São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2008

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Caça a ilegais esvazia "Portelinha" nos EUA

Blitz de agência de imigração prende 29 imigrantes brasileiros e motiva fuga de dezenas de outros em condomínio de casas

Detidos aguardarão na cadeia pela deportação; capixaba chegou a se esconder dos agentes dentro de câmara frigorífica

DANIEL BERGAMASCO
ENVIADO ESPECIAL A NEWPORT (RHODE ISLAND)

Uma operação da ICE, a agência de imigração e fiscalização aduaneira dos EUA, prendeu 29 imigrantes ilegais brasileiros e motivou a fuga de dezenas de outros na cidade de Newport, em Rhode Island, no Nordeste do país.
O principal alvo da ação foi um condomínio de casas que, por ser habitado majoritariamente por brasileiros, é apelidado por seus moradores de "Portelinha", em referência à favela fictícia da novela "Duas Caras", exibida nos EUA pela Globo Internacional.
"A imigração varreu a Portelinha, está tudo vazio. Quem não foi pego, está escondido na casa de amigos, esperando o clima esfriar para pegar suas coisas e se mudar dali", conta a carioca Adélia, 54, que diz viver legalmente na cidade, onde é faxineira (cobra de US$ 50 a US$ 200 por casa).
Cada casa do condomínio é dividida em quatro apartamentos. O aluguel de cada um pode chegar a US$ 1.000 mensais.
A ICE afirma que o intensivo de caça aos ilegais continuará na região. De acordo com a agência, foram presos na quinta-feira passada 42 imigrantes (além dos 29 brasileiros, havia também mexicanos e guatemaltecos), entre eles 12 que já haviam sido deportados anteriormente. Todos aguardarão a deportação na cadeia.

Escondida no frigorífico
A capixaba Rosana (todos os nomes dos imigrantes são fictícios), 30, foi alertada sobre os agentes de imigração pelos gritos de uma colega russa no restaurante onde ambas são cozinheiras. Ela afirmou que se escondeu na câmara frigorífica da cozinha para escapar.
"Fechei a porta com tanta força que ela travou por fora. Fiquei lá por uns 30 minutos, quase congelando, até que a minha amiga russa me buscou e me avisou que haviam ido embora. Ela vai ter de ir à Corte e já avisaram para nem tentar fugir que a caçarão onde ela for. Com certeza será deportada", diz ela, com lágrimas nos olhos.
O capixaba Vítor, 31, que vive com a namorada, a mato-grossense Fernanda, 39, e a filha dela, de 13 anos, teve sorte: foi interrogado, mas os agentes desistiram de levá-los. A namorada atribui o desfecho aos gritos dados pela filha.
"Eu estava de baby-doll e me escondi atrás da porta, então [o agente] gritava comigo: "Você tentou fugir!". O homem parecia um cão raivoso. Eu sou evangélica e comecei a evocar Deus. Foi quando minha filha começou a chorar, gritando "I love America". Ele respondeu [em inglês]: "Eu também amo a América" e pediu a meu marido para irmos embora do país em dois meses, senão eles voltam."
Fernanda gosta da vida nos EUA. "Aqui é Primeiro Mundo, vivo bem, trabalhando com limpeza. Se quero comer um frango, vou lá e compro o frango. O duro é agora viver como fugitivo, sem ter carro no nome, assinatura da Globo e da Record, sem poder deixar o nome em nada", diz ela. "Eu sinto muita falta da família. Faz seis anos que não vejo meus pais. Meu sonho é conseguir me legalizar, para visitar todo mundo quando eu quiser", diz Vítor.

Casamento marcado
Moradora nos EUA desde os nove anos, Joana, 19, passa por outro pesadelo. Ela está legalmente no país, mas seu noivo, com quem se casaria no próximo sábado, não tem visto e foi preso na operação. "Estou desmarcando tudo da festa, igreja, bufê, e pagando multas altas. Há coisas, como meu vestido e o DJ, que já estavam pagas. O prejuízo total será de uns US$ 25 mil", afirma.
Final da história de amor de Joana: ela decidiu se mudar pra Vitória para viver com o futuro marido. Deixará nos EUA seus pais, que também vivem no país legalmente.
Os dois candidatos à Presidência dos EUA -o democrata Barack Obama e o republicano John McCain- têm projetos de regularização dos imigrantes ilegais, mediante exigências como aprendizado do inglês e pagamento de multas, além de maior rigor nas fronteiras.


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