São Paulo, domingo, 16 de janeiro de 2005

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Lixo se mistura às belezas naturais de Bitupitá

DA AGÊNCIA FOLHA, EM BARROQUINHA (CE)

A dificuldade do acesso à praia de Bitupitá, no extremo oeste do litoral cearense (a 409 km de Fortaleza), mantém o lugar preservado, um verdadeiro refúgio para os turistas que querem algo desconhecido. Por outro lado, a falta de infra-estrutura atrasa a vida dos moradores, que vivem da pesca e buscam na praia os poucos momentos de lazer.
A cada final de tarde, grande parte dos quase 3.000 moradores aparece na beira do mar. Os homens, para jogar futebol e ajeitar as jangadas. As mulheres, para conversar e cuidar dos filhos. As crianças, para brincar.
Os brinquedos são improvisados -carrinhos feitos de latas de óleo, bóias feitas de garrafas plásticas vazias. Mas a principal diversão está lá em abundância: o mar, onde meninos e meninas se divertem até o anoitecer.

Último paraíso
A praia de Bitupitá fica num dos municípios mais pobres do Ceará, Barroquinha, que é dominado há anos por uma mesma oligarquia. As belezas naturais da praia, com uma faixa de areia extensa e uma área de mangue no Pontal das Almas, se misturam à sujeira produzida pelos próprios moradores, que não têm coleta de lixo nem saneamento básico.
"Essa poderá ser a última chance de ver um local tão puro e tão preservado para sua própria gente", disse a turista suíça Françoise Tinguely. "Como em outros locais, aqui também está perto de haver uma colonização turística", afirmou o também suíço Beppe Giusephe.
Para o casal, a divulgação de um lugar tão escondido pode atrair os olhares de investidores, especialmente os estrangeiros, que com pouco dinheiro poderão se apropriar de Bitupitá e expropriar os moradores para construir resorts de luxo.

Consertando peixe
A menina Juliana Ferreira da Silva, 14, que sonha ser médica, afirma que o problema para ela e para outros adolescentes e crianças da comunidade é a má qualidade do ensino.
Outra garota do local, Geissiane de Sousa, 14, passou agora para a 5ª série do ensino fundamental, mas não sabe ler nem escrever. "Sei só soletrar as palavras. Mas neste ano a professora disse que a gente aprende a ler."
Lucineide Gomes Rocha, 18, ficou mesmo sem aprender. Estudou até a 2ª série e agora espera o quarto filho. Sem marido e vivendo com a mãe, ela sustenta as crianças "consertando" peixe, uma das únicas formas de as mulheres da comunidade conseguirem alguma renda.
"Consertar" o peixe é tirar as escamas, limpá-lo e salgá-lo, preparando-o para o transporte. A cada 200 peixes, ela e outras mulheres que fazem o serviço ganham R$ 0,60. O pagamento é feito por semana e não passa de R$ 15.
"É desse jeito que a gente vive. Não tenho sorte, porque nunca consegui me cadastrar nesses projetos do governo." (KF)


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