São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 2005

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A ZERO GRAU

Navegador e equipe passaram 37 dias em viagem a ilha e colheram imagens de animais que vão compor livro

Amyr Klink registra vida no sul do Atlântico

MARI TORTATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SÃO FRANCISCO DO SUL (SC)

Foram quase 37 dias de atenção constante aos ventos de até 160 km por hora e aos icebergs encontrados no caminho de volta. Um deles superava 100 metros de altura. O navegador brasileiro Amyr Klink, 49, voltou da ilha de Geórgia do Sul, uma possessão britânica próxima às ilhas Malvinas, confiante de que o Paratii 2 trouxe de lá um dos mais completos documentos de imagem daquela região subantártica.
Ele atracou seu barco no cais do Museu Nacional do Mar, que pertence ao Ministério da Cultura, em São Francisco do Sul -200 km ao norte de Florianópolis-, no final da manhã da última sexta-feira, dizendo que freqüentava a região havia dez anos, mas que "nunca tinha voltado com um material tão rico antes".
Um dos seis integrantes do barco, o fotógrafo de natureza Haroldo Palo Jr. planeja lançar um livro científico e um vídeo de uma hora com o material trazido da região. Mas o projeto ainda não está acabado. O navegador Klink disse que será apenas coadjuvante na obra de Palo Jr., assinando os mapas ilustrativos do livro.
O Paratii 2, barco de Klink, partiu de São Francisco do Sul com o navegador e mais cinco tripulantes no dia 12 de janeiro para uma expedição destinada à produção das imagens de Palo Jr. na Geórgia do Sul e a testar compressores de refrigeração e equipamentos de telecomunicações de ponta fabricados pelo grupo Embraco.
Voltou ao porto de partida 20 dias antes do previsto. Foi tempo suficiente para o fotógrafo reunir 4.000 imagens de fotos, 12 horas de vídeo e 15 horas de áudio de 35 espécies da fauna da região e retratar o ambiente visitado. "Ainda deu para a gente ficar dez dias vagabundeando", brinca Klink.
Mas não foi um passeio. Deslocada da parte continental da Antártida, a ilha da Geórgia do Sul pertence a uma região de ventos violentos e de riscos à navegação mais elevados do que a própria Antártida, conta Klink.
"A ilha é exuberante, mas tem mais gelo e mais fauna do que todas as outras áreas subantárticas, e os icebergs ficam saracoteando em volta dela." Na expedição, o Paratii 2 percorreu cerca de 2.200 milhas marítimas, quase 4.000 km, calcula o navegador.
Palo Jr. foi à região capturar imagens como as do albatroz errante, que pode medir até 3,20 metros da ponta de uma asa à outra. Ave que viaja para se alimentar no sul do Brasil, o albatroz é abundante nas ilhas geladas que precedem o Pólo Sul. O vento é tão intenso por lá que a menor ave catalogada, o pipit, de 15 cm de altura, não voa. "Se tentasse, seria arrastada", conta ele, que já tem 28 livros sobre lugares do mundo.
Seu trabalho mais notório foi chefiar uma equipe do oceanógrafo francês Jacques Cousteau (1910-1987) em uma expedição à Amazônia em 1982.
A temperatura ambiente é de zero grau centígrado, na média, mas o vento provoca uma sensação térmica de 20 a 30 graus negativos. Em dias sem vento, no entanto, os tripulantes dos barcos aproveitam para banhos de sol nus, conta Klink. Sem mergulhos, pois há risco de hipotermia (temperatura corporal baixa) em águas de dois graus negativos.
Klink conta que os banhos ao sol na região exigem muito mais cuidado hoje do que há 15 anos, quando começou a velejar para o continente antártico. Um exposição ao sol de uma hora sem protetor solar pode exigir atendimento médico por insolação. Ele diz não ter base científica para afirmar, mas não tem dúvida de que é indício de aumento do buraco na camada de ozônio.

Sozinho
Ao desembarcar do Paratii 2 na sexta-feira, o navegador Amyr Klink disse que se rende à comunicação via satélite, mas não à parafernália da informática, nas viagens e que, apesar de conflitos relatados por tripulantes na última viagem à região polar, ele não pretende voltar às aventuras solitárias. "Sozinho, não. Uma vez basta", foi a resposta dele à pergunta sobre se voltaria a passar o inverno só em um barco na Antártida.
Em 1989, Klink percorreu 27 mil milhas da Antártida ao Ártico, em 642 dias, a bordo da primeira versão do veleiro polar Paratii. A provável maior aventura de sua carreira ele narrou em dois livros.
Tinha que dedicar tempo integral à navegação e isso o impediu de registrar em imagens o que via. Klink nega que na viagem anterior, de volta ao mundo pelo continente antártico, tenha ocorrido tensão a bordo, como relataram dois tripulantes. "Aquilo [relatos de conflito] foi um invenção."

Comunicação
Uma das queixas de dois daqueles tripulantes foi que não podiam se comunicar com a família. No Paratii 2 há mostras de que o problema foi resolvido: havia cinco laptops espalhados sobre a mesa da sala de trabalho do veleiro depois do desembarque.
Da nova viagem, diz acentuar "o suporte intelectual" da equipe. "Nunca tinha viajado antes com alguém que conhece tão profundamente as espécies." A referência é dirigida a Haroldo Palo Jr., principalmente.
A expedição à Geórgia do Sul foi mais para atender ao projeto do fotógrafo do que a mais um teste de superação do velejador. Toda a equipe era experiente, exceto no caso de Igor Alexandre Souza, 23, um "nerd" da informática, na definição do comandante, mas que de resto só recebe elogios.
"Fiquei surpreso. Ele vai ser um baita navegador, se quiser", aposta Almyr Klink.
Os outros componentes da tripulação foram o também fotógrafo Julio Fiadi, velejador de seis passagens à vela pelo cabo Horn e sete viagens à Antártida, Fábio Tossi, médico e amigo de Klink há dez anos, que viaja com ele ao continente antártico desde 1997, e Flávio Fontes Pereira, 38, engenheiro mecânico que é responsável pela embarcação quando ela fica aportada.
Mais informações da viagem podem ser conferidas no site www.amyrklink.com.br.

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