São Paulo, domingo, 21 de maio de 2006

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GUERRA URBANA / ACADEMIA

Estudantes da escola de oficiais acreditam que governo agiu de forma firme e descartam a possibilidade de acordo com a facção

Para alunos da Academia do Barro Branco, divulgação intensa de ataques suscitou vandalismo e não houve vingança na reação policial

Cadetes da PM minimizam ação do PCC

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

O terror que se instalou em São Paulo com a onda de ataques da facção criminosa PCC não poupou os cerca de 800 cadetes da Academia de Polícia Militar do Barro Branco. Na noite de segunda-feira, quando a cidade se impôs um toque de recolher, parte dos estudantes preferiu dormir nos alojamentos a enfrentar as ruas.
Alunos do terceiro e do quarto ano, com permissão de voltar para casa todas as noites, mas que fazem o caminho de moto -principal veículo utilizado por criminosos nos ataques-, não saíram às ruas com receio de serem confundidos como suspeitos pela própria polícia.
Os que deixaram a academia na noite de segunda-feira reforçaram os cuidados, mudaram de caminho e pediram cautela a familiares e amigos. Apesar de andarem fardados na academia, nas ruas, vestem-se como qualquer outro estudante: calça jeans, camiseta, malha, tênis e mochila.
"Minha família não é de militares, por isso fica um pouco mais preocupada. Avisei para eles terem mais cautela em relação a telefonemas, a posturas, a orientar as pessoas", disse o cadete Osmário Ferreira da Silva, 31, casado há sete anos e pai de dois filhos.
Gabriel Leivas Müller Hoff, 23, colega de turma de Silva, disse ter ficado mais atento no caminho para a casa. "A gente dobrou a atenção, aumentou a cautela em relação a horários e a locais que freqüentamos."
A prática de cautela, no entanto, não coincide com o discurso dos cadetes sobre as ações do PCC. Durante cerca de uma hora, a reportagem conversou com cinco alunos do 4º ano, que falaram sob o olhar atento do comandante.
Num discurso sintonizado, minimizaram a atuação da facção, apontaram exageros por parte da imprensa, disseram que o Estado agiu de forma firme e rejeitaram a possibilidade de um acordo entre o PCC e o governo para o fim dos ataques.

"Não aconteceu"
Para o cadete Vinícius Zampolo, 23, em nenhum momento da atuação do PCC, que, até a noite de anteontem, totalizou 339 ataques contra policiais, órgãos públicos e bancos, o governo demonstrou não ter o controle da situação. "A partir do momento em que aconteceu o fato, o Estado já agiu de forma a solucionar os problemas. Não perdeu o controle."
E o acordo? "Isso não aconteceu", afirmou Camila Mendonça Munhoz Dati, 21, cuja intervenção foi apoiada pelos colegas. "Não vamos negar que o PCC demonstrou que existe, mas a força em si é muitas vezes o medo que a gente acaba externando", disse Silva.
Para os cadetes, a veiculação exaustiva dos ataques pela TV suscitou atos de vandalismos, que não tinham conexão com a facção. "Teve muito criminoso comum que se aproveitou da situação", acredita Hoff.
Quanto aos 107 suspeitos mortos pela polícia até anteontem, cujos vínculos com a ação criminosa ainda não foram esclarecidos, o cadete Anderson Kühl de Oliveira, 26, como os demais, descartou a possibilidade de vingança. "De maneira alguma isto ocorreu. A Polícia Militar age dentro da legalidade. Os criminosos é que investiram contra a polícia, que apenas reagiu", disse.
Sobre a melhor forma de combater os grupos criminosos, os cadetes ensinam: deve-se conhecer bem o inimigo.
Neste ponto, cometem um pecado. Dos cinco, apenas um leu "A Arte da Guerra", escrito há 2.500 anos pelo filósofo chinês Sun Tzu. Trata-se do livro de cabeceira de Marcos Willians Herbas Camacho, 38, o Marcola, líder máximo do PCC.
Como causa da criminalidade, os cadetes vinculam a violência à pobreza, ao desemprego, à falta de ensino e a uma legislação atrasada.


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