São Paulo, sábado, 20 de junho de 2009

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Francesa ensina moda na periferia de SP

GUSTAVO FIORATTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Muita gente no Campo Limpo se parece com a estilista francesa Sakina M'Sa, negra, 1m50, 37 anos. A diferença é que ela chegou ao bairro da periferia de São Paulo em uma Mercedes Benz preta -disponibilizada pela SPFW- para realizar, na tarde de ontem, um trabalho com um grupo de costureiras da ONG Estrela Nova.
Sakina nasceu em Comores, grupo de ilhas localizado entre a costa leste da África e Madagascar. Foi viver na França aos sete anos. Tornou-se figura tradicional na semana de moda de Paris por sua produção autoral, muitas vezes vinculada a projetos sociais. Realizou projetos em Moçambique e no Congo.
Assim que Sakina surgiu na sede da ONG, as 12 mulheres posicionaram-se ao redor de uma grande mesa, em um salão com máquinas de costura, tesouras e outras ferramentas. A primeira dica da estilista às costureiras do Campo Limpo foi para que pensassem em imagens relacionadas ao bairro. "Ih, só vai vir coisa ruim", brincou Reinilde Alvez, 42, provocando uma gargalhada geral. Alguém sugeriu falar dos animais abandonados nas ruas da região. A ideia pareceu triste demais ao resto do grupo.
Sakina precisou intervir. "Eu reparei que as casas, por aqui, são muito uniformes, que os tijolos são expostos, que é possível ver o reboco. Isso é bonito...", disse, referindo-se às construções desordenadas das favelas da região. Sueli Ferreira, 34, cortou: "Você está falando da falta de dinheiro para o acabamento?". Mais risadas.
Essa é a terceira visita que Sakina faz ao grupo, que, desde setembro de 2008, trabalha em um projeto de confecção idealizado por ela. Parte do resultado das oficinas no Campo Limpo está exposto no primeiro andar do prédio da Bienal. São batas de cortes não usuais. Ela corta a metade de uma e costura com a de outra. Algumas têm golas pregadas a mangas; outras têm mangas costuradas na cintura. "Não é para vestir, é só para a exposição", explica a estilista.
A desconstrução, de início, encontrou resistência entre as costureiras. "Não chegamos a pensar que ela era louca. Mas, quando falou que cortaríamos as roupas que tínhamos passado meses costurando, bateu uma pena", diz Sueli.
Para Sakina, ter de criar algo -e não apenas aprender uma técnica- "é importante para a autoestima das pessoas envolvidas". A partir de agora, com as imagens -tristes ou não- do Campo Limpo, as costureiras devem confeccionar algo mais convencional. O destino das novas peças não está definido, mas a ideia é colocá-las à venda e não simplesmente expô-las.


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