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"Rádio funcionava", dizem pilotos do Legacy
De volta aos Estados Unidos, Jan Paladino e Joe Lepore reafirmam que seguiram plano ditado pelo controlador de vôo
Americanos fazem críticas às autoridades brasileiras e afirmam que não dá para garantir que transponder estava inoperante no ar
ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL A NOVA YORK
Na primeira entrevista a um
jornal e também à imprensa
brasileira, os pilotos americanos Joe Lepore e Jan Paladino,
do Legacy que se chocou em 29
de setembro com o Boeing da
Gol, na maior tragédia da aviação brasileira, disseram que o
rádio do jato "funcionava bem,
perfeitamente bem", apesar de
quase 30 tentativas malsucedidas entre eles e o Cindacta-1, o
centro de controle de Brasília.
O advogado americano Robert Torricella, que participou
ativamente da entrevista, concedida na última sexta, num
hotel de Nova York, fez constantes sinais aos clientes, especialmente quando poderiam
criticar o Brasil, as autoridades
ou o sistema de vôo. E respondeu a várias perguntas feitas a
seus clientes. Exigiu, inclusive,
que as duas fitas da conversa
lhe fossem entregues assim que
transcritas em português no
mesmo dia. Assumiu compromisso de destrui-las, sem uso
na investigação.
Lepore, 42, nascido na Itália,
filho de italianos, mudou-se para os EUA aos sete anos, é casado e tem dois filhos. Paladino,
34, pai argentino e mãe espanhola, também é casado, sem
filhos.
(ELIANE CANTANHÊDE)
FOLHA - Vocês conheciam bem o
Legacy? Quanto tinham voado nele?
JOE LEPORE - Sou piloto há 20
anos, treinei 20 horas no simulador e, além disso, tenho voado
há bastante tempo em aviões
bem semelhantes. O equipamento me era muito familiar.
JAN PALADINO - Sou piloto há 16
anos, tinha voado bastante como comandante no Embraer
145, cópia exata do Legacy.
FOLHA - Vocês estudaram adequadamente a rota e o plano de vôo?
LEPORE - Eu olhei previamente
diferentes possibilidades que
poderiam nos dar no plano de
vôo e, quando chegou, olhei detalhadamente com o Jan e digitei os pontos de navegação em
nosso sistema de computador.
FOLHA - Então vocês sabiam que
seria contramão voar em altitude
ímpar entre Brasília e Manaus?
ROBERT TORRICELLA - A questão é
outra. É bastante comum que
aeronaves tenham autorização
para voar em altitudes não regulares ou padrão, isso depende dos centros de controle.
FOLHA - Como foi a autorização em
São José? O que o controlador disse?
TORRICELLA - Isso está sob investigação, eles não podem reproduzir a conversa, está sob sigilo.
FOLHA - Então, qual foi a autorização que receberam em São José?
LEPORE - Eles me autorizaram a
voar a 37 mil pés até Manaus.
FOLHA - Você concluiu que deveria
ir nessa altitude todo o tempo?
LEPORE - Se quisessem que fizéssemos algo diferente, teriam dito.
FOLHA - Há dúvida se houve falha
de comunicação entre a torre, que
pode ter falado num só nível até
Brasília, e os pilotos, que entenderam uma só altitude até Manaus.
TORRICELLA - Não há nenhuma
dúvida de que o controle de São
José deu uma "clearance" para
Manaus voando em 370 [37 mil
pés]. A "clearance" se tornou o
plano de vôo em vigor, e a lei
exige que eles sigam isso. As regras são as mesmas no Brasil,
nos EUA e internacionalmente.
FOLHA - O relatório preliminar disse que houve quase 30 tentativas
frustradas de contato por rádio, sete
dos controladores, o resto de vocês.
PALADINO - Posso garantir que
nossos rádios estavam funcionando apropriadamente, tanto
que recebíamos transmissões
em português de Brasília durante todo o vôo.
FOLHA - No relatório da PF, eles dizem que o transponder ficou desligado por 50 minutos. Por quê?
PALADINO - Não vimos nenhuma prova de que o transponder
estava inoperante, poderia ser
outro problema.
TORRICELLA - Esse é o problema
com a investigação da polícia.
Os investigadores concluem
coisas antes que os investigadores aeronáuticos, que são profissionais.
FOLHA - A polícia os indiciou dizendo que há um diálogo entre vocês na
caixa-preta confirmando que ambos sabiam que o transponder estava fora do ar. Qual foi esse diálogo?
TORRICELLA - Como sempre dissemos, nós não pretendemos
tornar públicos detalhes específicos das gravações. Mas Joe e
Jan já responderam que o
transponder estava ok.
FOLHA - Como foi esse período [no
Brasil]?
LEPORE - Muito duro. Não sabíamos o que acontecia dia
após dia, todas aquelas acusações sendo feitas.
PALADINO - Foi um tempo muito emocional e aquelas acusações contra nós... Em respeito
às famílias, ficamos em silêncio. Nós queríamos que os fatos
surgissem, sabíamos que isso
eliminaria as falsas acusações.
Nunca pensamos que ficaríamos tanto tempo detidos no
Brasil. Assim, nós tínhamos
medo. A nossa liberdade estava
sendo tirada de nós.
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