São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2010

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Dúvida cerca morte da menina Joanna

Guarda foi transferida da mãe para o pai; criança morreu após ser internada e atendida por um falso médico

Há suspeita de maus tratos e interferência de ex-procurador-geral de Justiça do Rio; pai e mãe trocam acusações

DENISE MENCHEN
DO RIO

A morte da menina Joanna Marcenal Marins, 5, no último dia 13, encerrou de forma trágica uma vida marcada pelo conflito.
As acusações que se seguiram à sua internação, em coma, em um hospital da zona sul do Rio, trouxeram à tona uma disputa que corria silenciosa no Tribunal de Justiça do Estado.
O pai da menina, o serventuário da Justiça André Marins, 41, detinha sua guarda quando ela foi internada.
O laudo da avaliação psicológica que resultou na transferência da guarda da mãe para o pai no dia 26 de maio dizia que a menina apresentava síndrome de alienação parental em grau severo.
O transtorno ocorre quando a criança é submetida a uma campanha difamatória por um dos genitores para afastá-la do outro.
A mãe de Joanna, a médica Cristiane Marcenal Ferraz, 37, contesta o laudo, elaborado a partir de depoimentos do pai, da madrasta e dos avós paternos da menina.
Do lado materno, apenas ela foi ouvida. Ferraz critica o fato de os peritos não terem conversado com a criança.

INTERFERÊNCIA
A médica, que desde a morte da filha aumentou o tom das acusações contra o pai, diz desconfiar de que possa ter ocorrido interferência externa no processo.
Em 2007, um oficial de Justiça designado para cumprir um mandado de busca e apreensão da menina afirmou, em certidão à qual a Folha teve acesso, ter recebido uma ligação do ex-procurador-geral de Justiça do Rio Antonio Biscaia.
Atualmente, Biscaia concorre ao quarto mandato como deputado federal pelo PT e é casado com uma tia de Marins.
No documento, o oficial narra que estava na casa do pai de Marins, em busca de Joanna, quando este lhe passou uma ligação de Biscaia.
"Atendi-o ao telefone e ele me disse: "Você sabe com quem está falando? Você sabe que está agindo errado, fora do horário forense?", escreveu o oficial de Justiça no documento anexado ao processo.
A criança não estava no local e foi devolvida à mãe no dia seguinte.
A reportagem procurou Biscaia sexta-feira, mas, assim que o nome de Joanna foi citado, a ligação foi interrompida. No fim da tarde, ele voltou a atender o telefone, mas novamente a ligação foi interrompida quando a repórter se identificou.
Ele também não respondeu ao recado deixado na secretária eletrônica.
A mãe de André Marins afirmou que ele não iria comentar o caso durante o período de luto pela filha.

TROCA DE ACUSAÇÕES
A menina morreu no último dia 13, no Rio, após passar quase um mês em coma.
A mãe acusa o pai de maus tratos e culpa a Justiça pelo destino da filha, por ter transferido a guarda para ele.
O laudo no qual a Justiça se baseou para a decisão traz declarações como a da madrasta de Joanna, segundo quem a menina uma vez disse que não gostava de comer na casa do pai porque a mãe lhe dizia que ele lhe dava comida estragada.
Para as duas peritas responsáveis pela avaliação, isso era um sinal da tentativa de Ferraz de afastar a filha do ex-namorado.
No documento, as psicólogas dizem que a médica não levou à filha para a avaliação. Já o marido de Ferraz, Ricardo Tostes, diz que o pedido para que a menina fosse avaliada sequer foi feito.
Ao ver a filha no hospital, a mãe encontrou marcas no corpo dela e procurou a polícia, acusando o serventuário de ter agredido Joanna.
Segundo laudo preliminar do IML, a menina apresentava queimadura nas nádegas e equimoses nas pernas.

FALSO MÉDICO
O pai rejeita a acusação. Em depoimento à polícia, ele atribuiu as marcas roxas no corpo da criança a fortes crises convulsivas e culpou a mãe por não ter informado que ela sofria de problemas de saúde.
Para complicar a situação, a menina foi atendida por um falso médico no hospital RioMar. Alex Sandro da Cunha Souza teve a prisão decretada, mas está foragido.
Segundo o delegado Luiz Henrique Marques Pereira, da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima, a causa da morte da menina só deve ser esclarecida quando o laudo definitivo do IML ficar pronto, em setembro.


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