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Francesa ensina moda na periferia de SP
GUSTAVO FIORATTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Muita gente no Campo Limpo se parece com a estilista
francesa Sakina M'Sa, negra,
1m50, 37 anos. A diferença é
que ela chegou ao bairro da periferia de São Paulo em uma
Mercedes Benz preta -disponibilizada pela SPFW- para
realizar, na tarde de ontem, um
trabalho com um grupo de costureiras da ONG Estrela Nova.
Sakina nasceu em Comores,
grupo de ilhas localizado entre
a costa leste da África e Madagascar. Foi viver na França aos
sete anos. Tornou-se figura tradicional na semana de moda de
Paris por sua produção autoral,
muitas vezes vinculada a projetos sociais. Realizou projetos
em Moçambique e no Congo.
Assim que Sakina surgiu na
sede da ONG, as 12 mulheres
posicionaram-se ao redor de
uma grande mesa, em um salão
com máquinas de costura, tesouras e outras ferramentas. A
primeira dica da estilista às
costureiras do Campo Limpo
foi para que pensassem em
imagens relacionadas ao bairro. "Ih, só vai vir coisa ruim",
brincou Reinilde Alvez, 42,
provocando uma gargalhada
geral. Alguém sugeriu falar dos
animais abandonados nas ruas
da região. A ideia pareceu triste
demais ao resto do grupo.
Sakina precisou intervir. "Eu
reparei que as casas, por aqui,
são muito uniformes, que os tijolos são expostos, que é possível ver o reboco. Isso é bonito...", disse, referindo-se às
construções desordenadas das
favelas da região. Sueli Ferreira, 34, cortou: "Você está falando da falta de dinheiro para o
acabamento?". Mais risadas.
Essa é a terceira visita que
Sakina faz ao grupo, que, desde
setembro de 2008, trabalha em
um projeto de confecção idealizado por ela. Parte do resultado
das oficinas no Campo Limpo
está exposto no primeiro andar
do prédio da Bienal. São batas
de cortes não usuais. Ela corta a
metade de uma e costura com a
de outra. Algumas têm golas
pregadas a mangas; outras têm
mangas costuradas na cintura.
"Não é para vestir, é só para a
exposição", explica a estilista.
A desconstrução, de início,
encontrou resistência entre as
costureiras. "Não chegamos a
pensar que ela era louca. Mas,
quando falou que cortaríamos
as roupas que tínhamos passado meses costurando, bateu
uma pena", diz Sueli.
Para Sakina, ter de criar algo
-e não apenas aprender uma
técnica- "é importante para a
autoestima das pessoas envolvidas". A partir de agora, com as
imagens -tristes ou não- do
Campo Limpo, as costureiras
devem confeccionar algo mais
convencional. O destino das
novas peças não está definido,
mas a ideia é colocá-las à venda
e não simplesmente expô-las.
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