São Paulo, quarta-feira, 16 de julho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Sociedade empurra policiais para guerra, afirmam analistas

DA SUCURSAL DO RIO

Melhorar a formação do policial é importante, mas, na opinião de analistas, não é só a falta de treinamento que resulta em ações desastrosas com a morte de inocentes. Para eles, a pressão que parte da sociedade faz com que a polícia parta cada vez mais para o enfrentamento direto, o que acaba resultando em episódios como os registrados no Rio e no Paraná.
Além da morte do administrador Luiz Carlos da Costa ontem, uma ação da polícia militar do Rio na semana passada já havia resultado na morte de João Roberto, 3. No Paraná, a PM também matou por engano a estudante Rafaeli Lima, 21, após ter confundindo seu carro com o de criminosos no último fim de semana.
Para Jorge da Silva, ex-secretário estadual de Direitos Humanos e ex-presidente do Instituto de Segurança Pública do Rio, "ficam de todos os lados da sociedade empurrando os policiais para uma guerra". Nesse clima de tensão e com os nervos à flor da pele, diz ele, aumenta o estresse dos policiais.
"A formação policial é importante, mas você ouve as pessoas dizendo que bandido bom é bandido morto. Se é legítimo matar bandido, eles vão atirar." A antropóloga Ana Paula Miranda, que também presidiu o Instituto de Segurança Pública do Rio, concorda que a discussão sobre a abordagem policial não deve ficar apenas na questão do treinamento.
"Enquanto a lógica for a de dar prioridade ao enfrentamento, você pode ter experiências maravilhosas em capacitação, mas, quando esse policial começar a trabalhar na rua, vão dizer para ele esquecer tudo o que aprendeu porque o código lá é outro, e o que vale é ser corajoso e pegar o bandido a qualquer custo", afirma ela.
"Não existe formação policial capaz de mudar a personalidade de uma pessoa. Os candidatos à PM no Rio passam por exame intelectual, físico, psicológico e social, mas o perfil de quem procura a carreira policial é de uma pessoa mais agressiva, por estar disposta a correr mais riscos", diz o ex-comandante-geral da PM do Rio, coronel Ubiratan Ângelo.
Ele afirma também que as ações da polícia na área de segurança pública no Rio estão sempre pautadas pelo clamor da sociedade e da mídia.
Ângelo lembra que, no ano passado, logo após uma megaoperação da polícia no Complexo do Alemão que resultou em 19 mortes, o secretário José Mariano Beltrame foi aplaudido, quando, num evento público, teve seu nome anunciado. "Tempos depois, a mesma sociedade passa a criticar quando a violência bate à sua porta."
Ele afirma ainda que nunca houve uma política clara no setor. "Não estou dizendo que não existe política de segurança pública neste ou naquele governo. Digo que ela nunca existiu."


Texto Anterior: Nº de mortos por policiais cresce em SP e no Rio
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.