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PASQUALE CIPRO NETO
"Trocando em Miúdos"
Ou deveria ser "Trocando
as Bolas"? Explico: na semana passada, ao citar alguns versos
de uma canção de Francis Hime e
Chico Buarque ("Quando olhaste
bem nos olhos meus..."), troquei o
nome da música. Os versos são de
"Atrás da Porta", e não de "Trocando em Miúdos" (que também
é obra da dupla). Agradeço aos
inúmeros (e gentis) leitores que
me advertiram do cochilo.
Por falar em trocar as bolas,
aproveito o burburinho causado
pela indefectível reunião mensal
do Copom (Comitê de Política
Monetária) para tratar de duas
expressões muito comuns nessa
situação: "ponto percentual" e
"por cento". Suponha que a taxa
Selic seja de 10% e o Copom a aumente para 11%. De quanto é o
aumento? De 1%? Ou de um ponto percentual? Ou tanto faz?
Não tanto faz, não, caro leitor.
Os nomes das bolas (ou dos bois)
não podem ser trocados. Lembre-se de que a preposição "por" da
expressão "por cento" estabelece
relação de divisão (1% significa 1
dividido por 100). Como 1% de 10
é 0,1, só seria possível falar de um
aumento de 1% se a taxa passasse
de 10% para 10,1%. Se a taxa passa de 10% para 11%, o aumento é
de 10% (10% de 10 = 1), ou de um
ponto percentual (de 10 pontos
percentuais para 11).
A esta altura, o leitor talvez esteja achando que pirei. Não pirei,
não, nem virei professor de matemática. Não é a primeira vez que
me ponho a discutir problemas
que, embora pareçam essencialmente matemáticos, são de raciocínio, de compreensão de texto, de
leitura, enfim. Dão-me razão as
questões dos mais importantes
concursos públicos do país.
Quer ver outro caso? Em poucos
meses, o percentual de desempregados de um país passa de 10% da
população economicamente ativa para 20%. O aumento foi de
10%? Ou de 100%? Foi de 100%,
caro leitor, ou de dez pontos percentuais (é só fazer as contas). O
emprego dos nomes precisos é mera decorrência da correta interpretação dos fatos. Insisto: antes
de ser de matemática, a questão é
de leitura, de raciocínio, de compreensão do texto.
Quem raciocina mal lê mal,
compreende mal e, conseqüentemente, decide mal. Quer um bom
exemplo? Num posto bancário
(de auto-atendimento), há vários
caixas eletrônicos. Num deles, lê-se esta informação: "Depósito somente neste equipamento". Isso
significa que no tal equipamento
só é possível fazer depósitos? Não
necessariamente, caro leitor.
"Depósitos somente neste equipamento" não equivale a "Neste
equipamento somente depósitos",
mas boa parte dos usuários lê desse modo a mensagem. Muitas vezes, o resultado disso é perda de
tempo em longas e inúteis filas.
Outro caso semelhante é o da
placa de trânsito que indica sentido obrigatório (a popular seta da
"contramão") sob a qual se põe
esta observação: "Exceto ônibus".
Muita gente entende que a restrição só vale para os ônibus. É o
contrário, caro leitor: só os ônibus
podem circular por ali. Nem preciso dizer qual é o resultado disso.
Não resisto à tentação de terminar o texto propondo-lhe uma reflexão sobre esta famosa frase:
"Toda regra tem exceção". Já
pensou bem nisso, caro leitor? Se
toda regra tem exceção, pode-se
muito bem pensar que essa regra
também tem exceção e que, portanto, existe regra sem exceção.
Que coisa incrível, não? É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras
E-mail - inculta@uol.com.br
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