São Paulo, terça-feira, 17 de agosto de 2004

Próximo Texto | Índice

JUSTIÇA EMPERRADA

Criados para dar soluções rápidas a ações simples, órgãos não conseguem julgar no prazo previsto em lei

Sobrecarga leva lentidão a Juizado Especial

FERNANDA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

Criado em 1995 para acelerar as decisões sobre causas de pequena complexidade, o Juizado Especial Central de São Paulo, o maior da capital paulista, já demora, em média, de sete a nove meses para julgar uma ação.
O tempo razoável deveria ser de um mês. Feita a reclamação, a lei estabelece que seja marcada uma audiência para tentar um acordo em 15 dias e, se a conciliação não for possível, uma nova audiência nos 15 dias subseqüentes, na qual o juiz informa sua decisão.
Em outros juizados de São Paulo -são 16 no total-, a situação também está longe do ideal. Nos Fóruns Regionais de Santo Amaro e Jabaquara (zona sul), por exemplo, o tempo de espera é o mesmo. No Fórum de Pinheiros (zona oeste), é de quatro meses.
Esly Mingotti Campos, 44, dono de uma escola de música em São Bernardo do Campo (Grande São Paulo), cobra há mais de um ano o pagamento de uma dívida de R$ 600,00 de um aluno.
Em junho do ano passado, ele ingressou com uma ação no Juizado Especial para pedir que as mensalidades atrasadas fossem pagas. Até hoje não teve seu caso julgado. "Fica parecendo que vale a pena dar calote. A gente fica com uma sensação de impotência e frustração", disse Campos.
"Ao mesmo tempo em que houve um acesso maior da população ao Judiciário, houve também uma sobrecarga do sistema", disse Luís Eduardo Scarabelli, juiz-adjunto do Juizado Especial Central.
Nesse juizado, um único cartório administra 85 mil processos, sob a responsabilidade de apenas 12 juízes. A relação é de cerca de 7.000 processos para cada juiz.
Cândido Rangel Dinamarco, professor da Faculdade de Direito da USP e um dos idealizadores da lei dos Juizados Especiais, afirma que eles foram criados para ampliar o acesso à Justiça e prestar um serviço à população que não tinha como exigir seus direitos em virtude da simplicidade da demanda e do valor da causa.
"A idéia não era desafogar a Justiça comum, mas prestar um serviço social àqueles que não tinham como ser ouvidos", disse.
A lei 9.099, de 1995, instituiu esses juizados -substituindo os antigos Juizados de Pequenas Causas- para atender causas cíveis com valor de até 40 salários mínimos (R$ 10.400,00). Para as causas que não excedem 20 salários mínimos (R$ 5.200,00) não é necessário ter advogado.
As causas mais comuns nos juizados são as que envolvem relação de consumo, de vizinhança e acidentes de trânsito.

Recursos
Segundo Scarabelli, a solução para a sobrecarga dos juizados depende de mais verbas. "Isso depende primordialmente do Executivo e do Legislativo no orçamento. Mais dinheiro no orçamento, mais infra-estrutura no juizado", disse.
O juiz Marco Antônio Botto Muscari, assessor da presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo, afirma que não há verba disponível, mas que algumas iniciativas podem ajudar a diminuir o problema. Segundo Muscari, no interior a demora não é tão grande quanto na capital e não se pode generalizar a lentidão do atendimento para todo o Estado.
Ricardo Chimenti, juiz da Turma Fixa do Colégio Recursal -responsável por julgar os recursos dos juizados- afirma que "o barco não está a deriva, não está afundando, mas está no limite da carga."
Segundo o STF (Supremo Tribunal Federal), o Estado de São Paulo concentra o maior número de ações em Juizados Especiais.
Não bastasse a concentração, há também o crescimento do número de processos distribuídos. De 1999 a 2003, conforme dados do Tribunal de Justiça de São Paulo , houve um crescimento de 273,5% no número de processos.
Existem atualmente 289 Juizados Especiais Cíveis instalados no Estado de São Paulo, sendo 273 no interior e 16 na capital.


Próximo Texto: Espera por decisão chega a três anos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.