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São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 2003

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URBANIDADE

Ilustração Vincenzo Scarpellini
LARGO DO CAFÉ Quando seu pai foi morto num assalto, Eduardo Evans foi baleado. Seguiram anos de crise. Sua banda chama-se Contato Imediato, toca nas ruas do centro e guarda metade das entradas para gravar o primeiro disco. A camiseta do baixista mostra estampada uma foto da Legião Urbana. Nos intervalos, Eduardo se afasta, acende um cigarro, distraído, olha o movimento. (VINCENZO SCARPELLINI)


Armadilhas da sedução

GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

Desde o final da década de 90, o bairro do Bexiga virou palco dos musicais no Brasil. Com eles, vieram, de várias partes do país, anônimos dançarinos, seduzidos pelos holofotes. A maioria fracassa silenciosamente sem deixar rastros. Outros sobrevivem -um deles é Helzer de Abreu, 36 anos, cuja vida serviria para um desses roteiros, tão comuns em musicais da Broadway, sobre a solitária luta de seres anônimos, solitários e ousados em busca do reconhecimento.
Aos 20 anos, com o projeto de participar de musicais, Helzer largou o trabalho de modelo na cidade de Belo Horizonte, deixou o glamour dos desfiles e se dispôs a ser faxineiro em restaurantes de Nova York.
Passou quatro anos pelos restaurantes, em meio a aulas de dança e frustrantes testes, que envolviam centenas de candidatos de várias partes dos Estados Unidos e do mundo. Foi chamado, enfim, para integrar o elenco de "O Violinista no Telhado". Daí vieram mais propostas para atuar em musicais como "Evita" e "Chorus Line". Em 1993, decidiu voltar: "A solidão tornou-se insuportável", diz.
Já não se via mais em Belo Horizonte, cidade pequena demais para quem viveu em Manhattan, e decidiu aventurar-se em São Paulo, que não conhecia. Entre bicos (dava aulas de inglês) e encenações, aguardou mais quatro anos até voltar a um musical: resolveram fazer em São Paulo uma temporada de "Rent". "Era minha chance."
Graças a investimentos internacionais, a cidade se tornaria um bem-sucedido pólo de produção de musicais da Broadway no Brasil. Vieram sucessos como "Os Miseráveis", "A Bela e a Fera" e, agora, aguarda-se "Chicago", que já atrai para seus testes romarias de dançarinos.
O modelo de província que, sozinho e sem dinheiro, virou faxineiro para se tornar dançarino em Nova York e, de novo sozinho e sem dinheiro, desembarcou em São Paulo, está fazendo mais uma aposta -e, mais uma vez, sem dinheiro e sozinho. Escreveu seu próprio musical e quer dirigi-lo. Chama-se "Ventura" e trata das armadilhas da sedução. Ainda não sabe como vai conseguir patrocínio. Normal: não sabia também como sobreviveria da dança em Nova York ou São Paulo.
Talvez no prazer desse permanente suspense é que estejam mesmo as armadilhas (e a graça) da sedução.

E-mail - gdimen@uol.com.br


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