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União cobra R$ 54 milhões de ex-bolsistas
Doutorandos receberam ajuda para estudar no exterior e não teriam cumprido as exigências ou abandonado estudos
Supostas irregularidades vão
de falsificação de diplomas a
descumprimento de acordo
para permanecer no Brasil
com o fim da pós-graduação
ANGELA PINHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Desde 2002, o governo federal pediu a devolução de cerca
de R$ 54 milhões que ex-bolsistas de doutorado favorecidos
por ajuda oficial teriam recebido de forma irregular.
O levantamento da CGU
(Controladoria Geral da União)
envolve a Capes (Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior) e o CNPq
(Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) -principais fomentadores do benefício.
Os motivos dos processos variam de irregularidades como o
abandono dos estudos até a falsificação de documentos. A
maioria dos casos, porém, é de
ex-bolsistas que fizeram doutorado no exterior e não cumpriram a norma de ficar no Brasil
por igual período.
Os "doutores que se formam
no exterior" foram alvo de crítica do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Ele disse haver
"contra-senso" entre os que
criticam o Bolsa Família e não a
"bolsa de US$ 2.000 para um
doutor se formar no exterior".
O número de cobranças é pequeno em relação ao de bolsas
concedidas. Só o CNPq ofereceu 249.632 entre 2002 e 2006,
em um total de R$ 2,6 bilhões.
Mas o valor pode ser alto para
uma só pessoa, e quem não paga ainda tem o nome enviado
ao Cadin -banco de dados de
devedores do governo.
É o caso de Cristina Campolina, coordenadora do curso de
história da Universidade Federal de Minas Gerais. O TCU a
condenou a devolver R$ 655
mil de sua bolsa de doutorado
para a Universidade de Illinois
(EUA) entre agosto de 1986 e
fevereiro de 1991.
Em sua defesa, ela disse que
vive em "extrema penúria financeira", mas não adiantou. O
tribunal determinou que ela
quite a dívida e lhe aplicou uma
multa de R$ 22 mil. Campolina
afirma que não terminou a tese
porque seu orientador dizia
que só aceitaria o trabalho se
ele tivesse documentos inéditos, os quais ela nunca achou.
Diante da impossibilidade de
quitar a sua dívida, ela diz que
tentará revalidar os créditos do
doutorado no Brasil e defender
a tese na UFMG. Porém, como
não cumpriu o prazo para a devolução do dinheiro -acrescido de juros pela demora no pagamento-, deve ser acionada
pela Advocacia Geral da União.
É o mesmo caso do físico Ricardo de Paula e Silva Masetti
Lobo. Em 2004, ele foi condenado pelo TCU a devolver R$
184 mil. Lobo fez doutorado na
França entre 1992 e 1996. Após
apresentar sua tese, passou um
período nos Estados Unidos e
foi para Paris, onde vive hoje.
Embora afirme que há "excelentes" órgãos de pesquisa no
Brasil, ele diz que desistiu de
voltar porque, na época, não
havia laboratórios em sua área
de pesquisa no país -uma propriedade específica de "luz síncrotron", no campo da física de
partículas. O TCU, porém, rejeitou seu argumento.
"Se a obrigação [voltar ao
Brasil] não foi cumprida (...)
significa que recursos pertencentes à sociedade brasileira,
sabidamente escassos, foram
empregados em proveito pessoal do bolsista e, até mesmo,
em proveito do país que passou
a abrigá-lo", disse na decisão o
relator, Augusto Cavalcanti.
Lobo lamenta que a questão
tenha chegado ao tribunal. "A
discussão deixou de ser científica e virou administrativa." A
Capes e o CNPq, porém, argumentam que a caso só vai ao
TCU depois do fracasso de uma
"negociação amigável".
O presidente da Capes, Jorge
Guimarães, cita como medidas
para tentar impedir que pesquisadores não voltem ao Brasil acordos com embaixadas para não renovar o visto de bolsistas e até uma análise mais criteriosa antes de conceder bolsas
em áreas que o risco do não-retorno é maior, como economia.
O ministro da Educação, Fernando Haddad, fala também no
programa de pós-doutorado
criado pela pasta e na contratação de 10 mil professores para
universidades federais desde
2003 como incentivos à permanência dos doutores no Brasil.
Para quem já tem as dívidas,
contudo, o entendimento agora
é com o tribunal.
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