São Paulo, sábado, 19 de dezembro de 2009

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ANÁLISE

O que vou ser quando acabar de crescer

ANNA VERONICA MAUTNER
ESPECIAL PARA A FOLHA

Já não é mais criança. Ainda não é adulto. Está em transformação. Esse é o jovem "homo sapiens", que já descobriu o mundo, mas ainda não sabe qual vai ser o seu lugar.
O corpo começa a se transformar inesperadamente. A mente começa a dar atenção a muita coisa que antes não parecia importante. Os colegas estão mudando também. O jovem procura, em comparação ininterrupta, onde e como ele está agora. Está mais? Menos?
Todos, sempre, queremos um bom lugar no mundo. Se há algo terrível de se sentir, é uma ameaça de exclusão. Temos que ser bonitos, espertos, ágeis, bem falantes, em resumo -atraentes. Faz parte do instinto de sobrevivência.
Uma manchinha, um dedo torto, um retardo no surgimento de traços de puberdade podem se tornar imensas ameaças. Não queremos ser gordos nem magros demais, nem muito baixinhos, mas também não muito altos. Procuramos o nosso lugar na tribo a qual pertencemos. Isso é essencial para o bem-estar e a autoestima. Queremos ter roupa igual à qual queremos acrescentar alguma pequena originalidade, mas que de forma alguma atraia desdém. Ridículos, nunca.
Imitar o comportamento adulto faz parte do desenvolvimento. Assim queremos ser capazes de beber sem ficar bêbados e sem dar mostras de ter medo de se embebedar. Queremos aparentar naturalidade nas ousadias. Há pouco tempo, o fumar também fazia parte dessa encenação de vida adulta.
As pesquisas indicam que a autoimagem é questão importante. Não é pequena a porcentagem dos adolescentes que se sentem inadequados para atender suas próprias exigências. A bebida tem dupla entrada, serve para imitar o adulto e também para diminuir a ansiedade provocada por esta eterna comparação que vivencia. Não espanta o fato que ter consciência de si mesmo gere umas tantas dificuldades. O fato de nós nos percebemos não só alimenta a consciência como também gera o desejo de controlar as inevitáveis mudanças. Do jovem sairá o adulto e, com maior ou menor clareza, sabemos como queremos "ser" quando crescermos.
O cuidado com a autoimagem vincula-se ao medo de falhar na realização dos nossos próprios sonhos de como queremos ser no final desse processo. Afinal, acertar é me tornar parecido com o que "queria ser" quando crescer.


ANNA VERONICA MAUTNER é colunista da Folha e psicanalista da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo


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