São Paulo, quarta-feira, 18 de julho de 2007

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GILBERTO DIMENSTEIN

Santa digital

Aperta-se um botão, ao lado da imagem de santa Rita, e ouve-se uma oração gravada digitalmente

A PARÓQUIA SANTA RITA de Cássia no Pari, zona leste, virou um laboratório de tecnologia da informação graças a uma promessa de um especialista em equipamentos de som. Os fiéis ganharam inusitadas engenhocas digitais na forma de velas, oratórios e sinos. "Fui beneficiado por um milagre", diz João Barassal, devoto de santa Rita, a santa das causas impossíveis.
João já tinha 49 anos e sua mulher, 43, e não conseguiam ter um filho. O casal passou por vários traumas. Após um tratamento, a mulher de João conseguiu engravidar, mas, no quinto mês de gestação, eles perderam o filho. Tentaram mais uma vez a fertilização. Vieram, então, trigêmeos. Na nona semana de gravidez, dois fetos se foram -e o médico tinha advertido de que o terceiro não sobreviveria. João fez a promessa: "Santa Rita, se você me der esse filho, vou inovar a sua igreja".
Antes mesmo de ter o seu pedido atendido -a mulher de João estava ainda no quinto mês de gravidez-, a promessa começou a ser cumprida. Foi criado um oratório digital. Aperta-se um botão, ao lado da imagem de santa Rita, e ouve-se uma oração gravada digitalmente. Foi apenas uma questão de adaptação tecnológica: ele já tinha colocado aquele equipamento nos estacionamentos de shopping centers e nos alertas de dispositivos anti-roubo de automóveis.

 

Tanto a devoção a santa Rita como o prazer pela eletrônica sempre fizeram parte da vida de João Barassal, cujo apelido, nos tempos da adolescência, era "Joãosom". Ele fazia bicos preparando o som e a iluminação de baladas. Era natural que optasse por estudar engenharia eletrônica, mas não deu certo. "Tive de trabalhar cedo, deixei a faculdade." Anos depois, quando voltou a estudar, sua opção foi o marketing, mas continuava ligado à eletrônica, produzindo aparelhos digitais. Sua grande frustração era a falta de filhos, para a qual parecia não haver tecnologia que servisse. "Só posso atribuir a santa Rita a vinda de meu filho, depois que os médicos foram tão pessimistas."
 

Ao combinar as duas devoções, ele foi reinventando a igreja. "Fiquei impressionado com a reação dos religiosos." Algumas senhoras colocam o celular no alto-falante digital para transmitir a reza a parentes internados em hospitais. Toca-se numa imagem de Cristo e ouve-se o relato de uma passagem bíblica. Foi criado até mesmo um sino digital -a igreja estava sem sino -, com os mais diferentes tipos da badalada. Nesse laboratório, levaram-se em consideração as preocupações ecológicas. Luzes artificiais, comandadas por um software, reproduzem o movimento e a intensidade das labaredas de uma vela da cera. "Com isso, evito a poluição atmosférica."
 

Há uma possibilidade de que toda essa devoção tecnológica e religiosa renda, em agosto, frutos terrenos. Como muitos dos produtos da igreja tiveram aceitação entre os fiéis, João exibirá suas invenções em um evento batizado de ExpoCatólica. É um segmento em que ele jamais pensou atuar. E, mais uma vez, agradece: "Mais um favor da santa Rita".

gdimen@uol.com.br


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