São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EXTREMOS DA SEGURANÇA

Em busca de moradores, prefeitura doou terreno a quem construísse casas na cidade

Balbinos é reduto de paulistano cansado da violência urbana

DA REPORTAGEM LOCAL

Os vizinhos iam chegando pela manhã e arrumando a casa, lavando a roupa. De tornozelo engessado, Maria José da Silva Bezerra, 61, assistia a tudo surpresa. Tinha decidido viver em uma cidade do interior já pensando em atitudes como essas, mas não esperava tamanha solidariedade em tão pouco tempo.
"Na cidade de São Paulo, onde vivi por mais de 30 anos, nem quando minha mãe e minhas irmãs morreram os vizinhos me deram uma palavra de consolo", afirma a dona-de-casa. Sem filhos, ela e o marido, José de França Bezerra, 50, mudaram-se há oito meses para Balbinos.
Os dois construíram uma casa no bairro São Judas Tadeu, também conhecido como Vila São Paulo. Nos últimos anos, o local se tornou um núcleo paulistano em Balbinos. Os antigos moradores da capital paulista fugiram principalmente da violência.
Boa parte recebeu terreno grátis da prefeitura. Desde 1992, para aumentar a população -a cidade chegou a ter 700 habitantes, metade do que tem hoje-, o município cedeu áreas, desde que o beneficiado se comprometesse a erguer as paredes de alvenaria e colocar telhado em nove meses. Só quatro áreas foram retomadas.
Foram doados cerca de 200 terrenos, 70% deles para pessoas vindas da capital. Metade dos beneficiados era aposentada. Cerca de 6.000 pretendentes se inscreveram na prefeitura, segundo Manoel Fernando Cunha, diretor de Obras e Patrimônio.
Em 2005, nenhuma área foi doada, mas o município iniciou negociação para comprar um alqueire e voltar a distribuir lotes no ano que vem.
Com aposentadoria de R$ 300, Maria vendia balas em um ponto de ônibus do bairro Cidade A. E. Carvalho, zona leste de São Paulo. Foi nesse local que ela conheceu uma mulher que tinha uma casa em construção em Balbinos.
Ao falar que pretendia se mudar para o interior, a mulher concordou em mostrar a cidade a Maria.
"Estava difícil sobreviver em São Paulo. Você podia sair e morrer. Aqui, você não tem medo que alguém arrombe a sua porta. E R$ 300 aqui é muito mais do que R$ 300 lá", afirmou ela.
Bezerra, que estava desempregado em São Paulo, afirma que vai ter dificuldade em conseguir bicos na nova cidade. "A pessoa precisa saber que aqui a vida é tranqüila, mas não é fácil. Não há emprego", afirma ele, que espera a abertura de um concurso para cargos na prefeitura.
Maria começou a descobrir a vida no interior quando, ironicamente, perdeu o equilíbrio, caiu na rua e quebrou o tornozelo. "Um a ambulância foi me buscar em casa e me trouxe. Quando isso acontece em São Paulo? Foi na minha doença que eu pude ver o amor do povo", afirma.
"Eu sei. São Paulo é São Paulo. Mas não tínhamos nem lazer", afirma Maria. "Hoje, pegar o carro e ir no supermercado na cidade vizinha já um passeio e tanto." (GILMAR PENTEADO)


Texto Anterior: Há 50 anos: Vaga no Conselho de Segurança é dividida
Próximo Texto: Extremos da segurança: Em Balbinos, furto de ovo é crime do mês
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.