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DANUZA LEÃO
Aprendendo a viver
No aniversário, temos o direito de nos dar ao luxo de não fazer absolutamente nada que não queremos
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UM ANIVERSÁRIO é sempre um
problema. Quando se é
criança, é ótimo, e só pensamos numa coisa: nos presentes que
vamos ganhar. A partir daí, é complicado. Quando a vida está ótima,
queremos festejar, quando estamos
mais ou menos, saímos para jantar
fora com alguns amigos -cada um
paga o seu-, e quando estamos numa fase horrível, não queremos nem
ouvir falar.
Mas as coisas não são assim tão fáceis: tem sempre uns que lembram
-como conseguem?- dos aniversários de todo mundo, e uns dias antes
"dessa data querida" já telefonam
perguntando quais são os planos. A
resposta é sempre meio capenga, tipo "não sei, as crianças querem jantar comigo mas ainda não está nada
certo", com medo de no dia dar um
bode e se ver sozinha, logo nesse dia.
As crianças, claro, se limitam a telefonar, isso quando lembram, e desejar felicidades, ou porque pensam
que você tem mil programas ou porque jantar com mãe no dia do aniversário é um mico certo. Chega o
dia e você não sabe o que vai fazer,
nem o que gostaria de. No fundo,
que o dia seguinte chegasse depressa. E a cada um dos amigos (poucos)
que lembram e telefonam dá uma
desculpa meio esfarrapada e deixa
as coisas no ar, esperando que surja
alguma idéia brilhante. E se alguém
cantar, mesmo baixinho, o parabéns? É para se enfiar debaixo da
mesa, de vergonha.
Os anos vão passando e as coisas,
piorando; pensar que tem um ano a
mais não tem a menor graça, e não é
razão para festejo algum. Mas fazer
o quê? Ser obrigada a fingir que está
achando ótimo, receber lembrancinhas inúteis e se arriscar a voltar para casa na maior deprê, tentar esquecer que é o famoso dia? Ai, Deus,
as datas.
Eu já tentei todas as soluções: viajar, tirar o telefone do gancho -mas
aí tem os e-mails e os telegramas de
algumas lojas que perguntam quando é o grande dia, para fazer a ficha e
você, distraída, diz. Podia dizer o dia
errado, mas esquece, e aí não escapa.
Mas este ano eu encontrei a fórmula
perfeita, que vou contar.
A cada uma das pessoas que telefonaram eu driblei; disse que uns
amigos tinham me convidado para
jantar, a outros que não tinha escapado da família, e às 7h da noite estava sozinha, sem nada para fazer.
Jantei normalmente, vi televisão e
fui dormir à mesma hora de sempre
-11h, 11h30. Foi um grande presente que me dei, e um dos melhores
aniversários que já passei.
No dia seguinte fiquei pensando
por que tinha sido tão bom e descobri: no dia do nosso aniversário temos o direito de nos dar ao luxo de
não fazer nada, absolutamente nada
que não queremos. Não é uma decisão radical, muito pelo contrário.
Cada um é livre para fazer o que quiser: dar uma festança, mandar fazer
um bolo de velas, qualquer coisa que
esteja querendo, mas nada que não
esteja querendo, só para fazer a vontade dos outros.
Depois que aprendi isso, dou esse
conselho a todos os que são como eu,
e todos estão se dando muito bem e
muito gratos.
Agora estou estendendo esta filosofia para os outros dias do ano, e espero conseguir chegar a todos. Tirando as obrigações de trabalho, que
no fundo, como tenho a sorte de gostar do que faço, são um prazer, e outras que a gente não pode mesmo
deixar de cumprir, não pretendo
nunca mais fazer nada que não queira, que me violente, que me deixe o
dia inteiro estressada, pensando "ai,
por que fui aceitar?" E nunca mais
pensar "ai, não posso deixar de ir",
porque quase sempre se pode.
Nunca é tarde para aprender a viver melhor.
danuza.leao@uol.com.br
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