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EDUCAÇÃO
Nova prova permite melhorar notas e subir em ranking interno de cursos para garantir especialização na área desejada
Na USP, alunos encaram segundo vestibular
BRUNO LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL
Entre os candidatos que disputarão vaga no curso de letras no
vestibular da USP está um aluno
do curso de letras da própria USP.
Embora já tenha vaga garantida
no curso, Luiz Roberto Castro, 37,
prestará vestibular em novembro
para tentar melhorar suas notas e,
com isso, mudar de habilitação:
ele quer inglês, mas só conseguiu
vaga em grego antigo. Para este
ano, 33,6% dos alunos que tinham inglês como opção não
conseguiram vaga no idioma.
Para distribuir os alunos entre
as habilitações oferecidas -como inglês, francês e espanhol-, a
universidade estabelece um ranking. São consideradas as notas
obtidas no primeiro ano (ciclo básico). Não são avaliados conhecimentos de línguas estrangeiras.
"Muita gente entra em inglês [o
curso mais procurado" sem saber
nada. Só que a aula [da habilitação" é dada toda em inglês, em nível intermediário e avançado",
afirma o aluno Castro.
Segundo alunos de letras, quem
não consegue acompanhar as aulas costuma trancar a matrícula e
procurar um curso particular.
O período de trancamento chega a dois anos. Ao contrário das
vagas abertas por desistência, vagas de trancamento não são oferecidas para transferência.
"Ninguém desiste. Se desistir,
não volta mais", diz Bianca Ribeiro, 20, aluna de inglês. Se trancar,
pode estudar por fora e voltar.
Neste ano, formam-se os primeiros alunos que passaram pelo
ranking, instituído em 99 -antes, a seleção era feita no vestibular. Com a criação do ciclo básico,
todos os alunos passaram a ter vaga garantida em português, podendo cursar outra das 14 habilitações, para as quais há seleção.
Segundo o diretor da FFLCH
(Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da USP), Sedi
Hirano, o diagnóstico dos ganhos
e problemas trazidos pelo ciclo
básico, previsto para este ano, foi
atrasado por causa da greve dos
estudantes (de abril a agosto) e só
poderá ser feito em 2003.
"Se de fato houver um número
grande de trancamentos, podemos pensar alternativas para a racionalização dessas vagas", afirmou Hirano. Ele lembra, contudo, que é preciso garantir o direito
adquirido dos que trancaram.
Engenharia
O vestibular para o mesmo curso também ocorre na Escola Politécnica da USP. "Queria engenharia química e ia pegar civil. Tranquei e fui fazer cursinho", conta
Marcio Ripari Machado, 21, que
fez outro vestibular para cursar de
novo o ciclo básico da instituição.
Na Poli, como é conhecida a escola de engenharia da USP, o aluno é encaminhado para uma das
grandes áreas da engenharia no
final do primeiro ano. No segundo ano, em novo ranking, é decidida a engenharia específica.
Pesquisa feita na semana passada pelo Grêmio Politécnico com
458 dos cerca de 750 alunos do ciclo básico mostra que 41% têm
elétrica como primeira opção, e
41%, mecânica. Só 9% querem
química, e 9%, civil. Projeções feitas pelo grêmio revelam que cerca
de 8% deixariam a Poli caso não
conseguissem vaga em sua opção.
De acordo com o presidente da
Comissão do Ciclo Básico da Poli,
José Roberto Piqueira, cerca de
15% dos alunos não conseguem
estudar o que querem, mas o nível
de satisfação aumentou, já que os
alunos ficam mais preparados para escolher. "Temos alunos que ficam chateados, mas tentamos resolver com transferências."
Insatisfeitos
"Não peguei francês por causa
de meio ponto", conta Fernanda
Libois, 21, que é de família francesa e, por enquanto, só conseguiu
vaga em alemão. "Não é a minha
vocação. Já tentei mudar, mas
sempre me dizem que a sala está
lotada. Vão enrolando, enrolando, você acaba desistindo."
Na Poli, embora elogiem a possibilidade de decidir a carreira depois de obter mais informações,
os alunos reclamam que o ranking impede que as decisões se
concretizem. "Quero engenharia
naval. Estou tentando mudar,
mas é uma burocracia louca",
conta Gabriela Timerman, 19, aluna do segundo ano de civil. As
transferências na Poli também
obedecem ao ranking.
Segundo os alunos, o clima de
competição chega a atrapalhar as
amizades. "Em engenharia, as
pessoas já têm dificuldade de se
comunicar. Com a competição, o
problema se intensifica", afirma o
estudante do segundo ano de civil
Renato Rosenberg, 19, membro
do Grêmio Politécnico. De acordo
com ele, o sistema desmobiliza os
alunos, dificultando a luta por interesses coletivos.
"É um jogo. Cada um tem de
traçar suas estratégias. Abdiquei
de muita coisa", diz Milena Delalata, 21, que conseguiu vaga em
engenharia de produção, um dos
cursos mais concorridos.
Na engenharia, as provas do ciclo básico costumam ser as mesmas para todas as turmas. "Como
as aulas são diferentes, as salas
dos bons professores ficam lotadas. Mesmo quem não é da turma
vai assistir", conta Fábio Zveibil,
20, aluno de produção.
No curso de letras, cada docente
tem seus critérios de avaliação. O
efeito é que os alunos procuram
se matricular nas turmas de professores tidos como "bonzinhos"
e fogem dos mais rigorosos. "Não
há perfeição, mas é o que perseguimos", diz o diretor da FFLCH.
O sistema também recebe críticas de professores. Para Marli
Quadros, coordenadora da área
de língua portuguesa, o sistema
revitalizou áreas como latim, mas
ainda precisa ser aperfeiçoado. "É
a coisa mais perversa que já foi
criada", diz Iná Camargo Costa,
chefe do Departamento de Teoria
Literária e Literatura Comparada.
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