São Paulo, quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

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Psiquiatra diz que devolverá dinheiro à família Gracie

Sabino de Farias Neto ligou para advogado do clã para que intermediasse a devolução

"Eu o mediquei, ele deitou a cabeça na minha perna e relaxou. Era o que eu podia fazer pelo Ryan naquele momento", afirma médico

LAURA CAPRIGLIONE
ENVIADA ESPECIAL A ATIBAIA (SP)

O médico Sabino Ferreira de Farias Neto, 56, telefonou ontem -por volta das 17h- para o advogado do clã Gracie, Rodrigo Souto, para pedir que ele intermediasse a devolução dos R$ 5.000, pagos a ele pela família como honorários médicos por serviços prestados no último sábado. Na véspera, à noite, sob efeito de drogas, o lutador de jiu-jítsu, cinco vezes campeão do mundo, Ryan Gracie, havia roubado um carro e tentado roubar outro, além de uma moto. No dia seguinte, foi encontrado morto, logo pela manhã, na cela do 91º Distrito Policial, na Vila Leopoldina (zona oeste de São Paulo), onde tinha sido recolhido
"Eu não quero esse dinheiro, eu não quero mesmo", disse Faria Neto ao telefone para o advogado, enquanto chorava, diante dos repórteres da Folha e do portal de notícias G1, que o entrevistavam.
O médico teve a idéia do telefonema ao advogado quando lhe foi questionado: "Por que o senhor não pediu a transferência de Ryan Gracie a um hospital especializado e, em vez disso, medicou-o na própria cela?"
Na conversa com o advogado, presenciada pelos jornalistas, o médico ouviu a seguinte resposta: "Se tudo tivesse dado certo, você seria herói".
Faria Neto, apesar dos 31 anos da Clínica Maxwell, especializada na reabilitação de dependentes de drogas, disse que nunca antes do caso Gracie havia se defrontado com igual situação de "pressão extrema": "Era a polícia de um lado, a imprensa do outro, a família e o próprio Ryan, que estava fora de controle".
"Você entraria em uma cela com um lutador de jiu-jítsu do tamanho do Ryan, completamente transtornado?", perguntou Farias Neto aos repórteres.
"Eu, em vez de fugir, enfrentei a morte para socorrê-lo", diz o médico. "Eu o mediquei, ele deitou a cabeça na minha perna e relaxou. Era o que eu podia fazer pelo Ryan naquele momento."
O médico diz ter proposto à família Gracie a transferência imediata do lutador para a Clínica Maxwell, de sua propriedade e localizada em Atibaia, município a 60 km de São Paulo, tão logo foi informado da prisão. "Mas disseram-me que o advogado desaconselhara a medida porque a prisão de Ryan fora feita em flagrante. O advogado me disse que era melhor esperar até o dia seguinte."
Diante dessa situação, "fiz o melhor que pude", diz o médico. O psiquiatra não comenta casos de outros pacientes célebres que atendeu, como o ex-polegar Rafael Ilha, que hoje o acusa de exploração, nem o de Maurício Mattar, que, segundo a irmã e o pai do lutador morto, ficou "supermedicado" e "debilóide", sob efeito de drogas receitadas pelo médico.

"Meu Capoten"
Fez questão, contudo, de comentar o caso rumoroso que levou ao fechamento da Clínica Maxwell, em 1995, quando cinco internos mataram a golpes de pau de vassoura um taxista que ameaçava denunciar a fuga de dois pacientes que tinham saído para comprar vodca.
Farias Neto diz que, em 35 anos de carreira, "perdeu" apenas dois pacientes -"Ryan é um deles". Nesse mesmo período, o maior psiquiatra de São Paulo (cujo nome ele não revela) perdeu dez. "A nossa profissão é de alto risco", diz enquanto mostra a caixa cheia dos remédios que vem tomando. "Já é hora, aliás de tomar o meu Capoten". Capoten é anti-hipertensivo. Foi uma das seis drogas prescritas por ele a Ryan.


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