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SOCIEDADE INVOLUNTÁRIA
Sapateiro descobriu que era sócio de viação quando a conta bancária foi bloqueada pela Justiça
"Fiquei doido, não conseguia dormir"
DA REPORTAGEM LOCAL
Em comum, a profissão de sapateiro, o fato de terem trabalhado na mesma fábrica de calçados,
na zona leste de São Paulo, e o salário em torno de R$ 600. A quarta
coincidência, José Simões, 51, e
Gilson Nascimento de Oliveira,
34, só descobriram quando não
eram mais colegas. Os dois sapateiros apareciam como sócios da
Auto Viação Tabu Ltda., empresa
que já operou com uma frota de
206 ônibus na capital paulista.
Pelos registros na Jucesp (Junta
Comercial do Estado de São Paulo), os dois figuraram como donos da empresa de ônibus de 19 de
dezembro de 1996 a 31 de março
de 1998. Os sapateiros descobriram de forma traumática que tinham herdado as dívidas da empresa relativas a esse período.
Oliveira foi o primeiro a descobrir o esquema. Quando foi sacar
R$ 100, no final de 2000, uma
mensagem no caixa eletrônico do
banco o surpreendeu: "Conta bloqueada por ordem judicial".
Da gerente do banco, ele ouviu
pela primeira vez que aparecia como dono de uma empresa de ônibus. O bloqueio de seus bens fora
determinado pela Justiça por causa de uma dívida trabalhista da
Tabu de R$ 7.500.
A ação foi julgada à revelia porque Oliveira não foi achado -o
endereço registrado na Jucesp era
falso. "A minha reação foi a mais
desoladora possível. A gente vive
sossegado e acaba envolvido nisso, sem poder fazer nada."
Oliveira avisou Simões de que
seu nome também aparecia como
sócio. A fábrica de calçados fechou, mas os dois mantiveram
contato em Itaquaquecetuba
(Grande SP), onde viviam.
Simões resolveu esperar. Em
um sábado à tarde, quatro meses
atrás, ele foi surpreendido em sua
casa por um oficial de Justiça.
Nervoso, não conseguiu ler o documento. A citação era de uma dívida fiscal de mais de R$ 200 mil.
Depois, Simões diz que passou a
sofrer de insônia. "Eu fiquei doido, não conseguia dormir", diz o
sapateiro. "Minha família também ficou muito indignada", afirma Simões, que divide a casa de
dois dormitórios no bairro Marengo, em Itaquaquecetuba, com
a mulher, quatro filhos e um neto.
O termo "laranja", para ele, tem
um significado próprio. "Dizem
que laranja é trouxa. Mas eu não
sou trouxa. Como saber quando
alguém vai usar seus documentos?", questiona, no balcão de
uma sapataria que conseguiu
montar em Itaquaquecetuba.
Simões e Oliveira não sabem como seus nomes foram usados na
fraude. Oliveira chegou a ir à Justiça para se informar sobre a decisão, mas, confuso com o emaranhado jurídico, desistiu e se mudou para Santa Catarina em 2002.
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