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RESERVA DE MERCADO
Projeto do curso dispensa sem-terra de prestar vestibular e prevê provas orais no lugar de escritas
USP estuda criar graduação para o MST
LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL
A mais importante universidade brasileira, a USP, está a um
passo de aprovar a criação do curso de graduação em pedagogia da
terra. Proposto pelo Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra à Faculdade de Educação, o
pedagogia da terra está projetado
para atender a 60 alunos que
preencham os seguintes pré-requisitos: ser proveniente de assentamentos e acampamentos de
sem-terra, ter diploma de conclusão do ensino médio e atestado
emitido pela direção estadual do
MST de São Paulo comprovando
experiência mínima de dois anos
com "educação ou formação popular no campo".
Como o pedagogia da terra é
um curso especial, será formada
uma única turma. Novas turmas
dependerão de nova aprovação
nas instâncias universitárias.
Nos 71 anos de existência da
USP, será a primeira vez que a instituição terá um curso monopolizado por membros de um movimento social específico.
Se aprovada a criação do novo
curso, os estudantes de pedagogia
da terra ingressarão no ensino superior sem passar pelo vestibular.
Em vez disso, o processo seletivo
prevê que os candidatos apresentem um memorial, descrevendo
"sua história de vida e sua prática
educativa como educador do
campo" e "as razões pelas quais
pretende realizar o curso."
Uma banca composta por professores da Faculdade de Educação da USP analisará o memorial
e a documentação dos inscritos e
selecionará os aprovados.
Ao fim de quatro anos, os estudantes receberão o valorizado diploma com o logotipo da USP. No
caso deles, um diploma de licenciatura plena com autorização para atuar nas áreas de magistério
do ensino médio, da educação infantil, do ensino fundamental, todos voltados à "educação no campo". Também poderão exercer
funções de "coordenação e supervisão de atividades pedagógicas
em escolas e instituições voltadas
para a educação no campo".
Prova oral
O projeto de curso já conseguiu
pareceres favoráveis quanto à
proposta pedagógica e à legalidade. Resta ser aprovado pelo Conselho de Graduação da USP e encaminhado ao reitor, que baixará
portaria formalizando a criação.
A influência do MST na concepção do curso levou a que a forma
de avaliação dos alunos tenha características inéditas em se tratando da USP. No documento com a
proposta oficial, lê-se:
"Durante o processo de discussão e elaboração do Projeto do
Curso Especial de Graduação "Pedagogia da Terra", ponderou-se
que para enfrentar e superar as dificuldades -já diagnosticadas
por diversas pesquisas e pelos
próprios movimentos sociais-
de expressão escrita, seria interessante (...) que um Trabalho de
Conclusão de Curso (TCC), com
"defesa oral", perante banca examinadora, fosse considerada exigência do curso".
Na prática, o texto admite que,
depois de quatro anos de ensino
superior, alunos do pedagogia da
terra cheguem ao trabalho de
conclusão de curso tendo de recorrer à "defesa oral", como forma de "enfrentar e superar" dificuldades com a expressão escrita.
A professora Sonia Teresinha de
Sousa Penin, pró-reitora de graduação e presidente do Conselho
de Graduação da USP, diz que esse ponto é um dos mais polêmicos
em todo o projeto. "Isso ainda pode mudar. É preciso que um curso
ministrado sob o nome da USP,
ainda que seja um curso especial
como esse, obedeça aos padrões
de qualidade da universidade."
Quarenta e oito professores da
Faculdade de Educação já se dispuseram a contribuir para a implementação do curso, inclusive
ministrando aulas em regime de
voluntariado. Entre os professores de outras unidades da USP
que colaboraram na elaboração
da proposta estão a filósofa Marilena Chauí e o jurista Dalmo de
Abreu Dallari, autor de parecer
sobre a legalidade da iniciativa.
A reportagem da Folha perguntou à professora Sonia Penin se
ela considera viável a hipótese de
a USP vir a promover um curso
para filiados à União Democrática Ruralista, a UDR, a exemplo do
que se propõe para o MST.
"Certamente, uma proposta
dessas seria analisada desde que,
como foi o caso aqui, um curso
para a UDR fosse defendido por
professores da USP." Para a professora, a universidade decidirá
segundo o mérito e a relevância
social da proposta. "É uma avaliação meticulosa, caso a caso. Não é
possível fazer generalizações."
O curso todo deverá custar R$
720 mil, ou R$ 180 mil por ano. Os
recursos provêm do Programa
Nacional de Educação na Reforma Agrária, o chamado Pronera,
criado em 1998 durante o governo
Fernando Henrique Cardoso.
Formalmente, o pedagogia da
terra resulta de convênio a ser firmado entre o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária) e a Fundação de Apoio à
Faculdade de Educação.
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