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POLÍCIA FORA DA LEI
Delegados e investigadores usam carros da corporação para acompanhar reunião na Assembléia
Policiais desarticulam ato contra secretário
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma mobilização de policiais
civis desarticulou ontem o ato em
que entidades de direitos humanos defenderiam, na Assembléia,
o afastamento do secretário da Segurança Pública do Estado, Saulo
de Castro Abreu Filho, investigado pelo Tribunal de Justiça por
causa de ações suspeitas da inteligência da Polícia Militar.
Antes das 14h, no horário em
que a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa
apresentaria novas denúncias, as
300 cadeiras do auditório estavam
ocupadas, em sua maioria, por
delegados, investigadores e membros de conselhos de polícia que
defendem o secretário.
A estratégia esvaziou o encontro, que estava marcado havia
uma semana, fez com que ele mudasse de lugar e irá provocar um
pedido de investigação ao Ministério Público por parte de parlamentares do PT sobre a ida de policiais em serviço para a Assembléia em carros da Polícia Civil.
Entidades de direitos humanos
e a Secretaria da Segurança vêm se
enfrentando desde o início das investigações do Gradi (Grupo de
Repressão e Análise dos Delitos
de Intolerância) -a unidade secreta da PM que infiltrava presos
em quadrilhas, conforme revelado pela Folha em 28 de julho, suspeita de crime de tortura, abuso
de autoridade e homicídio.
Às 15h, não havia mais espaço
no plenário. O presidente da Assembléia, Walter Feldman
(PSDB), tentou, sem sucesso, dividir o auditório ao meio.
Após meia hora, delegados
coordenaram a desocupação de
metade das cadeiras, mas os representantes de entidades foram
vaiados ao entrar no auditório.
Com isso, o evento foi transferido
de local e só começou às 16h10.
Feldman disse desconhecer o
uso de carros públicos no ato. "Se
isso ocorreu, que se abra uma investigação." A deputada e delegada Rosmary Correa (PMDB) defendeu os policiais. "Os carros
que estão aqui não estão sendo retirados de nenhum policiamento
e as pessoas continuam a ser atendidas nas delegacias", afirmou.
A Folha localizou 19 veículos da
Polícia Civil perto da Assembléia.
Um deles era de Santos. Consultado, o Ministério Público informou que o uso de carros oficiais
pode ferir a lei de improbidade.
"Fiquei sabendo do ato e resolvi
vir, como cidadão", disse o delegado Antonio Chaves Martins
Fontes, 61, diretor da Polícia Civil
na região metropolitana, que diz
ter usado seu carro particular.
Dois delegados disseram à Folha, porém, terem sido convocados por diretores. Na semana passada, os 20 integrantes do Conselho da Polícia Civil, órgão máximo da corporação, deram apoio
formal ao secretário.
""Se não conseguimos fazer um
ato pedindo investigação, imagine como será feita a apuração",
disse o presidente da Comissão de
Direitos Humanos da OAB-SP,
João José Sady. ""A sensação que
se tem é de intimidação."
Entidades defendem a saída do
secretário da Segurança para ""dar
transparência à investigação". O
Gradi estava subordinado diretamente ao gabinete dele.
A Comissão de Direitos Humanos divulgou trechos de depoimentos de quatro presos que trabalharam infiltrados para o Gradi
e um texto assinado por 16 entidades, pedindo a saída do secretário.
Os detentos afirmaram, segundo o deputado Renato Simões
(PT), presidente da comissão, que
dois policiais federais de Santos
também participaram de ação em
Sorocaba, em março deste ano,
quando 12 homens ligados ao
PCC foram mortos. Na versão deles, esses agentes teriam fornecido
duas armas para o Gradi entregar
aos suspeitos, que teriam sido
atraídos para um cerco policial.
Os depoimentos ocorreram nas
últimas duas semanas e cópias serão enviadas ao Tribunal de Justiça e Procuradoria Geral de Justiça.
Os detentos, segundo Simões,
não falaram da participação de
Abreu Filho no planejamento do
Gradi, como um deles chegou a
escrever em carta. O nome do ex-comandante da PM Rui César
Melo foi citado na conversa.
Segundo o deputado, um dos
ex-agentes do Gradi disse que o
setor de inteligência dava cobertura a roubo de cargas e extorquia
dinheiro de criminosos.
Em nota oficial, a Secretaria da
Segurança Pública informou que
não se manifestaria sobre as novas denúncias. Também não comentou sobre o uso de carros.
A Comissão Interamericana de
Direitos Humanos recomendou
ao governo brasileiro, anteontem,
que transfira as investigações para
a PF e que dê proteção aos presos
recrutados pela PM.
Para a comissão, o envolvimento de autoridades da polícia e do
Judiciário nessas ações caracteriza risco iminente à vida das testemunhas e faz com que essas instituições "não gozem da necessária
imparcialidade" para apurar.
A missão do Brasil na OEA já foi
informada da decisão. O governo
tem sete dias para dizer que medidas já tomou e seis meses para
adotar as recomendações. Se não
o fizer, o Brasil pode ser citado
-de forma negativa- na Assembléia Geral da OEA.
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