São Paulo, segunda-feira, 15 de novembro de 2004

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NA AREIA

Em São Sebastião (SP), somente um dos quatro distritos policiais fica aberto à noite, mas recusa casos mais graves

Delegacia fecha no domingo no litoral norte

Jefferson Coppola/Folha Imagem
Câmera de segurança em casa na orla da praia de Juqueí, costa sul de São Sebastião (SP), que ainda tem muro alto e cerca elétrica


ALEXANDRE HISAYASU
ENVIADO ESPECIAL A SÃO SEBASTIÃO

Três dos quatro distritos policiais de São Sebastião (litoral norte de São Paulo), no centro, na Enseada e em Juqueí, fecham nos finais de semana e só funcionam das 8h às 18h. Só fica aberto o de Boiçucanga, mas somente com um investigador -não há delegado, escrivão nem carro-, que faz plantão de um dia inteiro. O único serviço 24 horas fica na Delegacia Seccional de Polícia, no centro.
O DP de Boiçucanga, dada a precariedade, só registra casos mais simples. Uma vítima de assalto a mão armada durante a noite em Boracéia, na divisa com Bertioga, por exemplo, tem de se deslocar 60 km pela Rio-Santos, estrada de pista simples cheia de curvas e com neblina constante, para ir à seccional. Muitas, dizem moradores, acabam desistindo.
A cidade tem 62 mil habitantes, mas, em feriados prolongados e nas férias, o número triplica, engrossado por turistas de alta renda que ocupam os luxuosos hotéis e casas da costa sul, onde estão as badaladas Maresias, Camburi, Saí e Juqueí, justamente os principais alvos dos ladrões.
Ontem, a Folha encontrou moradoras agredidas em Juqueí que tiveram de esperar 14 horas para registrar o caso em Boiçucanga (leia texto nesta página).
Segundo os Consegs (Conselhos Comunitários de Segurança) e a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que vêm cobrando maior estrutura para a polícia, o números de policiais, tantos civis quanto militares, é insuficiente. Por isso, pessoas vítimas de crimes não vão à delegacia.
"Já presenciei casos em que uma vítima de roubo não foi ao DP", diz a secretária do Conseg de Boiçucanga, Éder Ávila Castanha Monteiro. Ela disse também que até casos simples como furto de toca-fitas não são registrados. "As pessoas dizem que não compensa, que não vai dar em nada."
A falta de estrutura da polícia faz com que os próprios moradores paguem o conserto de viaturas e de computadores.
O presidente do Conseg de Maresias, Aldo Amadei, relatou que, em outubro, durante um feriado, ele conseguiu refeição para 40 PMs que vieram de outras cidades para reforçar o policiamento. "Eles ficaram durante três dias. Como não seria possível pagar toda a alimentação, falei com o prefeito, que pagou tudo."
Segundo ele, na quinta-feira, havia um carro de polícia com dois PMs para patrulhar toda a costa sul, que tem 65 km de extensão e é entrecortada por ruas sem asfalto e com iluminação precária. "O efetivo policial é desumano. Eles trabalham sobrecarregados. O 1º DP, que atende praticamente 50 km de município, tem apenas três investigadores. Numa recente operação da Polícia Civil, até escrivão foi para a rua", disse.
Para o presidente da OAB de São Sebastião, Luiz Tadeu de Oliveira Prado, a situação da segurança "é caótica". "Os crimes estão acontecendo em plena luz do dia. O que me surpreende é que essa situação da falta de efetivo policial já perdura há pelo menos três, quatro anos", afirmou.
Quem vive na cidade diz que a polícia não acompanha o crescimento da criminalidade. A DIG (Delegacia de Investigações Gerais) e a Dise (Delegacia de Investigação Sobre Entorpecentes) possuem, juntas, apenas seis investigadores. O delegado-assistente da seccional, Marcelo de Abreu Magalhães, é quem responde pelas duas. As delegacias, que também fecham à noite e nos finais de semana, não têm cartório central e, por isso, não instauram inquéritos. As denúncias anônimas recebidas ficam armazenadas na secretária eletrônica.
O 4º DP, em Juqueí, não tem delegado, investigadores nem carro. Conta apenas com um escrivão. Se algum caso precisar da presença de um delegado, ele é deslocado de outra delegacia.
Outro problema que dificulta a investigação é que a cidade possui uma cadeia pública, ao lado do 1º DP. Com 68 vagas, está com cerca de 160 presos. Quando um detento é convocado para depor no fórum, um grupo de investigadores é deslocado para escoltá-lo. A cidade também conta com uma Delegacia da Mulher e uma Ciretran.
Ao todo, além de cuidar de suas respectivas delegacias, os oito delegados da cidade se revezam no plantão da seccional nos finais de semana e à noite. Policiais ouvidos pela Folha, que pediram para não serem identificados, disseram que não há condições para investigar crimes. "Além do pequeno efetivo, há policiais que estão de férias, o que dificulta ainda mais o trabalho", disse um policial. Segundo ele, o trabalho de investigador, hoje, é basicamente entregar intimações, escoltar presos e ajudar no plantão.

Colaborou FÁBIO AMATO, da Agência Folha


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