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VIOLÊNCIA
Investigador do Pará relata sessões de tortura usadas para obter confissões ou apenas castigar preso
Policial diz usar palmatória e choque
do enviado a Belém
Palmatória de
madeira ou ferro,
máquina de choque
elétrico, espancamento. Esses são os
principais métodos
de tortura empregados por um
investigador da Polícia Civil do
Pará, de acordo com seu depoimento -gravado- à Folha.
Há cerca de 15 anos na polícia e
com aproximadamente 40 anos
de idade -não são publicados os
números exatos para evitar a
identificação-, o investigador
afirma ser um dos policiais menos
violentos entre seus pares.
Ele mostrou documentos e relatou casos que de fato ocorreram,
conforme a reportagem confirmou posteriormente.
A seguir, trechos da entrevista
feita em Belém, com o compromisso de silêncio sobre a identidade do personagem:
(MÁRIO MAGALHÃES)
BANDIDOS - "O bandido não
trabalha com o policial como o
policial deve trabalhar com ele. O
bandido dificilmente se rende.
Um assaltante de banco dificilmente te dá um bom dia ou uma
boa tarde, nem te pede desculpa.
A gente tem que trabalhar com
esse tipo de gente da mesma maneira que eles nos tratam. Não
nos recebem com flores, só para
mandar para o enterro."
BOLOS - "Há o caso de um homicida que tinha um parceiro. O
homicida foi detido como suspeito e depois acusou o parceiro dele. Teve que pegar uns bolos [golpes de palmatória"."
MÉTODO - "Tem que pegar a
palmatória mesmo e dar uns bolos no caboclo até ele não aguentar mais. Quando ele não aguentar mais, ele entrega. De uma maneira ou de outra, ele não vai entregar com a gente dizendo "diz
que não vai acontecer nada contigo, eu te prometo que tu vais ser
liberado".
Dessa maneira, não tem juiz,
promotor, desembargador que
consiga. A polícia tem uns métodos de fazer o caboclo confessar.
Com a pressão, o modo de falar
com ele, o policial intimida."
INSTRUMENTOS - "A palmatória é de madeira ou ferro. É
grossa, (tem) uns 8 cm de largura,
com uns 25 cm de cabo e 10 cm,
15 cm de diâmetro. No caso daquele homicida, teve bolo na mão
e no pé. O pé fica virado para cima. Nesse caso não houve choque, mas há casos em que é preciso.
O homicida ficou uns 25 minutos (apanhando). O cara chora. O
cara é carnal, chora. Se você levar
30 bolos de um lado e 20 do outro, se nunca apanhou da mãe,
entrega tudo."
NORMALIDADE - "Palmatória
é negócio normal. Se você for
fundo, dentro do centro de menores daqui, aqueles menores infratores apanham de palmatória
lá, porque eles não respeitam
nem o pai nem a mãe.
Conhecia um sujeito que era
professor lá e que sempre vinha
com a cabeça quebrada. Os pivetes pegavam um pedaço de pau e
davam na cabeça do professor.
São pessoas irrecuperáveis, que
saem de manhã e voltam à noite.
De manhã, assaltam. Depois, voltam para se esconder no centro
de reabilitação."
EXCITAÇÃO - "Uma vez tinha
um ladrão que só queria roubar
casa de policial. Ia atrás de casa de
investigador e delegado porque
sabia que lá tinha arma. Levava
tudo, quando não tinha gente em
casa. Prendemos esse caboclo, levamos para a delegacia. Foi preciso usar de violência com ele. Ele
não dizia de jeito nenhum, não
confessava, e a gente tinha certeza
de que era ele. Ele era cínico.
A gente falando com ele e ele
rindo da cara da gente: "Me bate,
me bate que eu vou dizer para a
doutora. Olha, bate aqui." A doutora é a juíza.
Eles excitam a gente. Às vezes,
batem até com a cara na parede
quando querem incriminar o policial. O elemento dá com a cara
na grade para, quando o promotor vier, ele acusar o policial de
quem têm mais raiva. Demos pau
nesse cara, uma sova normal. De
outra maneira, você não fica respeitado. Quando ele sair e o vir na
rua, ele vai embora."
MARCAS - "É difícil não aparecer no corpo. O que não aparece
mesmo é no estômago. O cara
perde o fôlego e não quer pegar
outra."
RAIVA - "Já aconteceu comigo
[espancar por sentir raiva". Um
ladrão entrou na minha casa, eu
de serviço, minha esposa gestante. Levou minha bicicleta, meu
som, minha televisão. Entorpeceram minha esposa.
O elemento espalhou: "Não estuprei a mulher do samango [policial", porque ela estava gestante". Foi pior do que se tivesse feito,
de tanta raiva (que) fiquei. Quando se mata um investigador, os
outros investigadores vão atrás e
não deixam barato. É para moralizar a corporação.
Se você mata um policial hoje e
não acontece nada, amanhã vão
matar mais outro e mais outro.
Quando você vê, não tem mais
pulso."
SURRA - "Num dia, estava de
plantão, com ódio do samango,
peguei, dei muita porrada nele.
Depois de um bom tempo, esse
ladrão apareceu morto e eu fiquei
como suspeito.
Acredito que tenha sido outro
bandido, porque ele tinha matado outro bandido. Esse elemento
tinha pacto com o diabo. Toda
sexta-feira cortava o braço e derramava sangue na encruzilhada.
Não me lembro exatamente o
que fiz com ele, porque eu fiz tanta coisa, dei tanto pau nesse cara.
Soco, pontapé, cassetete, com tudo o que tinha.
Quando você vê um policial pegar um bandido e destroçar, só vê
o lado do polícia, não vê o que o
bandido fez. Amarrei ele, dei porrada, fiz tudo o que podia fazer.
Naquele momento, se ele morresse, era melhor, tá entendendo?
Soco, tapa, pontapé, todo o tipo
de violência."
MEDO - "Só durmo com o revólver embaixo da cabeça. E sozinho, porque o pessoal tem medo
que eu sonhe e atire. Um policial
prende mil bandidos e não guarda a cara de cada um deles. Mas
mil bandidos guardam a cara de
um policial."
DEMÔNIOS - "O promotor de
Justiça e o juiz são pessoas qualificadas para fiscalizar e aplicar a lei.
Só que eles estão acostumados a
trabalhar com todo o tipo de pessoas más lá dentro do gabinete. E
nós trabalhamos aqui fora.
Lá dentro os bandidos são anjos. Aqui fora, demônios.
Um promotor nunca vai conseguir resolver (casos) usando filosofia, sociologia, relações públicas, relações humanas com um
bandido para ele confessar que
matou fulano ou sicrano."
PIMENTA - "Se eu estiver convencido de que é um criminoso,
não há motivo nenhum para fazer nada. Se eu tenho certeza de
que foi ele, e ele não quer confessar, o que se pode fazer?
Ele entrega. Porque aí está defendendo a integridade física dele. O caboclo só sente a pimenta
arder quando é nele. Quando é
nos outros, é mel. Se eles pegam,
matam, torturam e estupram,
não é o corpo deles. Quando passa a ser o corpo deles, aí não querem para eles.
Lá em São Paulo, o maníaco do
parque entregou tudinho. Quem
foi que viu aquele rapaz sendo interrogado? De bom coração não
iria entregar. Só pode ter sido na
porrada. O cara que começou negando e depois mudou de opinião? Resolveu entregar tudo?"
PACIÊNCIA - "Tem cara que
chega à delegacia e lhe torra a paciência. Tem delegados que já deram até tiro para cima na delegacia por causa de aborrecimento
com preso.
O policial às vezes comete esse
tipo de barbaridade porque quase 90% dos policiais têm problemas psicológicos. Saem de casa
para trabalhar, às vezes não deixam nada. Na rua, aturam abuso
dos outros.
Às vezes se vingam, por uma
coisa que não podem realizar
-tua família tá lá ruim, tu tá aqui
trabalhando e pegando abuso.
Vinga no preso, no vagabundo.
Às vezes você está bem tranquilo, vem aquele cara que já entrou,
30, 40 vezes ali (na delegacia). "Pô,
de novo, rapaz? Então vais pegar
mais tapa para ti...'
É como o pai quando o filho
continua... "Pô, tu não te ajeitas?"
Não tem quem se ajeite. Quero
que me diga um cara que pegou
muita porrada e se corrigiu."
ORDINÁRIO - "Eu conhecia um
elemento que dava tanto trabalho, era tão ladrão, tão perigoso,
tão ordinário, que quando não tinha quem roubar ele pendurava a
camisa dele num galho de pau e
ficava escondido, ficava olhando
para um lado e para o outro.
Quando ninguém via, ele ia e
roubava a própria camisa, só para
não deixar de roubar. A gente já
estava de saco cheio dele e teve
que dar sumiço nesse caboclo. Ele
reagiu à prisão e nós não demos
chance para ele."
DIREITOS HUMANOS - "Se um
elemento desse mata uma pessoa... Eu queria que acontecesse
com um parente de juiz, desembargador, (ativista de) direitos
humanos.
Eu queria que o representante
dos direitos humanos estivesse
amarrado, sequestrado, e o vagabundo metendo um alfinete todo
dia em várias partes do corpo dele, torturando. Gostaria que ele
sentisse essa tortura do bandido
que defende.
Tem casos em que não deveria
haver tortura. Mas cada caso é
um caso. Uma pessoa que roubou uma alimentação por necessidade não poderia apanhar. Mas
às vezes apanha. Há policiais que
não estão preparados."
TODOS CONTRA - "Os direitos
humanos não vão atrás da minha
mulher, se ela for estuprada por
um bandido. Mas, se eu pegar um
bandido e arrebentar, der muita
porrada, amarrar e torturar, aí
vêm os direitos humanos em cima de mim. Os direitos humanos
só estão aí para prejudicar policiais.
Tem Ministério Público para
trabalhar contra a polícia, ouvidoria, Corregedoria da Polícia Civil, Corregedoria da Polícia Militar e ainda tem mais a opinião pública e mais o bandido.
O que é que o policial tem para
trabalhar a favor dele? E há a lei
para atrapalhar o policial. Ponho
o bandido na cadeia, em 72 horas
ele sai e vai à minha casa para me
matar."
RESPEITO - "Minha mulher sabe que policial tem que ser respeitado. Policial bonzinho não é respeitado. Vagabundo falou para
mim: eles só respeitam aquele policial que é brabo, escroto."
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