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ADMINISTRAÇÃO
Prefeita já tirou R$ 985 mil da pasta; gover no diz que dinheiro foi usado para divulgar combate à dengue
Marta paga publicidade com verba da saúde
CHICO DE GOIS
SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL
A prefeita Marta Suplicy (PT)
retirou verbas da Secretaria Municipal da Saúde, destinando-as à
publicidade. Entre junho do ano
passado e o último sábado, pelo
menos R$ 985 mil que deveriam
ser gastos com saúde seguiram ou
para a Secretaria de Comunicação
ou diretamente para a conta das
agências de publicidade que prestam serviços à prefeitura.
A administração petista afirma
que o dinheiro foi destinado para
a produção de peças publicitárias
para o setor da saúde. A medida,
no entanto, fere o artigo 19 das leis
13.104/00 e 13.258/01, que fixam as
regras para a execução dos Orçamentos de 2001 e deste ano. As leis
vetam a transferência de recursos
das secretarias de Educação, Saúde, Assistência Social, Habitação e
Desenvolvimento Urbano para
outras pastas do governo.
Foi isso o que ocorreu no ano
passado. Em dois decretos assinados por Marta -40.702, de 6 de
junho de 2001, e 41.412, de 23 de
novembro-, R$ 700 mil saíram
da Saúde -eram recursos do
PAS e do Fundo Municipal da
Saúde- para a Comunicação.
No último sábado, mais: por
despacho, R$ 285 mil reservados
para "apoio à redução de danos e
riscos à saúde" serviram para pagar as agências Agnelo Pacheco,
Markplan e PG Comunicação.
Para investigar as transferências, o Ministério Público abriu
ontem um inquérito sob a suspeita de que elas configuram atos de
improbidade administrativa.
"O artigo 19 [das leis orçamentárias dos dois anos" é claro. Veda
o repasse [a partir da Secretaria da
Saúde" e não faz exceção para
propaganda. Portanto, o ato pode
ferir o princípio da legalidade",
disse o promotor Sérgio Turra, da
Promotoria da Cidadania.
Na transferência direta de recursos da saúde para as agências
de publicidade, a suspeita é de
"desvio de finalidade" da verba.
Pelo artigo 11 da lei 8.429/92,
configuram improbidade administrativa ações ou omissões que
atentem contra os deveres da honestidade, da imparcialidade e da
legalidade. As penas: ressarcimento do dano, perda da função
pública e suspensão dos direitos
políticos por até cinco anos.
A questão, porém, é juridicamente controversa. Ao pé da letra,
dizem advogados e promotores, a
prefeitura está ferindo a lei. A seu
favor afirmam os mesmo profissionais, ela pode alegar -e tem
de provar- que, em todos os casos, usou os recursos para publicações de interesse da Secretaria
da Saúde -no decreto de novembro está escrito que a verba irá para "Publicidade da Campanha de
Combate à Dengue".
"A questão é polêmica. Há um
conflito entre a interpretação finalista e a formal. Pela primeira,
vale o raciocínio do governo, já
que os recursos, em tese, serviram
ao interesse da própria Secretaria
da Saúde. Pela interpretação formal, porém, é possível dizer que a
lei proíbe, sem especificações, o
remanejamento dessa verba",
afirma Pedro Estevam, professor
de Direito Público da PUC. Segundo Estevam, não há jurisprudência para essa questão.
Mas advogados consultados pela Folha afirmaram que os juízes
das Varas da Fazenda Pública têm
sido mais legalistas, o que pode
trazer problemas ao governo.
Além dos tribunais, a prefeita
pode ter de encarar um julgamento político. No artigo 73, a Lei Orgânica do Município prevê que "o
prefeito perderá o mandato, por
cassação, (...) quando (...) atentar
contra a lei orçamentária". Para
que os vereadores se manifestem
sobre a questão, o caso deve ser
denunciado ao Legislativo por
um parlamentar ou eleitor.
Programas sociais
Em despacho secretarial de sábado passado, o então secretário
de Comunicação, Valdemir Garreta (que deixou o cargo na última
quarta), manda retirar das contas
de três programas sociais -Renda Mínima, Começar de Novo e
Bolsa-Trabalho- R$ 2,5 milhões
para completar a verba das agências de publicidade.
Os programas são da Secretaria
do Desenvolvimento, Trabalho e
Solidariedade, da qual a lei orçamentária não impede que sejam
transferidos recursos. Além disso,
um decreto de janeiro passado
permite que uma secretaria delegue competência a outra para
cumprir seu plano de trabalho.
Dito isso, há nessa transferência
dois problemas. O primeiro: a Lei
de Diretrizes Orçamentárias diz
que os gastos com publicidade
têm de sair sempre da dotação
"publicações de interesse do município". Como ela não existe na
secretaria de Trabalho, o dinheiro
saiu, nesse caso, de "outros serviços de terceiros". No fechamento
do ano, isso deixará subestimados
os gastos com a publicidade e fará
crer que mais dinheiro foi efetivamente entregue à população pelos
programas sociais.
O segundo ponto: os R$ 2,125
milhões que saíram do Renda Mínima e do Bolsa-Trabalho, apesar
de terem sido usados em comerciais dos programas, acabarão somados como gasto com educação
graças às alterações que o Executivo fez este ano na composição
dessa despesa. Ou seja: gastos
com anúncios serão somados como gastos com educação.
A prefeitura diz que não há irregularidade nisso, pois a nova redação do projeto da educação
permite a inclusão de "custos de
produção e transmissão de programas de educação (...) veiculados em rádio e TV" nas chamadas
"despesas com educação". Além
disso, diz o governo, só a divulgação garante que as pessoas procurem se cadastrar. E do cadastramento voluntário depende a existência dos programas.
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