São Paulo, quarta-feira, 18 de agosto de 2010

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TUDO POR UM CABELÃO

Madames, mulheres de jogadores e patricinhas trocam grandes salões da Barra da Tijuca , no Rio, para serem atendidas por cabeleireiro especializado em "mega hair" numa favela vizinha

Rafael Andrade/Folhapress
Líbia Miranda chega ao salão de Raí Martins, que tem mulheres da Barra como clientes, na favela Gardênia Azul

ITALO NOGUEIRA
DO RIO

Em busca do melhor "mega hair" da cidade -em qualidade e na relação custo benefício-, empresárias, mulheres de jogadores de futebol, madames e patricinhas percorrem com seus carros do ano as ruas esburacadas e cheias de entulho de uma favela da zona oeste carioca.
Elas buscam o cabeleireiro Raí Martins, 30, que depois de quatro anos trabalhando em salões da Barra da Tijuca, montou seu próprio negócio na favela Gardênia Azul, espremida entre a Barra da Tijuca e o Recreio dos Bandeirantes, na zona oeste.
Nos anos que passou em salões refinados, Raí formou uma clientela endinheirada, disposta a gastar até R$ 2.000 para ter seus cabelos alongados.
A vizinhança de barracos pobres e biroscas não espantou as adeptas das longas e lisas cabeleiras "fabricadas" por Raí. No salão de Gardênia Azul, elas ainda encontram uma vantagem extra: o "mega hair" sai por R$ 400.
Há dois anos e meio no Rio, a baiana Líbia Miranda, 30, é cliente assídua.
Ela diz que o bolso não pesa na escolha. "O que vale é a qualidade do trabalho de Raí. Muita gente acha que aqui não pode ter um bom serviço, mas tem."
Ele garante que o padrão é o mesmo de quando trabalhava na Barra da Tijuca: continua usando em seus apliques longos fios de cabelo vindos da Indonésia -ao lado da Índia, a "meca" dos adeptos dos alongamentos. "Usando cola de queratina, não é amarrando com elástico", frisa.
À porta do pequeno salão, já estacionaram Porsches, Volvos, Hylux, entre outros carrões, conta o cabeleireiro. Param ao lado de caminhões de entrega de botijões de gás e carrocerias de veículos abandonados.
Antes de decidir abrir seu salão, Raí passou uma temporada atendendo suas cerca de 90 clientes em domicílio. Não deu conta. "Eram muitos pedidos", diz.
"Minhas clientes pediam para abrir [o salão] na Barra, mas lá eu pago R$ 2.000 de aluguel, e aqui, R$ 500", explica. As clientes, então, não tiveram outra opção: seguiram o cabeleireiro.
Área de atuação de milícias (grupo de policiais e ex-agentes que impõem taxas em troca de suposta segurança), a favela é considerada tranquila -não se veem homens ostensivamente armados. Mas entrar e estacionar o próprio carro nas ruelas assustou algumas clientes.
O medo foi superado. Mais difícil é esquecer as mordomias dos grandes salões.
"Aqui não tem capuccino, mate, café... Mas é o serviço que conta", disse a estudante de direito Fernanda Mesquita, 26, moradora da Barra da Tijuca, após comprar uma Coca-Cola Zero e um pacote de biscoito Fofura, vendido a R$ 0,50 na birosca vizinha.
Raí também atende as vizinhas da favela, que ganham descontos de até 50%.


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