programas de alimentação para as famílias. Era de suplementação para as famílias,
para oferecer algo que elas encontram no supermercado.
Vai usar como sopa, como
tempero. Eu uso sopa de cebola
para fazer patê. Não é um programa de nutrição, é de suplementação alimentar. Foi considerado um produto versátil, de
fácil uso, dentro das regras de
desejo do consumidor médio.
FOLHA - Mas não é inadequado?
MONTONE - É um programa de
alimentação suplementar que
tem o objetivo de atrair as famílias, e atrai as famílias com as
coisas que estão no dia-a-dia
das famílias. Achamos razoável
aceitar que fosse a sopa de mercado. Uma empresa sugeriu
que fosse a mesma formulação
da sopa da merenda, que só tem
três produtores no Brasil. E não
aceitamos a proposta da Nestlé
de aceitar o sabor feijão, e ela é
a maior fabricante desse produto no país. Aceitamos a sugestão que estava de acordo
com o objeto do programa, que
é o de fornecer mais uma atração para as famílias.
FOLHA - Por que a composição só
foi definida após consulta pública?
As nutricionistas da prefeitura não
sabiam como é a sopa do mercado?
MONTONE - Foi feito o primeiro
edital para a consulta pública.
Você faz o edital, até pela pressa
de fazer, e ele é aperfeiçoado no
processo de discussão.
FOLHA - O foco é atrair as famílias
com um produto de mercado. A premissa não deveria estar no edital?
MONTONE - Deveria, mas ele foi
feito para ser aperfeiçoado.
FOLHA - Esse dinheiro não poderia
ser gasto com alimentos mais nutritivos?
MONTONE - Está sendo muito
bem gasto no projeto de atrair
os pais. É um investimento excepcionalmente bem gasto,
fantasticamente bem feito.
FOLHA - E do ponto de vista nutricional?
MONTONE - Não é um programa
de alimentação, é de atração
das famílias.
FOLHA - Não poderia ser um sabonete ou sabão em pó?
MONTONE - Ou sopa, e acho um
investimento fantástico você
trazer famílias.
FOLHA - Mas não faz parte do cardápio, especialmente de famílias de
baixa renda, dizem nutricionistas.
MONTONE - Falaram por quê?
FOLHA - O sr. acha que as pessoas
se sentirão atraídas às escolas?
MONTONE - Teremos outras atividades. É um certo preconceito achar que as 770 mil famílias
da rede são de baixa renda.
FOLHA - Normalmente essa faixa
de renda busca programas sociais.
MONTONE - Se não forem no final de semana, receberão a sopa normalmente na escola durante a semana.
FOLHA - O TCM suspendeu o pregão na quarta porque a entrega da
sopa teria que ser feita três dias depois. Ele considerou que só uma empresa que tivesse a estrutura pronta
poderia atender a exigência.
MONTONE - Essa discussão do
prazo foi mantida no edital porque vinha da consulta pública.
Isso seria corrigido no processo
do pregão, mas não foi [a data
da entrega]. O pregão não era
para entregar todo lote no primeiro dia. Qualquer dos grandes produtores do mercado teria capacidade de entrega, mas
esse prazo era mesmo exíguo.
Se eu fosse favorecer alguém,
não faria a consulta pública.
Por que eu faria a consulta?
FOLHA - Porque a legislação prevê.
MONTONE - É um decreto desta
gestão, assinado pelo prefeito
Kassab, é um instrumento de
transparência que pouca gente
tem a determinação de fazer. E
esta gestão fez. Poderia até dar
um jeitinho de não fazer, é um
decreto... Se houvesse intenção
[de direcionamento] haveria
mil formas de fazer.
FOLHA - O edital vai mudar?
MONTONE - O pregão vai continuar. Não deve haver modificação, além do prazo e do rótulo.
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