São Paulo, quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

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MASSACRE DO CARANDIRU

Placar que começou desfavorável ao coronel Ubiratan se inverteu a partir do terceiro voto

Relator do processo votou contra absolvição

DA REPORTAGEM LOCAL

O começo da votação pelos desembargadores do Tribunal de Justiça parecia trazer um desfecho desfavorável para o coronel Ubiratan Guimarães. Entidades de direitos humanos já comemoraram o resultado parcial quando, em poucos minutos, a situação se inverteu e a maioria esmagadora dos juízes absolveu o oficial.
Os dois únicos votos pela manutenção da pena de 632 anos foram justamente de desembargadores que mais estudaram tecnicamente o processo criminal: o relator e o revisor.
No primeiro voto, o relator Mohamed Amaro foi contrário ao pedido de anulação da sentença feito pela defesa do coronel Ubiratan. Segundo ele, não havia contradição entre a vontade dos jurados e a sentença de primeira instância. "Não há como desconsiderar o júri, que ocorreu com execução da ampla defesa", afirmou.
Para o desembargador, o coronel Ubiratan cometeu o dolo eventual ao assumir o risco das mortes quando destacou uma tropa de ataque, com submetralhadoras, quando deveria ter utilizado uma tropa de contenção.
Por ser o desembargador que mais analisou o processo, o voto do relator tem peso maior e costuma ser seguido pelos demais juízes do Órgão Especial do TJ.
Foi o que ocorreu em relação ao desembargador Vallim Bellocchi, revisor do processo -juiz indicado para fazer uma segunda interpretação técnica dos autos. Bellocchi também considerou injustificado o pedido de nulidade feito pelo advogado do coronel Ubiratan e votou contra.
Quando se pensava que o pedido de anulação caminhava para a sua rejeição, o quadro se inverteu. O desembargador Walter de Almeida Guilherme disse que o reconhecimento do estrito cumprimento do dever colocou em dúvida a validade da resposta seguinte, quando o júri se posicionou pelo excesso na atuação do oficial.
O voto de Guilherme foi seguido por outros 19 desembargadores -um desembargador não compareceu, um se absteve e o presidente do Órgão Especial só vota em caso de empate.
A seqüência de votos favoráveis ao coronel Ubiratan agitou o plenário do Órgão Especial. O advogado do oficial, Vicente Cascione, que é deputado federal pelo PTB-SP, chegou a chorar quando percebeu que já havia votos suficientes para absolver seu cliente.

Falha comum
Advogados criminalistas afirmam que são comuns problemas de compreensão por parte dos jurados e de falhas técnicas cometidas por juízes na apresentação dos quesitos ao júri.
O Brasil segue o sistema jurídico francês. Os argumentos da acusação e da defesa são transformados em quesitos (questões) pelo juiz, que, de forma secreta, são votadas por jurados leigos. O juiz dá a sentença baseado na decisão do júri.
O quesito de legítima defesa, por exemplo, pode ser desdobrado em outros seis, o que pode causar confusão. "Isso acaba colocando o leigo frente a questões muito complexas e, muitas vezes, há equívocos e contradições na interpretação ", afirma o advogado Luiz Fernando Pacheco.
Segundo o advogado Fernando Castelo Branco, professor de direito da PUC, é freqüente a formulação de quesitos levar à dificuldade de compreensão por parte dos jurados em razão do texto elaborado pelos juízes. O Código de Processo Penal determina que a linguagem usada nos quesitos seja simples e clara.
Para ele, falta um maior zelo ao sistema judicial na elaboração de questões que serão levadas ao júri.


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