São Paulo, sábado, 19 de abril de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Entrevista - Mozart Neves

Professor ainda resiste a seguir meta, diz educador

Presidente do movimento Todos pela Educação diz que entidade já fez gestores públicos refletirem sobre a necessidade da profissionalização nas escolas

OS GESTORES mudaram a forma de encarar a educação. Agora, falta isso acontecer entre os professores e diretores. Essa é a análise de Mozart Neves, presidente-executivo do Todos pela Educação -movimento de empresários, educadores, administradores públicos e da sociedade civil que definiu há dois anos os desafios para a educação. Em seguida, foram lançadas cinco metas (como alfabetização de todas as crianças até os oito anos) a serem atingidas até 2022. (FÁBIO TAKAHASHI)

DA REPORTAGEM LOCAL

Leia abaixo a entrevista concedida por Mozart (ex-presidente do conselho dos secretários estaduais de Educação) e Priscila Cruz, diretora-executiva do movimento.

 

FOLHA - Como o movimento avalia os resultados do projeto até agora?
MOZART NEVES -
O grande mérito neste primeiro momento foi contribuir para uma mudança de cultura na educação. Fizemos os gestores públicos refletirem sobre a necessidade da profissionalização, com metas e clareza de onde se pretende chegar. Antes, havia boas intenções, mas sem rumo definido. Era tudo focado no processo, e não no resultado, que é o aluno de fato aprender.
Agora, fui ao Piauí, cujo governador é do PT [Wellington Dias], e o secretário claramente aponta metas, resultados, premiação para os diretores por resultado. Aqui em São Paulo, com o PSDB, a Maria Helena [secretária estadual da Educação] também lançou premiação para os professores.
Isso mostra que é preciso separar o joio do trigo. Não dá mais para fazer educação pensando que todo mundo é igual, todos vestem igualmente a camisa. Não dá mais para dar reajuste linear a todos.
PRISCILA CRUZ- Monitoramento e avaliação eram palavrões. Hoje você pode travar um diálogo com gestores sem resistência.

FOLHA - Mas, tirando uma boa parte dos gestores, essa idéia ainda enfrenta muita resistência, especialmente de professores e diretores.
MOZART -
Sim, ainda há uma resistência de professores e diretores com a idéia de metas e resultados. Vai ser uma mudança cultural. Mas quando os bons resultados começarem a aparecer, eles verão que será positivo para eles.
PRISCILA - Ainda falta chegar ao que chamamos "chão de escola". Para chegar lá, precisávamos começar de algum lugar, que foram os gestores. Agora, vamos falar com toda a população, o que é um desafio, pois grande parte da população tem uma escolarização baixa. A demanda por educação de qualidade também acaba sendo baixa, porque a escola do filho é melhor que a que o pai teve. Se tiver merenda, já está bom. O que tem de haver nas classes mais baixas é o mesmo que acontece na classe A, com o Enem [exame federal que avalia os estudantes de ensino médio]. O pai quer saber: "Por que a escola do meu filho teve tal desempenho?".

FOLHA - Como o movimento vai trabalhar isso?
PRISCILA -
Trabalhamos pela via da comunicação, mas não apenas informando nossas metas mas também tentando orientar os pais, por meio de TVs, jornais e rádio. Vamos dar dicas que qualquer pai pode aplicar, independentemente da escolarização. Como perguntar como foi o dia do filho na escola.

FOLHA - O PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação), do MEC, completa neste mês um ano. Como vocês avaliam o projeto?
MOZART -
O PDE profissionalizou a gestão, com diretrizes para que cada município, a partir do seu diagnóstico, consiga estabelecer seu plano. Outra mudança importante foi no financiamento. Antes, funcionava como balcão de negócios. Um prefeito que havia prometido uma escola em um distrito fazia o projetinho e apresentava, sem grandes estudos para saber se aquilo era de fato necessário. Agora, há diretrizes claras, com ajuda aos municípios com mais dificuldades.
PRISCILA - E muitas vezes as prefeituras que menos precisavam eram aquelas que recebiam mais dinheiro, porque tinham estrutura de pedir recursos ao FNDE [órgão do MEC responsável pela distribuição de recursos]. Isso foi corrigido. Na avaliação do processo, não tem o que dizer. Eles conseguiram, em menos de um ano, a adesão dos 27 Estados e de 5.300 municípios. É uma vitória, porque indica que todos caminham para o mesmo lado.
Já os resultados na sala de aula ainda vão demorar para podermos avaliar. Isso só será possível quando saírem os novos resultados da Prova Brasil [exame do governo federal].
Ainda assim, será pouco tempo. Acho que apenas ao final do mandato do presidente Lula conseguiremos ver se a tendência de melhora se concretiza.

FOLHA - Uma das metas do movimento é o aumento dos recursos para a educação. Esse ponto não poderia ter uma ajuda dos empresários que estão envolvidos no projeto?
PRISCILA -
O investimento da iniciativa privada está entre R$ 1 bilhão e R$ 1,5 bilhão. Perante todo o dinheiro que é investido no país, não é nada [só o governo federal investiu R$ 14,6 bilhões em educação em 2004]. Mas não cabe à iniciativa privada competir com o setor público. Uma prefeitura não pode testar uma metodologia, com dinheiro do contribuinte, em apenas três escolas. Já uma fundação ou um instituto podem. Esse aprendizado, depois, pode ser oferecido para toda a rede, se der resultado. Muitos não dão. Por isso, o gestor não pode ficar testando com dinheiro público. Já as empresas podem encontrar metodologias novas.


Texto Anterior: Entrevista - Ivone Zeger: "Cônjuge usa a empresa para ocultar bens e evitar partilha"
Próximo Texto: Entrevista - Luiz Roberto Barradas Barata: Meta do Instituto do Câncer é ser como InCor, diz secretário
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.