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Institutos oferecem assistência jurídica e dão apoio para recuperar auto-estima de quem enfrentou discriminação
ONGs "reconstróem" vítimas de preconceito
DA REDAÇÃO
"Eu reparo bem na fisionomia
da vítima. Quando ela está na
frente do juiz e começa a relembrar o caso, os olhos começam a
ficar vermelhos. Ela não resiste e,
em poucos segundos, desaba. E
não tem jeito. Não há mais condições de continuar a audiência."
O advogado Lino Pinheiro da
Silva, 38, da organização não-governamental Instituto do Negro
Padre Batista, exemplifica dessa
maneira a fragilidade de uma vítima de discriminação racial.
A ONG oferece assistência jurídica gratuita às vítimas do preconceito. A experiência nesse serviço mostra que deve ocorrer um
trabalho conjunto, de defesa do
direito e de reconstrução da auto-estima do discriminado.
"As pessoas chegam aqui extremamente abaladas, perdidas. O
desejo delas é de se esconder, de
não mais sair de casa."
Os casos se acumulam. Alunos
que foram discriminados pelo
professor. Professores vítimas de
preconceito dos alunos. As discussões entre vizinhos que descambam em insultos racistas.
Há também um outro tipo bastante frequente: o preconceito na
porta giratória de banco. Lino relata um caso em que o cidadão negro chegou a ficar apenas de cueca
para provar que podia entrar na
agência. E ainda assim não pôde
passar, justamente porque estava
só de cueca.
Segundo o instituto, todos esses
casos têm em comum um alto poder devastador sobre a personalidade dos discriminados.
Maria José de Assis Souza dá assistência psicológica às vítimas de
preconceito. "São pessoas fragilizadas. A discriminação fere de
forma extremamente cruel."
Ela lembra um caso em que
uma mulher declaradamente não
foi aceita para o emprego de governanta pelo fato de ser negra.
Ela desenvolveu um quadro depressivo, não conversava com a
família e não queria sair do porão
de casa. Foram necessários dias
para convencê-la a procurar ajuda. "Nós prestamos aqui um serviço emergencial e procuramos
encaminhar as pessoas para tratamento, pois o trauma é muito
grande", diz a psicóloga.
O instituto dá bolsas para que
alunos negros possam estudar. Os
advogados que atendem as vítimas e a psicóloga se formaram
com o auxílio dessas bolsas.
Jovens
A Fala Preta! é uma ONG de
mulheres negras que atua na área
da saúde reprodutiva da mulher e
em projetos de resgate de auto-estima de jovens.
"A exclusão da população negra
não é uma questão puramente
econômica. É necessário recuperar a autoconfiança e a auto-estima. Trabalhamos para que o negro tenha consciência de que não
é uma sujeira na sociedade", explica Gláucia Matos, coordenadora-adjunta da Fala Preta!.
Na região de Americanópolis, a
Fala Preta! desenvolve projeto
que visa a construção da identidade racial-étnica de jovens. "O jovem negro tem com frequência
problemas na escola. Trabalhamos para o resgate da cidadania,
para que eles estejam mais bem
preparados para atuar na sociedade", diz Maria das Graças Pereira,
42, coordenadora pedagógica do
projeto. Os jovens que participam
do programa -que envolve dinâmicas de grupo, dramatizações, produção de textos e fanzines- se transformam em agentes multiplicadores da experiência em suas comunidades.
Promotoras da cidadania
A ONG Geledés, de mulheres
negras, oferece assistência jurídica a vítimas de preconceito, aulas
de reforço para estudantes negros
entrarem na faculdade e bolsas de
estudo com o apoio de empresas.
Na periferia, dá cursos para formação de agentes multiplicadoras
da cidadania. Na zona leste, 40 foram formadas em Cidade Tiradentes e 30 em São Mateus.
As mulheres, em sua grande
maioria negras, recebem aulas de
legislação, cidadania e saúde. Elas
se tornam referência em suas comunidades. Dão informação sobre o que aprenderam a vizinhos
e amigos.
(EDNEY CIELICI DIAS)
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