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Greve policial não pode privar cidadão, diz desembargador
Magistrado acha reivindicação salarial justa, mas critica a paralisação de delegacias
Eleição de delegado-geral poderia reduzir o poder de secretário da Segurança, diz Henrique Nelson Calandra, presidente da Apamagis
ROGÉRIO PAGNAN
DA REPORTAGEM LOCAL
O desembargador Henrique
Nelson Calandra, presidente da
Apamagis (Associação Paulista
de Magistrados) e membro do
Órgão Especial do TJ (Tribunal
de Justiça) de São Paulo, disse
enxergar com "tristeza" a greve
dos policiais civis.
A categoria começou a fazer
paralisações em todo o Estado
na última terça. Anteontem, o
comando de greve afirmava ter
uma adesão de 90% das delegacias na capital e de 100% no restante do Estado. Para o governo, são 30% de adesão na capital e 40% no interior.
Os policiais reivindicam reajuste salarial imediato de 15%,
mais duas parcelas de 12% nos
próximos anos (2009 e 2010).
Apesar de considerar justa a
reivindicação salarial, Calandra disse não concordar com a
privação do atendimento à população -já vítima de tantos
problemas com a segurança pública. O desembargador disse
ainda não concordar com os pedidos de eleição direta para delegado-geral, nem com o pedido para a prerrogativa de "inamovibilidade" (os policiais só
poderiam ser transferidos de
unidade se concordassem).
Para Calandra, a eleição de
delegado-geral poderia reduzir
o poder do secretário da Segurança e criar uma instituição
autônoma -alheia à política de
segurança do Estado. A transferência de policiais, em alguns
casos, é salutar para o próprio
policial, afirma o desembargador. Ele não concorda, porém,
com transferências punitivas.
FOLHA - Como o sr. vê a greve dos
policiais civis em São Paulo?
HENRIQUE NELSON CALANDRA -
Com preocupação, porque segurança pública é prioridade
para todos os povos do mundo.
Eu vejo com muita tristeza o fato de nós chegarmos a um ponto em que policiais [civis] estão
fazendo greve. Porque é precisamente na mão deles que repousa a tarefa de polícia judiciária, que é a parte ligada à investigação de crimes.
Os níveis de salário dos delegados da polícia são realmente
muito baixos no Estado de São
Paulo, diferente do que ocorre
em outros Estados. O que houve foi uma supervalorização da
Polícia Federal, e a polícia estadual acabou ficando descompassada, acabou ficando num
andar abaixo. Justamente a polícia de São Paulo, considerada
a força mais elitizada do país.
No que se refere a pagamentos
e subsídios, nós ficamos em um
patamar muito inferior na retribuição aos policiais. Espero
que o Poder Executivo encontre uma solução conciliatória
[para a greve].
FOLHA - Acha justa a reivindicação,
mas não a paralisação. É isso?
CALANDRA - Acho que a paralisação de um serviço essencial,
como é a polícia, acaba impactando de modo negativo na opinião pública. Porque as pessoas
vitimadas pela violência ficam
sem a oportunidade de receber
um atendimento por parte da
polícia judiciária. Isso é uma
frustração, que se soma a tantas
outras que fazem parte do nosso cotidiano. Porque o povo
tem que encarar organizações
criminosas e violência de toda
ordem. Com a greve dos policiais no Estado, não tem nem a
quem se queixar.
FOLHA - Eles pedem também a eleição
para delegado-geral. É justo?
CALANDRA - Toda aspiração democrática é válida, porque legitima aquele que dirige. Assim é
na eleição do procurador-geral
de Justiça. Só que as coisas ligadas à polícia têm outra conotação. A força policial está toda
estruturada em função de uma
carreira hierarquizada, na qual
as ordens vêm do secretário do
Estado, que comanda as polícias. Na medida em que houver
eleição para delegado-geral, haverá perda do poder de mando
do secretário da Segurança Pública, e a polícia passará a ser
comandada por ela mesma.
Deixa de ser um órgão de Estado. Poderia haver uma lista tríplice, como ocorre no Ministério Público, na qual o governador escolhe o nome, mas tenho
minhas dúvidas da eficácia disso para a organização da atividade policial.
FOLHA - E o pedido dos policiais para a
"inamovibilidade"?
CALANDRA - A transferência punitiva e a transferência por
transferir têm sido obstadas
pelo Judiciário, já faz um longo
tempo, para qualquer categoria
de funcionários. Agora, haverá
situações em que transferir o
policial faz parte da dinâmica
da própria investigação. Haverá policiais que não conseguem
desvendar certos crimes. Só
mesmo substituindo, removendo ele para outra localidade
onde não seja tão conhecido é
que vai ser possível ao policial
ter maior capilaridade com certos segmentos que podem trazer informações para desvendar crimes. Imagine o policial
que não pode ser transferido.
Um policial ameaçado de morte, que insiste em ficar em determinado lugar. Vão deixar ele
lá até ser morto ou vão mudá-lo
para outra região do Estado,
onde ele possa ter maior tranqüilidade?
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