São Paulo, segunda-feira, 17 de março de 2008

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Aos 84 anos, princesinhas do rádio vivem hoje de dublagens e de palestras

WILLIAN VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Desde que subiram ao palco de um programa de rádio pela primeira vez, lá se vão mais de 60 anos de trabalho. E se as irmãs Gessy e Daisy Fonseca, ambas famosas no auge do rádio, hoje não conseguem emprego nas rádios e televisões do país, mesmo com currículos gordos que atualizam com extrema dedicação, não é por falta de tentativas.
"É preconceito de idade", diz Gessy, 84. No sofá de estampas floridas do apartamento onde vive sozinha, em São Paulo, segura um jornal de 1953 com o título "Quem não conhece Gessy Fonseca?" Há 67 anos trabalhando com voz, a "princesinha do rádio" é dubladora de filmes.
A placa com seu nome no Theatro São Pedro (São Paulo), por 60 anos de carreira, importa pouco para quem guarda os prêmios em uma sacola sobre o guarda-roupa. Ela não vive de memórias. Faz dublagens para televisão, ganha cerca de R$ 70 a hora e ainda distribuiu currículos. "Mas queria é que o telefone tocasse, assim, "olha, tem um papel para você". Eu faria."
A aposentadoria é pouca, o resto vem da dublagem. "Só não vou à televisão fazer choradeira, que ninguém lembra de mim. Isso não faço." Enquanto não surge o convite, é voluntária na gravação de livros para cegos, no Centro Cultural São Paulo. Lá, toda semana, sua voz grave ecoa no estúdio. "Se Deus me deu a alegria de ter uma voz boa, por que não dar alegria a quem quer ler e não pode?"
A quilômetros dali, sua irmã Daisy segura a foto em que está sentada no sofá de Hebe Camargo, 79, ambas de penteados laqueados, trabalhando no programa "Mulher 65".
Daisy já foi radioatriz, escreveu a coluna de jornal "De Mulher para Mulher", foi redatora de rádio. Aposentada, tem dois filhos, 14 netos e "muitos bisnetos"; não sabe quantos. E publicou um livro de memórias, em 2003. Tem outro no prelo. "Escrevi por não conseguir voltar para o rádio", diz.
Ela se irrita, mas releva. "É que as idéias vêm às pencas na minha cabeça." Tanto que ela negocia agora a venda da última entrevista dada, a ela, por Cacilda Becker, em 1969.

"Hebe e o passado"
"O programa começava assim: boa tarde mamãe, boa tarde vovó, boa tarde brotinho (naquela época mocinha era brotinho)", lê Daisy, em voz alta, o script amarelado do programa "Mulher 65", que redigia para Hebe Camargo. "Por isso, quando você vê, no programa da Hebe, aquele público de senhoras, pode crer, metade fui eu que cativei com minha máquina de escrever."
Antes, Daisy já havia trabalhado nos anos 1940 com a escritora Ivani Ribeiro, quando ela ia, máquina de escrever na mão, para dentro da sala de cinema, taquigrafar no escuro a história dos filmes -que depois eram lidos no rádio. Só anos depois, já casada com o diretor da rádio Bandeirantes Rebello Jr., que então se formava em direito, foi levar um convite para Hebe. Afastada do rádio pelo casamento, Hebe quis gravar um programa de casa e pediu idéias, diz Daisy. Foram cinco anos de programa diário -três após o derrame do seu marido. "Escrevia 18 páginas por dia, na penteadeira. Mas valeu a pena."
"C'est Ma Vie" [é a minha vida] é o título do álbum de memória que Gessy abre com cuidado, mostrando a foto dela menina, quando o pai as levava para as gravações. Era 1941, quando foram assistir ao show de Otávio Gabus Mendes. Ele as chamou no palco, as ouviu, fez um convite e elas começaram como atrizes. Gessy estudou para ser secretária, e Daisy, para ser artista. Mas quiseram o rádio.


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