São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2005

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Em 24 dias, Arara enterra 2 gestantes

ENVIADA ESPECIAL A ARARA (PB)

Em menos de um mês, duas gestantes de Arara, no agreste paraibano, morreram no final da gravidez. Os bebês também não resistiram. Ambas foram vítimas de sucessivas falhas no sistema de saúde, admitidas pela própria Secretaria da Saúde do município.
Era 20 de junho, quando Adenice Neves Bezerra, 31, deu entrada no hospital de Arara com ânsia de vômito e tontura. O médico que a atendeu diagnosticou uma "virose", embora não tenha pedido exames laboratoriais.
Foram pelo menos mais três idas ao hospital de Arara e de Esperança (a 10 km dali) até morrer de septicemia, no dia 26, em um hospital de Campina Grande, único da região que tem atendimento de alta complexidade.
Segundo avaliação dos médicos, o feto estava morto havia uma semana. Mas, dois dias antes da morte da Adenice, os médicos de Arara chegaram a afirmar que o bebê estava bem. Era seu primeiro filho. "Como isso é possível? Meu neto já estava morto e ninguém viu isso?", indaga a mãe, Rita Terezinha Bezerra, 77.
Vinte quatro dias depois, outra jovem de Arara teve o mesmo fim. O drama de Cícera, 19, começou no dia 19 de julho, quando ela procurou o hospital de Arara, queixando-se de dor no estômago, enjôo e fraqueza. Foi examinada, tomou soro e saiu de lá com o diagnóstico de "virose".
Dois dias depois, Cícera voltou ao hospital com as mesmas queixas e mais cansaço. Apresentava febre de 38,5 graus e pressão arterial baixa. Novamente recebeu soro e foi liberada. No dia seguinte, com vômito e dispnéia, foi encaminhada a um hospital de Campina Grande, a 60 km de Arara.
O marido, Erivaldo Alves, conta que o hospital alegou não atender gestantes e a encaminhou para outra instituição. Essa, por sua vez, examinou a jovem e a dispensou sob a alegação de que estava bem. No mesmo dia, os sintomas se agravaram e o marido a levou de volta ao hospital de Arara.
Às 8h da manhã do dia 24, houve aumento da pressão arterial e detectado sofrimento fetal. Foi levada às pressas para Campina Grande. No primeiro hospital em que chegou não havia UTI. No segundo, o único leito disponível estava reservado para paciente particular. Apenas o terceiro aceitou interná-la e fazer uma cesárea de urgência. O bebê já estava morto. Cícera morreu em seguida. O laudo aponta septicemia e polinefrite (grave infecção dos rins).
A morte ainda está sob investigação, mas a enfermeira Núbia Ramalho, presidente do comitê de morte materna de Campina Grande, arrisca dizer que uma infecção urinária maltratada pode ter sido a causa. Está indignada com o atendimento pré-natal.
"Não entendo como eles suspeitaram de uma virose e não pediram exames laboratoriais? Como essa gestante sai sem encaminhamento certo e fica perambulando por hospitais até a morte?"
A secretária municipal da Saúde de Arara, Sônia Barbosa Sousa, reconhece a falha da equipe médica do hospital. Promete que vai melhorar a capacitação dos seus médicos para atender gestantes e "pressionar" os hospitais de Campina Grande a aceitar os seus doentes. (CC)


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