São Paulo, quarta-feira, 15 de setembro de 2010

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Polícia violou sigilos por dez anos a pedido da Petrobras

Milhares de sigilos criminais foram quebrados em SP e entregues à empresa

Investigação aponta ilegalidade; envolvidos dizem em depoimentos que havia "parceria" da estatal com a polícia

ANDRÉ CARAMANTE
ROGÉRIO PAGNAN

DE SÃO PAULO

A pedido da Petrobras, a Polícia Civil paulista quebrou o sigilo criminal de milhares de pessoas que tentaram emprego na estatal ou em suas subsidiárias durante um período de pelo menos dez anos, de 2000 e 2009.
Em relatório ao qual à Folha teve acesso, a Corregedoria da Polícia Civil diz que a prática, chamada de "ilegal" pelo órgão, atingiu 4.000 pessoas por mês no período, em média.
Segundo a investigação, só de janeiro de 2008 a julho de 2009, a Divisão de Capturas passou à Petrobras fichas criminais de 70.499 pessoas.
A conclusão do delegado José Ferreira Boucinha Neto, da Corregedoria, é a seguinte: as pessoas "tiveram sua vida pregressa devassada de forma irregular e ilegal de modo a atender única e exclusivamente aos interesses empresarias da Petrobras".
Funcionários da estatal negam ter havido pagamento em troca de dados. Mas dizem que a Petrobras ajudava a Divisão de Capturas doando material de escritório.
Houve ainda doação de passagens aéreas "para a remoção de presos" dentro do país, segundo depoimentos.
A investigação agora tenta descobrir se essas passagens foram usadas realmente no serviço policial -a apuração corre em inquérito separado.

AMEAÇAS
Foram os próprios policiais da Divisão de Capturas que denunciaram a "parceria", em meados de 2009.
Eles disseram sofrer ameaças de transferência caso não fizessem as pesquisas.
Cinco integrantes da Divisão de Capturas foram ouvidos pela Corregedoria a fim de "justificar a quantidade de pesquisas efetuadas em suas senhas individuais".
A Divisão de Capturas é um órgão da Polícia Civil subordinado ao Dird (Departamento de Investigação e Registros Diversos), responsável pelo gerenciamento dos dados da polícia paulista.
A chefe do setor de meios da Divisão, Mara Elisa Pinheiro, admite que recebia pedidos da estatal federal e os distribuía para pesquisa.
Quando um nome consultado tinha problemas com a polícia ou a Justiça, sua "capivara", como é conhecida a ficha criminal popularmente, ou DVC (ficha na Divisão de Vigilância e Capturas) era impressa e entregue aos funcionários da Petrobras.
Essa prática, segundo o próprio relatório, fere os artigos 202 da Lei de Execuções Penais e o 748 do Código Penal. Em resumo, a legislação diz que os dados criminais sigilosos de uma pessoa só podem ser acessados por policiais (em favor do serviço) ou pela Justiça, em processos envolvendo o interessado.
"Foi comprovado que há mais de dez anos essa prática ocorria numa suposta parceria entre a Divisão de Capturas e a Petrobras, sem que houvesse para tanto qualquer respaldo legal", escreveu o delegado Neto.
A investigação da Corregedoria está agora na Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital, do Ministério Público Estadual. O inquérito policial tem sete volumes (1.465 páginas).


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