São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2005

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SAÚDE

Neste ano, 18 gestantes que haviam feito o pré-natal morreram em razão de falhas no sistema de saúde, segundo especialistas

ONU apura mortes maternas na Paraíba

CLÁUDIA COLLUCCI
ENVIADA ESPECIAL À PARAÍBA

Uma missão apoiada pela ONU (Organização das Nações Unidas) está apurando a sucessão de mortes maternas ocorridas na Paraíba. Neste ano, 18 mulheres morreram durante a gravidez ou logo após o parto, segundo ONGs e comitês que investigam esse tipo de ocorrência. A Secretaria Estadual da Saúde admite 14 mortes.
Dez dessas mulheres morreram nos últimos dois meses e meio, quase uma por semana. A causa mais freqüente foi hipertensão na gravidez, problema que mais mata, em conjunto, as mães e os bebês no país e que pode ser diagnosticado e controlado durante um pré-natal eficaz.
No Brasil, em cada 100 mil nascidos vivos, 75 mulheres morrem por complicações na gestação ou no parto. A Organização Mundial da Saúde considera aceitável o índice de 20 mortes maternas para cada 100 mil nascidos vivos.
No ano de 2002 (último levantamento do Ministério da Saúde), mais de 2.000 mulheres e 38 mil bebês morreram no país por complicações na gravidez, no parto, no pós-parto e em abortos.
No caso das mulheres paraibanas mortas, todas faziam ou tinham feito o pré-natal na rede básica de saúde, com equipes do PSF (Programa Saúde da Família). Mas isso não impediu, por exemplo, que duas delas, de Arara (155 km de João Pessoa), morressem uma semana após os médicos deduzirem, sem pedir exame algum, que o mal-estar que sentiam era provocado por uma "virose".
Também é precário o acesso e o atendimento na rede hospitalar. Diante de casos mais graves, municípios sem hospitais de média e de alta complexidade despacham as grávidas para cidades maiores. Elas perambulam por vários hospitais até conseguir internação.
Segundo a professora Clair Castilhos Coelho, que fará o relatório a ser enviado à ONU, existem falhas em todo o sistema de saúde na Paraíba. "O Programa Saúde da Família tem sido um engodo em relação à saúde da mulher. Há problemas básicos, como não identificar a hipertensão na gravidez. Não há responsabilidade com essas pacientes."
Para ela, o problema não está restrito à Paraíba. "É sistêmico, acontece em todo o país. Há muita subnotificação." Uma das sugestões de Coelho será propor que médicos e gestores sejam responsabilizados, civil e criminalmente, por cada morte em que ocorrer por negligência.
Para Fátima Moraes, coordenadora da saúde da mulher de João Pessoa, um dos focos do problema é o excesso de demanda nos hospitais de alta complexidade, provocado pela vinda de pacientes do interior. "56% da nossa demanda é de fora. Os municípios do interior só fazem comprar ambulância e despachar as mulheres para a capital", diz.
Entre as propostas do município para evitar que novas mortes ocorram estão um plano de capacitação e humanização das redes básica e hospitalar e a abertura de oito leitos de UTI na Maternidade Cândida Vargas, em João Pessoa.
Já o Estado discute a possibilidade de cortar verbas de municípios que não estejam cumprindo o seu papel no atendimento básico. "Eles [os municípios] recebem verba para isso e vêm falhando sistematicamente no pré-natal dessas gestantes", diz Valderez Araújo, coordenadora de promoção da saúde da mulher da Secretaria Estadual da Saúde.
Segundo ela, as mulheres que morreram tiveram uma média de oito consultas de pré-natal, o que não justificaria uma morte por eclampsia, que pode ser evitada com o uso de remédios.


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