São Paulo, Quarta-feira, 19 de Maio de 1999
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NA CÂMARA
Em duas horas e meia, vereador chorou 6 vezes
Viscome usa choro, acusa vereadores e pede ajuda a Maluf

Almeida Rocha/Folha Imagem
Viscome chora ao depor na comissão que analisa a cassação de seu mandato na Câmara Municipal de SP


OTÁVIO CABRAL
da Reportagem Local

Em duas horas e meia de depoimento, o vereador Vicente Viscome chorou pelo menos seis vezes, acusou colegas de corrupção e pediu ajuda para provar sua inocência ao prefeito Celso Pitta e ao ex-prefeito Paulo Maluf.
Viscome, preso há 53 dias acusado de concussão e formação de quadrilha, prestou depoimento na manhã de ontem à comissão processante que analisa o pedido de cassação de seu mandato.
O vereador, que foi expulso do PPB, conseguiu seguir à risca a estratégia da defesa: falar que é inocente, que não existem provas concretas contra ele e tentar emocionar os membros da comissão, que, antes de tudo, são seus "colegas".
Acompanhado de três advogados e escoltado por dois policiais militares, Viscome deixou o 29º DP (Vila Diva, zona sudeste), por volta das 7h, chegando meia hora depois à Câmara Municipal.
As primeiras lágrimas saíram dos olhos do vereador por volta das 8h, quando os sete membros da comissão processante chegaram ao plenário Prestes Maia, no primeiro andar da Câmara, onde aconteceu o depoimento.
Em fila indiana, os sete parlamentares abraçaram demoradamente Viscome. Quatro dos membros -Paulo Frange, Edivaldo Estima, José Olímpio e Dito Salim- pertencem ao PPB, partido que elegeu Viscome. Ele usou isso diversas vezes no depoimento, referindo-se a eles como seus "pares".
Mas até mesmo os dois vereadores de oposição da comissão, Aurélio Nomura (PSDB) e Aldaíza Sposati (PT), abraçaram Viscome antes do depoimento.
Quando começou a responder às perguntas, Viscome continuou usando a emoção para influenciar os vereadores. Por duas vezes, chorou, interrompendo o depoimento. Por diversas vezes, repetiu que é "muito difícil passar 52 dias na cadeia, lavando a cela e dando comida aos outros detentos". Em outra ocasião, disse que não imaginava que fosse trabalhar desde os 8 anos para, no fim da vida, "ficar preso injustamente, vendo a família ser desestruturada".
No final da sessão, quando teve a palavra para as considerações finais, Viscome apelou para a emoção de seus colegas. "Tenho certeza de que, na hora de votar minha cassação, é o coração dos meus colegas que vai mandar e eles irão me absolver." Em seguida, chorou pela quarta vez, interrompendo definitivamente o depoimento.
Após a sessão, em entrevista coletiva, chorou outras duas vezes.
As lágrimas de Viscome comoveram alguns membros da comissão. Para Dito Salim, a situação mostrou que é muito difícil julgar alguém.


"Sempre fui fiel ao Maluf. Ele tem que colocar a mão na consciência e vir me ajudar."
O presidente da comissão, Edivaldo Estima, afirmou ter ficado abalado ao ver o estado emocional do colega. "Uma situação como essa mexe muito com a gente. Além de ser humano, o Vicente é um colega. O sangue sobe à cabeça ao vê-lo nessa situação."
Paulo Frange, líder da bancada do PPB, também se impressionou com o depoimento. "A reclusão de 52 dias trouxe alterações emocionais visíveis para ele", declarou. "É muito difícil e constrangedor julgar um colega. Se houver outra comissão processante, vou torcer para não ser sorteado."
Para a petista Aldaíza, o fato de Viscome manter "relações políticas íntimas" com os vereadores do PPB influenciou a comissão. "Ele sensibilizou os parceiros usando a palavra e a emoção. Essa sensibilidade pode tê-lo ajudado."

Acusações
Mas, ao mesmo tempo que apelava para a amizade, Viscome acusava os colegas de Câmara para se mostrar como o "bode expiatório dessa história da máfia".
Segundo Viscome, todas as regionais têm problemas de corrupção, causados por funcionários que não podem ser controlados pelos administradores. "Corrupção tem em todas as administrações regionais. A da Penha está pagando o pato", afirmou o vereador.
Ele confirmou que indicava o administrador, mas disse que não tinha poder total. "Eu não nomeei o regional, eu indiquei. Eu não era dono da caneta para nomear. Quem nomeou foi o prefeito."
Viscome afirmou que só perdeu dinheiro na política, tendo construído todo seu patrimônio de R$ 16 milhões antes de entrar na vida pública. Aproveitou a situação para criticar a ganância dos parlamentares. "Por ganância de espaço, os políticos passam o pé nos colegas e vendem até a mãe. Como não tenho padrinho forte, estou há 52 dias preso, sem dever nada para ninguém."
Viscome criticou veladamente o vereador Toninho Paiva (PFL), que perdeu a Regional da Penha para ele. "Tem vereador que teve 60 mil votos na Penha e não se conforma de ter perdido a regional. Por isso, tentou me derrubar." Paiva não comentou as declarações.

Ajuda
Após o depoimento, em entrevista, Viscome pediu ajuda ao prefeito Celso Pitta e ao ex-prefeito Paulo Maluf, que, segundo ele, podem ajudar a provar sua inocência.
Os dois foram apontados como testemunhas de defesa pelo advogado de Viscome, Ademar Gomes, e devem prestar depoimento até a semana que vem à comissão.
Segundo ele, Pitta o conhece há seis anos e sabe que ele sempre foi "um vereador muito honesto".
Em seguida, chorando muito, Vicente Viscome afirmou ter sido sempre fiel ao ex-prefeito, apoiando seus projetos na Câmara. Para ele, Maluf deve por a mão na consciência e ajudá-lo. "Preciso do senhor, Paulo Maluf!", bradou o vereador, pouco antes de ir embora amparado pelos advogados e por cinco cabos eleitorais que assistiram ao depoimento usando broches com a inscrição: "Estamos com Vicente Viscome".


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