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Governo não sabe como tratar craqueiro, diz Drauzio Varella
Para ele e sociólogo, só próprio crime consegue barrar crack, pois faltam políticas adequadas
Facção criminosa vetou crack em presídios de SP porque ele subverte hierarquia; nos EUA, tráfico tirou a droga do mercado
MARIO CESAR CARVALHO
LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL
Não há crack nas prisões de
São Paulo, segundo o médico e
escritor Drauzio Varella. Nos
EUA, onde uma epidemia devastou uma parcela dos jovens
pobres e negros de 1984 a 1992,
o crack deixou de ser um problema de saúde pública de primeira ordem, segundo o "National Institute of Drug Abuse". Há
algo em comum entre os dois
casos: foi o crime, e não o governo, que resolveu o problema.
A ideia de que só o crime pode resolver a epidemia do
crack, defendida por Varella em
um artigo na Folha, é verdadeira quando faltam políticas públicas amplas de tratamento,
como ele disse em entrevista ao
jornal. É o que ocorre no Brasil,
ainda segundo Varella.
"A saúde pública não sabe
tratar craqueiro. Não temos
trabalhos científicos comparando as melhores drogas para
tratar essa dependência. Política, para funcionar, tem de ser
de longo prazo", afirma.
Em São Paulo, apesar de o
crack ter fundado um território
seu há mais de 20 anos no coração da cidade, a cracolândia, foi
só em março de 2009 que se
inaugurou a primeira clínica
pública especializada em dependentes em álcool e drogas
do Brasil. Está instalada em
São Bernardo do Campo.
Até agora, atendeu 233 pacientes, dos quais 73% consumidores preferenciais de crack,
ao custo médio de R$ 3.000 por
paciente-mês.
O número é modesto (calcula-se que só a cracolândia paulistana seja frequentada por
cerca de 3.000 usuários). Mas
deve-se considerar que a internação é voluntária -o dependente tem de querer estar lá.
A Prefeitura de São Paulo
disponibiliza outros recursos.
Oitenta profissionais das equipes de Saúde da Família fazem
a primeira abordagem dos
"noias" (como se chamam os
craqueiros), levantam seus
problemas de saúde, encaminham para tratamentos, quando é o caso, em hospitais ou nas
unidades básicas de saúde.
Na teoria, a existência de vários tipos de tratamento (para
o sujeito que se submete à internação, para o outro que só
quer controlar a "fissura", para
aquele outro que só pretende
curar a tuberculose etc.) seria o
indicado. O problema é que essas várias esferas pouco "conversam" entre si -para não dizer que brigam muito, como
testemunhou uma médica:
"Em vez do bem do paciente, o
que se mira é a reafirmação da
minha ideologia terapêutica.
Parecem igrejas de fanáticos".
Nas prisões de São Paulo, foi
o PCC (Primeiro Comando da
Capital) que conseguiu acabar
com a droga. O motivo, segundo Varella, é que o crack subverte a hierarquia, algo insuportável para uma organização
rígida como o PCC.
Nos EUA, a saída do crack do
mercado foi uma decisão dos
traficantes por razões mercadológicas, segundo o sociólogo
Luís Flávio Sapori, professor
da PUC de Minas Gerais. O
crack afastava o consumidor de
drogas mais rentáveis.
Houve também um trabalho
de inteligência policial, de rastrear grandes traficantes e laboratórios, o que não existe no
Brasil, diz. "O trabalho da polícia só é eficiente quando causa
o encarecimento da droga."
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