São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2011 |
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Casal registrou menina dois dias após "sequestro" S., 7, virou "filha legítima" de dona de casa e aposentado em cidade de MG Oficial de cartório diz que os dois suspeitos cumpriram todos os requisitos para fazer o documento da criança LAURA CAPRIGLIONE ENVIADA ESPECIAL A BELO HORIZONTE Dois dias depois de, segundo a polícia, sequestrar a menina S. de 7 anos em uma feira de artesanato na cidade de Contagem (região metropolitana de Belo Horizonte), a dona de casa Neli Maria Neves, 53, já tinha "legalizado" a aquisição do novo membro de sua família. Bastou ir a um cartório em São Joaquim de Bicas, cidade vizinha, e cumprir três requisitos para S., que tem pai, mãe e irmãos biológicos vivos -e já era registrada-, tornar-se, no dia 9 de agosto, de uma penada, "filha legítima" de Neli e de seu companheiro, o PM aposentado Jair Narcizo de Lacerda, 65. O oficial substituto do cartório de São Joaquim de Bicas, Audaces da Silva Maia, disse à Folha que o casal cumpriu todos os requisitos legais para fazer o registro da menina. Ou seja: 1. Apresentou comprovante de residência (era falso soube-se depois, já que a dupla não mora em São Joaquim, mas em Contagem). 2. Apresentou duas testemunhas, parentes de Neli, que declararam ter visto a mulher grávida da menina. 3. Apresentou uma boa história: quando o escrivão pediu a Neli documento da maternidade comprovando o parto, ela argumentou que havia dado à luz em casa. O cartório quis saber o porquê da demora no registro. Neli respondeu que ela e o companheiro haviam se separado, e que voltaram às boas, razão pela qual regularizariam a situação de S.. O cartório acreditou em tudo e lavrou a certidão. S. mudaria apenas o sobrenome. "Se não fizéssemos a certidão, corríamos o risco de levar bronca do juiz. Os cartórios não podem negar o documento fundamental para a pessoa existir como detentora de direitos", defende-se oficial do cartório. O caso foi desvendado pela equipe da Divisão de Referência da Pessoa Desaparecida da polícia mineira. Divulgado o seu retrato falado, a suposta sequestradora tratou de devolver a menina para uma família conhecida, e de mudar a cor e o corte do cabelo, para não ser reconhecida. Mas foi. Na última terça-feira, a delegada Cristina Coelli, 49, fez a prisão. "Esse episódio é muito preocupante. Veja, a nova certidão era de verdade e o cartório existe. Mesmo baseado em fato inexistente [o parentesco entre o casal e a menina], o documento tinha valor de verdade. Com o documento, a sequestradora poderia até retirar a criança do país", afirma a delegada. Segundo a policial, registros tardios de nascimento -aqueles que são feitos muito tempo depois do parto- deveriam ser sempre cruzados com as listas de desaparecidos dos Estados (o Ministério da Justiça registra mais de 10 mil em todo o país). Isso ainda não é a norma. MOTIVO É MISTÉRIO A Divisão de Desaparecidos está agora às voltas para entender as motivações do suposto sequestro da menina S., já que não houve pedido de resgate. Também investiga a situação da jovem de 24 anos, que vivia com o casal e que também foi registrada como filha, sem sê-lo. A polícia já sabe que a moça é filha biológica de uma tia alcoolista de Neli. Teria um deficit cognitivo e um forte apego emocional a sua suposta captora. No bairro de Fonte Grande, em Contagem, vizinhos dizem que ela cursou a escola, que ocupava um aposento normal na casa em que vivia, e que saía à rua acompanhada pela "mãe". Não estaria drogada ao ser encontrada, como foi divulgado. A polícia pediu ao INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) que veja se há uma pensão por incapacidade em nome da jovem para saber se Neli e o companheiro tiveram vantagens financeiras com a vítima. Texto Anterior: Perfil - Patrícia Acioli: Sem limites Próximo Texto: Frase Índice | Comunicar Erros |
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