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ADMINISTRAÇÃO
Por meio de convênios com a prefeitura, a terceirização nas áreas de saúde, limpeza e esporte é crescente
Rio contrata ONGs para serviços em favelas
FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO
Em áreas pobres do Rio, a violência transformou em rotina a
terceirização de serviços públicos
municipais, com a transferência
de ações de saúde, limpeza, esporte e assistência social para ONGs e
associações de moradores.
Por intermédio de convênios, as
entidades recebem da prefeitura
dinheiro para atuar numa determinada região e acabam desempenhando funções do Estado, como contratar pessoal. Nas comunidades, a terceirização e o serviço público convivem lado a lado.
O prefeito do Rio, Cesar Maia
(PFL), diz que a violência e o tráfico mudaram a forma de contratação nas favelas. Segundo ele, a terceirização é a saída para contratar
mão-de-obra local, pois é difícil
manter concursados em áreas
controladas por traficantes.
Maia cita a exigência, por parte
de organismos como o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e o Banco Mundial, de
participação do terceiro setor
(ONGs e entidades da sociedade
civil) na gestão de projetos.
Segundo dados obtidos pela Folhaem órgãos da prefeitura, 9.300
pessoas são contratadas dessa forma: têm a carteira de trabalho assinada por associações do terceiro
setor, com dinheiro transferido
pela prefeitura. A Prefeitura do
Rio tem cerca de 145 mil funcionários, entre ativos e inativos.
Em 2003 foram repassados pelo
menos R$ 115 milhões para projetos do tipo -cerca de 1,4% do orçamento anual do município. Há
também cerca de R$ 16 milhões
para projetos contratados a longo
prazo, como o Favela Bairro.
Os programas de terceirização
incluem projetos experimentais e
políticas de maior escala, como o
programa de saúde da família.
A violência tem sido fator determinante para esse tipo de política.
Foi assim, por exemplo, que começou o projeto dos garis comunitários em favelas do Rio, em
1995. Obrigada, muitas vezes, a
interromper o trabalho por causa
dos tiroteios, a Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana) optou por repassar o dinheiro
para as associações de moradores,
que contratam os garis. Hoje há
2.557 garis comunitários na cidade. Para o gari comunitário, o salário base é o mínimo (R$ 240);
para o da Comlurb, R$ 400.
Na saúde, a prefeitura tem recorrido a ONGs e associações de
moradores para implantar, em
comunidades pobres, os programas de saúde da família e agentes
comunitários, que atendem hoje
400 mil pessoas em favelas. A folha de pagamento mensal dos
dois programas vale R$ 2 milhões.
No complexo de favelas da Maré (zona norte), as associações
chegam a gerenciar oito postos.
Recebem dinheiro da prefeitura
para contratar médicos, enfermeiros, dentistas. A prefeitura
fornece os medicamentos.
As creches também são um
exemplo de área em que o poder
público não dá conta da demanda. A rede conveniada (creches
criadas pela sociedade civil, às
quais a prefeitura repassa gêneros
alimentícios para a merenda e/ou
funcionários) é maior que a rede
de creches municipais. Enquanto
a conveniada atende 25 mil crianças, a rede própria atende 19.193
crianças de zero a três anos.
Vantagens e riscos
Especialistas, políticos e gestores apontam vantagens e riscos
desse tipo de política. Entre as
vantagens, a agilidade do processo de contratação, a geração de
emprego local e a facilidade de
acesso a locais perigosos, já que a
mão-de-obra, recrutada na comunidade, tem trânsito livre.
Os riscos são a transferência de
responsabilidades do poder público para a sociedade civil, o
clientelismo político e, no caso do
Rio, a apropriação das entidades
por grupos criminosos, como os
traficantes de drogas.
Em duas áreas da cidade onde
foi implementado o projeto Mel
(da Fundação Rio Esportes), a Penha (zona norte) e a Rocinha (zona sul), a Folha viu faixas do projeto com nomes de duas vereadoras da base política de Maia, Rosa
Fernandes (PFL) e Patrícia Amorim (PFL), hoje secretária municipal de Assuntos Estratégicos.
Uma pesquisa da Assembléia
Legislativa revelou que, de uma
amostragem de mil líderes comunitários, cerca de 400 foram cooptados pelo tráfico em dez anos.
Licitação
Na maior parte dos casos, os
convênios são feitos sem licitação.
A Prefeitura do Rio afirma que
não há ilegalidade, por entender
que a licitação é considerada dispensável ou inexigível, de acordo
com a lei 8.666: contratos de pequeno valor, notória especialização ou impossibilidade de competição (por exemplo, na contratação de associação de moradores
para atuar em uma favela).
Para regulamentar esse tipo de
convênio, o decreto municipal
19.752, assinado por Maia, fixa
um processo de seleção para casos em que, pela lei federal, a licitação seria dispensável ou inexigível. O decreto exige que a entidade tenha reputação comprovada.
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