São Paulo, domingo, 15 de dezembro de 2002

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Quem não entra no clima se sente "excluído"

DA REPORTAGEM LOCAL

Existem aqueles que discordam, os que não querem participar desse clima de alegria generalizada de Natal e Ano Novo, e esses são segregados.
Pelo menos é o que afirma o arquiteto Rick Levy, 29, que não gosta nem um pouco das festas de final de ano.
"Ninguém conversa se você não está feliz o tempo todo. No Réveillon, por exemplo, se você não se integra, será excluído. As pessoas não acreditam e perguntam: "Quem é esse mala que não pula ondinha nem usa roupa branca?'"
Para Levy, trata-se de uma "pressão hipócrita", patrocinada sobretudo pela mídia, que praticamente "obriga" as pessoas a comemorar. "Se eu quero dar um presente para alguém, isso vai acontecer independentemente de ser ou não Natal. Por que eu vou ter que dar uma "caixinha" para o ascensorista agora? Dou, se quiser, no aniversário dele."
Sobre o Réveillon, Levy considera um absurdo todo o investimento que é feito para que, "depois de uma única noite de glamour, tudo se acabar e você ter de pegar um trânsito desgraçado para voltar para casa". Para ele, os desejos que as pessoas têm em relação ao novo ano não precisam ser manifestados exatamente na virada. "É uma bobagem."
Gabriela Sampaio, 25, é jornalista, trabalha num site da internet e odeia, entre outras, duas coisas: o especial de Roberto Carlos e a transmissão da Missa do Galo pela TV. "Deprimente", diz ela.
"Na hora da missa ninguém pode falar nada. E a gente ainda tem que ficar aguentando o Roberto Carlos horas e horas na televisão."
"As pessoas perderam a noção do que realmente significa o Natal, tudo acabou virando um desespero de consumo nojento."
Mesmo aqueles que, como ela, não vêem o Natal dessa maneira, diz Gabriela, são obrigados a "entrar na onda": "A gente acaba tendo que comprar algum presente, porque se não fizer isso tem pessoas que ficam ofendidas".
Gabriela é mais crítica ainda com relação às comemorações em família: "As pessoas acabam brigando, reclamam da comida, ficam uns falando mal dos outros pelas costas, uma loucura."
Biba Fonseca, 42, "promoter" de uma casa noturna de São Paulo, diz que sempre se deprime no fim do ano. "O Natal até que é mais bacana, tenho um monte de sobrinhos e eles adoram. Mesmo assim, eu, que sou solteira, tenho que me adaptar aos planos dos irmãos casados e da mãezinha."
"Sobre o Ano Novo", diz ela, "não entendo por que existe esta obrigação de comemorar a mudança de mês. Afinal, todo mês acaba e outro começa".
Outra coisa que irrita Biba é "aquela obrigação de ser bacana. Por que as pessoas se lembram de ser bacanas umas com as outras só nesta época? Não dá para fazer isso no resto do ano?"
Depois que tudo passa, diz ela, o que resta é uma sensação de que tudo foi meio uma farsa que não serviu para nada. "Bem, pelo menos aí vêm as férias." (LC)


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