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DIREITOS HUMANOS
Pesquisador norte-americano diz que prática de tortura continua sendo o principal problema do país
"Brasil precisa admitir que há racismo"
GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL
O diretor do Centro de Direitos
Humanos da Universidade de
Columbia, em Nova York, Paul
Martin, afirma que o Brasil precisa admitir o racismo como primeiro passo para reduzir a desigualdade entre negros e brancos.
"Os afro-brasileiros precisam
ter mais voz", diz Martin. O centro que ele dirige, considerado um
dos mais importantes do mundo,
faz parte do consórcio universitário que organizou o 1º Colóquio
Anual de Direitos Humanos, que
está sendo realizado em São Paulo
desde a semana passada.
Coordenador de pesquisadores
que trabalham no Brasil, na Venezuela e no Equador, o diretor do
centro diz que o país pode se tornar uma referência mundial na
área de direitos humanos: "O Brasil pode ser um porta-voz dos países em desenvolvimento".
Para ele, o maior problema do
país nessa área ainda é a prática
da tortura. Ele diz, no entanto,
que é preciso começar a dar atenção a outras demandas, como as
dos negros.
A seguir, os principais trechos
de entrevista concedida na última
quinta-feira, em São Paulo.
Folha - Qual é o maior problema
do Brasil em relação aos direitos
humanos?
Martin - A tortura. Outro problema grande é a pobreza, e depois o racismo. Muitos afro-brasileiros que estão aqui (participando do 1º Colóquio Anual de Direitos Humanos) dizem não conseguir ocupar os postos mais altos
nos seus locais de trabalho.
A maioria dos palestrantes do
evento é branca. Admitir que há
racismo e dar voz aos afro-brasileiros deveria ser o primeiro passo
para superar o problema.
Folha - O senhor diz que o Brasil
tem condições de assumir a liderança na Comissão de Direitos Humanos da ONU, especialmente
agora que os Estados Unidos perderam assento nessa comissão.
Martin - O Brasil tem todas as
possibilidades para liderar um
processo de conquistas nessa
área, como o representante dos
países da América do Sul.
O Brasil tem legitimidade para
representar nações em desenvolvimento. Quando os Estados Unidos falam sobre direitos humanos, soa como a voz dos países industrializados.
Folha - O problema é que isso não
é prioridade do governo.
Martin - O processo de tornar o
Brasil referência na área de direitos humanos tem de partir da sociedade civil. É ela que vai pressionar o governo nessa direção.
Há pressões internas e externas.
As pressões internas podem ser
fortes. Isso foi determinante, por
exemplo, para a consolidação da
democracia brasileira.
É a sociedade que deve discutir
suas prioridades, apontar caminhos e pressionar o governo para
consolidar essas decisões.
Folha - Como isso pode ser feito?
Martin - É preciso divulgar em
larga escala a importância do respeito aos direitos humanos. O assunto tem que estar na mídia, nas
escolas, nas publicações que as
empresas fazem aos seus funcionários e aos seus clientes.
É preciso mudar a cultura da
violência. E esse é um desafio de
muitos países, mas não há uma
fórmula única. É preciso desenvolver um conceito local para basear a política de direitos.
Folha - Em razão da escalada da
violência, uma parcela da sociedade diz que o importante é defender
os direitos humanos das vítimas, e
não dos bandidos.
Martin - As cidades estão divididas em áreas civilizadas e não civilizadas. Quanto mais a sociedade investir nessas áreas, menos
vai precisar se preocupar em contratar segurança pessoal.
Estamos construindo uma sociedade em que uma parte significativa da população não tem trabalho, casa e saúde. O resultado é
que essa gente não tem nenhum
compromisso social. Não tem nada a perder. Mudar isso é papel da
classe média, se não por questão
de consciência, mas pelo menos
para manter sua segurança.
Folha - A sociedade não deveria
cobrar mais participação da iniciativa privada?
Martin - Algumas empresas brasileiras fazem um trabalho fantástico. Agora, a responsabilidade
social das empresas é um assunto
complexo. Você tem empresas
que causam impacto social negativo muito grande, decorrente do
processo de produção. A sociedade pode boicotar produtos feitos
sob condições que desrespeitam
os trabalhadores e o ambiente.
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