São Paulo, domingo, 22 de setembro de 2002

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SAÚDE

Estudo feito pela USP de Ribeirão Preto com 450 gestantes mostra que 22,1% ingeriram mais de 28 g de álcool

Um quinto das grávidas bebe além do limite

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

A mulher que deseja ter um filho deve abster-se de ingerir bebidas alcoólicas antes mesmo da gravidez. Especialistas dizem que não há uma dose-limite segura e que a ingestão de 28 gramas de álcool (o equivalente a duas latinhas de cerveja), mesmo que ocasional, já pode ser prejudicial ao feto, especialmente nas primeiras semanas de gravidez.
O consumo de álcool entre as gestantes é mais frequente do que se imagina. Nos EUA, estima-se que anualmente 65% dos fetos sejam expostos, em menor ou maior grau, ao álcool. No Brasil, não há estimativa sobre isso.
Mas uma pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (SP) mostra que a situação pode ser bem parecida. O estudo feito com um grupo de 450 mulheres no último trimestre da gestação revelou que uma em cada cinco (22,1%) havia consumido álcool acima do limite seguro (mais de 28 gramas).
Um número bem maior, 48% das pesquisadas, relatou algum consumo de álcool durante a gestação. Desse total, 9,1% das grávidas eram dependentes de bebida ou a consumiam em excesso.
O álcool ingerido pela gestante atravessa a placenta e faz com que o feto receba as mesmas concentrações alcoólicas que a mãe. Porém a exposição fetal é maior devido aos processos de metabolização e eliminação serem mais lentos, fazendo com que o líquido amniótico permaneça impregnado de álcool. Como é imaturo, o fígado do feto produz menos enzimas que decompõem o álcool.
"Se na mãe a metabolização do álcool ocorre em 15 minutos, no feto demora mais de duas horas", afirma o clínico-geral Maurício Gattaz, do Hospital das Clínicas de São Paulo.
A pesquisa, feita no ano passado como tese de mestrado do enfermeiro Carlos Eduardo Fabbri, avaliou gestantes carentes acompanhadas por uma maternidade filantrópica de Ribeirão Preto.
Segundo Fabbri, o trabalho mostrou que médicos e enfermeiros têm dificuldades em diagnosticar o consumo de álcool entre as gestantes. Prova disso é que foram encontrados apenas 2% de registros relativos a grávidas que consumiam álcool durante a gestação nos prontuários médicos das mulheres pesquisadas.
Para o ginecologista Rui Ferriani, 45, professor titular da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, essa discrepância dos números é um bom argumento para propor mudanças na forma como os médicos abordam essas questões durante o pré-natal.
Ele afirma que as perguntas são genéricas e, geralmente, não se valoriza o "consumo social" do álcool. "Pelo que vimos, o consumo pode não estar sendo tão "social" assim", afirma.
A quantidade de álcool consumida pela mãe não é o único fator que determina o efeito dessa exposição na criança.
A tolerância individual da gestante e do bebê também tem um papel importante e, por isso, não é possível estipular qual a quantidade que a mãe pode beber sem provocar danos ao bebê.
Mas não pode nem uma tacinha de vinho durante um jantar entre amigos? "Não", responde o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, 45, professor de psiquiatria da Unifesp e presidente da Abead (Associação Brasileira de Estudos de Álcool e Drogas).
"O organismo de cada pessoa reage de maneira diferente ao álcool. Como não sabemos qual é a quantidade que causa esse ou aquele problema no feto, as grávidas devem se abster totalmente de bebida alcoólica", diz Laranjeira.

Síndrome
As sequelas causadas no bebê vão depender de diversos fatores, como a duração do tempo em que a mãe bebeu, os seus hábitos de bebida, a quantidade de álcool absorvida e a forma como o seu metabolismo elimina o álcool.
Também é importante a história genética da mãe e o comportamento em relação ao álcool antes de ficar grávida. Filhos de mulheres com antecedentes familiares de alcoolismo e uma história pessoal de excessos correm mais riscos de desenvolver a síndrome do alcoolismo fetal (SAF), um mal que afeta, a cada ano,12 mil bebês, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde).
As crianças vítimas dessa doença podem ter lesões cerebrais e malformações físicas e orgânicas, que afetam olhos, boca, rins, coração e órgãos genitais, entre outros, assim como problemas de aprendizado e desenvolvimento.


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