São Paulo, sexta-feira, 22 de junho de 2007

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Lula autoriza Aeronáutica a prender "sabotadores"

Prisões serão baseadas no regulamento militar, já que inquéritos militares são lentos

Ontem os aeroportos enfrentaram o terceiro dia consecutivo de atrasos de vôos; prisão acirrou ânimos entre os controladores

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse internamente que "quer dar um basta" no caos aéreo e autorizou o Comando da Aeronáutica a "endurecer" com os controladores de vôo de tráfego aéreo.
Além dos inquéritos militares que já correm e são muito lentos, a decisão é prender, com base no regulamento disciplinar, os líderes, que são qualificados como "sabotadores". Em caso de reincidências, isso pode resultar em expulsão.
Oficialmente, o Planalto divulgou que Lula disse ao comandante da FAB, brigadeiro Juniti Saito, que "a Aeronáutica deve tomar todas as medidas que considerar adequadas para estabelecer o fluxo e a normalidade do tráfego aéreo". Na FAB, as medidas consideradas "adequadas" são as prisões administrativas imediatas.
Conforme a Folha apurou, a ordem de detenção do presidente da federação dos controladores, Carlos Trifilio, é apenas o início da onda de detenções. O argumento, no caso dele, foi dar entrevistas sem autorização e contra superiores.
Segundo o controlador Maurício Pereira, secretário da categoria em Guarulhos (SP), a ordem de prisão de Trifilio e a ameaça de endurecimento "entornaram o caldo e a situação ficou insustentável". Os líderes moderados, que defendem a negociação com o governo, estariam sendo isolados pelos mais radicais, que pregam um confronto mais direto.
O presidente da associação brasileira de controladores, Wellington Rodrigues, teria sido inclusive vetado no Cindacta-1 "pelos que querem botar fogo no circo", conforme relato de Pereira que a Folha não conseguiu confirmar até a conclusão desta edição.
Ontem, no terceiro dia de caos nos aeroportos, provocado, segundo a Aeronáutica, pelos controladores do Cindacta-1, em Brasília, os vôos voltaram a registrar espaçamentos bem superiores ao padrão para pouso e decolagem, gerando assim novos atrasos e cancelamentos.
O pico do problema, nesses três dias, foi entre 15h e 19h30, o que a Aeronáutica entende como forma de atingir o ponto nevrálgico da aviação civil, que é o Sudeste, especialmente São Paulo, e com isso obter mais destaque na imprensa.
Até as 18h30 de ontem, 38,1% dos vôos previstos tiveram atraso superior a uma hora e 8,2% foram cancelados. Na quarta-feira, no mesmo horário, havia 25,1% de vôos atrasados e 5,7% de cancelamentos.
Na terça-feira, o pretexto para o que a Aeronáutica qualifica de operação-padrão foi que os monitores não estavam nítidos, o que os supervisores e técnicos não confirmaram.
Na quarta, além disso, houve uma pane no sistema de comunicação da Embratel. Os controladores negam que estejam fazendo operação-padrão.
Ontem, o problema adicional foi a falta de pessoal, agravada pelo acúmulo de atrasos e cancelamentos da véspera e pela ausência de um supervisor.
Para o controlador Maurício Pereira, que foi sargento, mas hoje é civil e trabalha para a Infraero (a estatal responsável pela infra-estrutura aeroportuária), a ameaça da Aeronáutica de prender ou até expulsar cerca de 50 controladores é vazia, porque o sistema não teria como funcionar sem eles.
"Demite 50 e acha que acabou? Acha que aí o resto do pessoal sossega? E a segurança? Aí é que o problema vai ficar pior ainda", disse ele, por telefone, insinuando que a ameaça da Aeronáutica é blefe, pois não há profissionais em condições de assumir os consoles de controle de tráfego.
Pereira disse que a solução é a desmilitarização do setor e que, para isso, só a Presidência da República ou a Casa Civil teriam autoridade para negociar.
E criticou Lula: "O problema é que o presidente faz de conta que não é com ele".


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