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Pânico no galinheiro
DEMÉTRIO MAGNOLI
COLUNISTA DA FOLHA
O PCC deflagrou ontem a
guerra da informação. Existiram, aqui e ali, disparos reais,
mas sobretudo os bandidos dispararam aleatoriamente chamadas telefônicas ameaçadoras.
BUUU! A cidade de São Paulo
reagiu como um
imenso galinheiro. Rumores correram soltos, desatando reações
em cadeia. Sob o
influxo do boato,
comerciantes baixaram portas de
aço, pais assustados correram às
escolas para resgatar as crianças
e empresas suspenderam o serviço. De um bairro a outro, a cidade apagou-se ao
longo da tarde.
Sarajevo, a capital da Bósnia-Herzegóvina, não renunciou à
vida, nem sob sítio e debaixo das
rajadas de franco-atiradores. Os
mercados de Bagdá funcionaram em meio aos estrondos das
bombas e mísseis dos ataques
norte-americanos. Londres não
parou durante os
bombardeios aéreos alemães, na
Segunda Guerra
Mundial. Mas
São Paulo curvou-se à delinqüência comum.
Vergonha!
A culpa é dos
governantes?
Sempre, em primeiro lugar, a culpa é deles. Atônitas, cercadas por numerosas
assessorias inúteis, as autoridades estaduais e federais entregaram-se desde domingo ao jogo
eleitoral, elaborando declarações
maliciosas sobre seus adversários. Mas esses especialistas na
baixa política não foram capazes
de identificar o sentido da operação do PCC e, na prática, renunciaram a governar.
Na hora da primeira série de
ataques coordenados, o governo
do Estado de São Paulo tinha a
obrigação de centralizar as forças policiais em um comando
único de emergência. Em vez disso, talvez inspirado nas ações dos
comandantes do Exército que, no
Rio de Janeiro, firmaram um
acordo fétido com o Comando
Vermelho, ele preferiu iniciar negociações sigilosas com os chefes
da delinqüência.
De nada servem um governador e um secretário da Segurança
impotentes diante de uma guerra de rumores. Ontem, enquanto
os cidadãos se acovardavam, os
boletins de notícias desempenhavam involuntariamente o papel
destinado a eles no planejamento dos bandidos. Mas não passou
pela cabeça vazia
das autoridades
o recurso elementar de, usando a legislação
disponível, colocar a TV e o rádio em rede oficial, por todo o
tempo necessário, a fim de desfazer a boataria,
chamar as pessoas à razão e
impedir o cancelamento da vida
normal.
A culpa é só dos governantes?
Não, mil vezes não! São Paulo conheceu ontem os efeitos psicológicos da indústria do medo. A
classe média que não deixa os
seus filhos circularem de ônibus e
metrô, que se cerca de câmeras e
alarmes, que passeia apenas em
shopping centers
e aspira comprar
um automóvel
blindado correu
na direção de
seus bunkers domésticos murmurando tolices sobre a pena de
morte. No começo da noite, um
manto de silêncio
desceu sobre a cidade. Vergonha!
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