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PMs falavam que aquilo era normal, diz mãe
Elenice Rodrigues diz que ouviu os gemidos do filho ao ser interrogado pelos policiais; "eles perguntavam "cadê a arma, vagabundo?"
Ela lembra que o filho tinha deixado a escola na 4ª série, mas que tinha planos de voltar no ano que vem; "o que fizeram foi bárbaro", diz
TALITA BEDINELLI
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BAURU
A mãe do adolescente morto
no sábado, Elenice Silveira Rodrigues, 49, diz que ouviu o filho gemer, dentro do quarto,
enquanto era interrogado pelos
policiais militares que entraram em sua casa. "Eles falavam
que [o que estava acontecendo
no quarto] era um procedimento normal da lei. Mas ouvia meu
filho gemendo."
Ela afirma ter certeza de que
o filho foi torturado. "O que
eles fizeram foi muita brutalidade, foi bárbaro. Tenho certeza de que torturaram. Eu vi no
velório, os dedos quebrados."
Com a voz pausada, ela descreve como foi a noite em que
seis policiais entraram em sua
casa e carregaram pela porta
Carlos Rodrigues Júnior, o caçula de 15 anos, já desfalecido.
"A gente estava dormindo. Por
volta de umas 3h eles bateram
na porta com muita violência e
gritaria. Um ficou na sala com a
gente e outros cinco foram para
o quarto e fecharam a porta."
Ela diz não ser verdade a versão
do advogado do tenente José
Roberto Spoldari, de que apenas dois soldados permaneceram no quarto o tempo inteiro.
"Eles [os policiais] perguntavam: "cadê a arma, vagabundo,
cadê o capacete?". Ouvi muitos
barulhos de batidas e ele dizia:
"não sei, senhor"."
Na casa, vive ainda a filha Débora Rodrigues, 26, que olhou
no relógio do celular no momento em que os policiais levaram o irmão para o hospital, às
4h11. Elas afirmam, ao contrário do que o advogado de defesa
do tenente diz, que os policiais
permaneceram por volta de
uma hora no local.
Carlos, que deixou a escola
na 4ª série, voltaria a estudar
no ano que vem, diz a mãe. "Ele
tinha dificuldade de aprender,
ficou três anos na quarta série.
E como ele era muito alto e magro acho que ficou com vergonha e não quis continuar."
Ela conta que, no início deste
ano, se matriculou na escola
com ele para estimulá-lo a continuar os estudos. Toda noite,
os dois iam à escola juntos e depois faziam o dever de casa.
"Ele estava indo bem", diz.
Mas, como a mãe tinha que faltar para ajudar a filha, que trabalha com costura, ele desistiu.
"Se eu faltava, ele faltava
também. Aí não consegui ir
mais por conta do trabalho e
parei", diz a mãe, apontando a
máquina de costura no canto
da sala. "Tinha convencido ele,
a gente ia voltar no ano que vem
e depois fazer o supletivo."
Ela diz que o filho nunca teve
passagem pela polícia e que não
tinha envolvimento com droga.
Elenice ressalta que, junto com
a filha mais velha, tinha feito
uma faxina na casa na sexta-feira e olhado bem as coisas dele.
"Não vimos nada. Se tinha droga aqui, não sabemos onde."
Elenice confirma que o filho
levou para casa uma moto na
noite de sexta-feira. "Por volta
das 23h escutei um barulho de
moto. Ele disse que a moto era
de um colega dele e que eles
iam sair para dar uma volta na
avenida e depois ele pegava."
Ela diz que nunca teve medo
de policial. "Achava que eles
eram cumpridores do dever deles. Nunca vi policiais com
maus olhos. Agora peguei medo", diz, olhando para as mãos.
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