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foco
"Faria tudo outra vez", diz cirurgião que operou paciente durante 51 horas
RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL
O médico Francisco Gregori Jr., 60, desenvolveu cinco
técnicas de cirurgia cardíaca
inéditas no mundo e criou
duas próteses de válvula do
coração. Publicou seis dezenas de estudos em concorridas revistas científicas. E, pelas suas contas, operou mais
de 26 mil corações.
Mesmo com o vasto currículo, Gregori Jr. só virou celebridade por vias tortuosas.
Seu último feito, ocorrido
no final de julho, ganhou o
noticiário nacional na semana passada. No Hospital
Evangélico de Londrina, no
Paraná, ele passou 51 horas
-mais de dois dias- lutando
pela vida de um paciente que,
após uma cirurgia, não parava
de sangrar. O vendedor de
carros Onivaldo Cassiano, 50,
havia sido internado para
corrigir um aneurisma na artéria aorta.
Liderada por Gregori Jr., a
equipe entrou na sala de cirurgia na manhã de 28 de julho (segunda-feira) e só saiu
na manhã do dia 30 (quarta-feira). Fora os breves intervalos para "lavar o rosto -tomar banho não-, trocar a camisa, tomar um suco, comer
um sanduíche e tirar um cochilo numa poltrona", as horas foram passadas lutando
pela vida do paciente.
Tentaram-se todas as técnicas possíveis para estancar
o sangue, de drogas coagulantes e suturas mais apertadas
ao uso das mãos para comprimir a hemorragia.
"Se fiquei exausto? Puxa, se
fiquei", diz. "Intimamente, eu
me dava prazos para resolver
aquilo. Depois de um tempo,
pensava: "Será que não está na
hora de parar?". Mas bastava
uma mexidinha dele para eu
ganhar de novo o ânimo. Cada
sinal de vida era uma euforia.
Eu não tinha como desistir."
A cirurgia consumiu todo o
estoque de sangue da região.
Naqueles dois dias, cem litros
de sangue passaram pelo corpo de Cassiano -o corpo humano contém, em média, sete
litros. Uma das razões para
ele ter sobrevivido foi o apoio
da população de Londrina,
que, atendendo aos apelos da
TV, doou sangue B+ em peso.
Gregori Jr. conta que, passadas aquelas horas intermináveis, tomou "um belíssimo
de um banho e um belíssimo
de um relaxante muscular" e
dormiu "belíssimas oito horas". "Acabei de me matricular numa academia. Preciso
estar em forma caso isso
aconteça de novo."
O cirurgião passou os últimos dias falando a jornais, revistas e emissoras de rádio e
TV. "Faz dias que não consigo
trabalhar", queixa-se. O paciente Cassiano, recém-saído
da UTI mas ainda hospitalizado, ia pelo mesmo caminho
até o médico, por razões óbvias, proibi-lo de continuar
com as entrevistas. "Você
acredita em milagre? Eu acredito. Só um milagre mesmo
para me tirar de uma dessas",
disse ele à Folha, a voz fraquejando, numa rápida entrevista por telefone.
A primeira vez que Gregori
Jr. ganhou os holofotes foi
em 1997. Sem saída após tentar de várias maneiras fechar
o orifício do coração de uma
mulher infartada, o cirurgião
decidiu, no desespero, recorrer à potente cola Super Bonder. Para assombro da comunidade médica, foi a salvação.
Apesar de todo o noticiário,
Gregori Jr. se diz avesso à celebridade e jura que ambos os
episódios foram divulgados
contra sua vontade.
"Gosto de ficar no meu
canto. No episódio da cola,
apareceram médicos me criticando nos jornais, na televisão. Foi um choque", diz.
"Mas eu sou impetuoso mesmo. Quando a porta é fechada
ali, você não imagina do que é
capaz um cirurgião cardíaco.
Antes de decretar a perda do
paciente, ele tenta tudo que
está na medicina e tudo que
não está. Nos dois casos, eu
faria tudo de novo."
Fora da medicina, Gregori
Jr. faz questão de ser o centro
das atenções. Com a mulher,
um dos filhos e dois amigos,
montou uma banda de rock
sugestivamente batizada de
Gregori's Heart Band (heart,
em inglês, significa coração),
que já tem "quatro CDs prensados na Zona Franca de Manaus". O cirurgião compõe,
canta (em inglês), toca gaita e
baixo. As apresentações são
em congressos médicos.
"Meu estilo vai mais para Bob
Dylan, Cat Stevens e Dire
Straights, algo assim."
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