São Paulo, quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

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GILBERTO DIMENSTEIN

Vingança verde


Cada árvore que plantava era, de certa forma, como se o acupunturista colocasse uma agulha no corpo da cidade

NO FINAL de semana passado, o psicólogo Alexandre Chut plantava mudas de árvores nas áridas e cinzentas calçadas das ruas da Vila Buarque, tomadas, na madrugada, por prostitutas e travestis. Essa microscópica ofensiva contra o aquecimento global, que reúne a elite política mundial em Copenhague, tinha um certo gosto de vingança. "Plantar em São Paulo já me deu muito aborrecimento."
Muitas das árvores que espalhava pela cidade eram arrancadas pelo poder público. Mas, agora, não só ele está no governo, mas é responsável por projetos de educação ambiental.

 

Formado em psicologia, Alexandre se embrenhou na medicina chinesa e diplomou-se em acupuntura, em meio a cursos de massagem. Toda essa mistura levou-o a ganhar a vida, em seu consultório, como psicoterapeuta corporal. Foi fazendo essas escolhas em suas viagens dentro e fora do Brasil, nas quais combinava natureza, meditação e estudos da psicologia alternativa.
Desde a juventude, desenvolveu uma mistura de hobby com ativismo ecológico, montado em uma mobilete -um misto de moto com bicicleta. Munido de mudas e de uma escavadeira, plantava centenas de árvores e, sempre que podia, acompanha seu crescimento. Muitas delas eram depredadas e arrancadas, às vezes, até pela prefeitura. "Eu sentia que cuidar da natureza era uma extensão do meu trabalho terapêutico.
Cada árvore que eu plantava era, de certa forma, como se eu colocasse uma agulha no corpo da cidade."
Plantava em todos os lugares por onde viajava, especialmente no litoral norte de São Paulo, sempre acompanhado da escavadeira. "É uma delícia voltar e ver, no caminho, a árvore grande, crescendo."

 

Com o tempo, a dedicação foi aumentando. Comprou um pedaço de mata na serra da Mantiqueira, em Minas Gerais, com nascentes e rios.
Estava com a vida razoavelmente acertada, dividida entre o consultório e as viagens pelo litoral, quando recebeu o convite para ser, pelo menos por um tempo, funcionário público. Aceitou e, neste ano, a ecologia virou profissão. Deixou seu consultório apenas para sessões noturnas e colocou o pé nas calçadas.
Foi convidado pela Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente para realizar educação ambiental e decidiu concentrar suas ações nas calçadas. "Aprendi que, se educarmos os moradores, ensinando a cuidar da árvore, a destruição diminui."

 

No caso da Vila Buarque, com suas noites agitadas, espera contar com a colaboração de seus frequentadores noturnos, travestis e prostitutas -é, no mínimo, um bom laboratório de preservação ambiental.

gdimen@uol.com.br


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