São Paulo, terça-feira, 20 de outubro de 2009

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ANÁLISE

A impunidade, em alguns casos, não é eterna

LUIZ FLÁVIO GOMES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Depois de oito anos, a Justiça criminal finalmente prendeu o ex-promotor de Justiça Igor Ferreira da Silva, que foi o primeiro membro do Ministério Público condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, por homicídio qualificado.
Trata-se de crime hediondo, mas, considerando-se que o fato aconteceu antes da reforma da Lei dos Crimes Hediondos (lei nº 8.072/90 alterada pela de nº 11.464/07), para o efeito de progressão de regime vale a lei antiga, ou seja, com o cumprimento de 1/6 da pena, ele já terá direito a esse benefício, podendo evoluir do regime fechado para o semi-aberto.
Se o crime tivesse ocorrido depois de 2007, ele teria que cumprir 3/5 da pena. Mas esse endurecimento da lei penal brasileira não vale para os crimes anteriores a 2007. Trata-se de condenação definitiva, não sendo possível a interposição de nenhum recurso.
A execução da pena será imediata, em presídio de segurança máxima, visto que a pena imposta de 16 anos e quatro meses supera, em muito, o patamar de oito anos fixado pelo Código Penal para o regime fechado.
Considerando-se que Igor Ferreira da Silva perdeu o cargo, não há que se falar em presídio especial. A lei brasileira prevê esse benefício para servidores da área criminal, podendo ser o mesmo estendido aos promotores de Justiça, quando no exercício da função (mas não quando há perda do cargo).
Desde o dia em que a condenação transitou em julgado estava correndo o prazo para a prescrição do crime. Mas o Estado agiu em tempo e prendeu o condenado antes da consumação da prescrição.

Foro privilegiado
O "caso Igor" nos leva a refletir sobre a questão do foro privilegiado, que deveria ser extinto. Não concordamos com esse privilégio, para nenhum cargo da nação.
De qualquer modo, convém recordar que, neste caso, houve sério prejuízo para o réu, porque os processos que tramitam no foro especial não permitem, conforme jurisprudência do STF, o chamado duplo grau de jurisdição, ou seja, o direito de interpor apelação. Se ele tivesse sido julgado pelo Tribunal do Júri em primeira instância, esse direito teria sido exercido, o que retarda o início e a efetiva execução da pena.
O recolhimento do ex-promotor de Justiça à prisão pode gerar a sensação popular de efetividade da Justiça criminal brasileira. Isso pode favorecer a prevenção de outros delitos. A lição clara que fica é a seguinte: a impunidade, em alguns casos, não é eterna.


LUIZ FLÁVIO GOMES é diretor-presidente da Rede LFG, doutor em direito penal pela Universidade Complutense de Madri e mestre em direito penal pela USP

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